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A perda da capacidade de ganho emergente de acidente de viação é indemnizável, ainda que o lesado mantenha o mesmo salário que auferia antes da lesão


Em 4 de Novembro de 2013, o autocarro conduzido por A colidiu contra o peão B que estava a atravessar a rua na passadeira. O Tribunal Judicial de Base, por Acórdão de 20 de Junho de 2017, condenou A, pela prática de um crime de ofensa grave à integridade física por negligência, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, bem como no pagamento dum valor total de MOP$7.044.630,49, soma dos montantes de MOP$1.200.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, e de MOP$5.844.630,49, a título de indemnização por danos patrimoniais (dos quais a quantia de MOP$4.922.342,14 é a indemnização por perda da capacidade de ganho).

O Tribunal de Segunda Instância (TSI), por Acórdão de 24 de Maio de 2018, concedeu provimento parcial ao recurso interposto pelo A, reduzindo a indemnização por perda da capacidade de ganho para MOP$4.300.000,00 e a indemnização por danos não patrimoniais para MOP$1.000.000,00. Recorre, novamente, A para o Tribunal de Última Instância (TUI), alegando que o ofício passado pela DSF, como instrumento legal, tem força probatória plena, pelo que o vencimento constante do mesmo prevalece sobre a declaração da companhia; no cálculo do montante indemnizatório, a decisão recorrida não fez dedução adequada das despesas médicas futuras e não calculou a indemnização da outra Seguradora; o montante indemnizatório por danos da incapacidade para o trabalho e o por danos morais determinados na decisão recorrida são elevados. A também solicitou ao Tribunal que, quando se deparasse com questões de conhecimento oficioso, que pusesse em causa a sanção penal do A, os autos não fossem reenviados para novo julgamento mas sim conhecidos directamente pelo TUI.

O Tribunal Colectivo conheceu do caso.

Antes de mais, o Tribunal Colectivo indicou que a questão de falta de dedução adequada das despesas médicas futuras, alegadamente verificada no acórdão recorrido, e uma questão não suscitada no recurso para o TSI e, no presente recurso, não se trata de questão oficiosa, pelo que o Tribunal Colectivo não conhece da questão; quanto à matéria penal, dado que não cabe recurso, também não se conhece. No tocante à questão de que a decisão recorrida não calculou a indemnização da outra Seguradora, o Tribunal Colectivo julgou improcedente essa questão suscitada por os factos que estão na base da questão não terem sido alegados nos articulados da acção cível enxertada e, por não se saber se os factos alegados ocorreram, nem que danos concretos estariam a ser ressarcidos. No tocante à força probatória do ofício passado pela DSF, o Tribunal Colectivo indicou que, não há prova tarifada, pelo que o Tribunal se podia convencer com quaisquer meios de prova admissíveis em juízo, assim, julgou também improcedente essa questão suscitada.

No que concerne ao cômputo da indemnização por perda da capacidade de ganho, o Tribunal Colectivo indicou que, dentro do dano patrimonial, é usual distinguir o dano emergente do lucro cessante. No presente caso, o lesado ficou com uma incapacidade permanente de 70% e não é possível suprimi-la, trata-se de um dano actual e não futuro. O que pode constituir um dano futuro é a diferença de rendimentos do trabalho que pode vir a sofrer se passar a auferir um salário inferior ao actual ou mesmo se deixar de auferir qualquer rendimento do trabalho por força da sua incapacidade. Deste modo, a perda de ganho é um dano futuro. A perda da capacidade de ganho é um prejuízo sofrido (já existente) e verificável. Indiscutivelmente que o dano sofrido pelo lesado é ressarcível. Embora o seu salário se mantenha, a sua capacidade para o trabalho ficou afectada. Sempre terá direito a ser indemnizado pela incapacidade permanente parcial para o trabalho, porque a sua capacidade para trabalhar, para realizar uma actividade física ou espiritual, foi afectada de forma definitiva e permanente. Foi um activo de que ficou privado para sempre e de que deve ser indemnizado nos termos gerais. No caso, o montante da indemnização por perda da capacidade de ganho, como resulta do n.º 6 do art. 560.º do Código Civil, é fixado equitativamente pelo tribunal dentro dos limites que tiver por provados. Aos factos provados, o Tribunal Colectivo entende ser adequado fixar a quantia de MOP$4.100.000,00.

Quanto às indemnizações por danos não patrimoniais, o Tribunal Colectivo, atendendo aos factos provados, entende ser razoável e ajustado fixar o respectivo valor em MOP$700.000,00.

Face ao expendido, o Tribunal Colectivo concede parcial provimento ao recurso, fixando as indemnizações por perda da capacidade de ganho e por danos não patrimoniais, respectivamente, em MOP$4.100.000,00 e MOP$700.000,00, no mais se mantendo o decidido pelo acórdão recorrido.

Vide Acórdão do TUI, no Processo n.º 76/2018.

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

07/11/2018



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