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No caso de suicídio da vítima de sequestro em queda de edifício, o TUI alterou a qualificação jurídico-penal e manteve a pena aplicada


Os réus A, B e C e pelo menos 6 indivíduos, com o objectivo de enriquecerem ilegitimamente, emprestavam dinheiro a jogadores dentro dos casinos para fim de jogo a juros fixados por eles próprios. Quando os jogadores não conseguiam pagar a dívida a tempo, obrigavam-nos então a liquidar a dívida contra a própria vontade, fazendo uso de todos os métodos violentos. Em 25 de Abril de 2017, a vítima D pediu emprestados HKD$50.000,00 aos réus; foi ao Casino X para jogar e perdeu todo o dinheiro. Como D não conseguira devolver atempadamente o dinheiro, B e um outro indivíduo não identificado levaram D para um quarto dum apartamento, sito no 9.º andar do Edifício Y para o vigiarem. Na altura, A, B, C, entre outros indivíduos, não paravam de instar com D que lhes devolvesse o dinheiro o mais rapidamente possível; bateram-lhe e recusaram-se a deixá-lo ir embora. Posteriormente, D pediu para ir à casa de banho. Uma vez entrado na casa de banho, D fechou a porta imediatamente e abriu a janela. Caiu da janela e morreu. Efectuado o julgamento, o Tribunal Judicial de Base condenou A, B e C como co-autores da prática do crime de sequestro (agravado), p. e p. pelo art.º 152.º, n.ºs 1 e 3, do Código Penal de Macau, fixando a A e B a pena de 6 anos de prisão, e a C a de 5 anos e 6 meses de prisão. Inconformados, os três réus recorreram para o Tribunal de Segunda Instância que negou provimento aos recursos. Ainda inconformados, os réus recorreram para o Tribunal de Última Instância, pugnando por uma alteração da qualificação jurídico-penal da factualidade dada como provada, passando os mesmos a ser condenados pela prática de um crime de sequestro, previsto no art.º 152.º, n.º 2, al. e), com a consequente redução das penas decretadas.

O Tribunal Colectivo do TUI conheceu do caso.

Antes de mais, o Tribunal Colectivo apontou que os três réus não questionaram a matéria de facto, e não se vislumbrou qualquer vício em relação à sua decisão, tendo a mesma como definitivamente fixada. Acrescentou o Tribunal Colectivo que o art.º 152.º, n.ºs 2, 3 e 4, do Código Penal de Macau prevê a forma agravada do crime de sequestro e a agravação ocorrida em “consequência do seu resultado” está preceituada na alínea e) do n.º 2 e n.º 3. No caso vertente, para a agravação pelo resultado indispensável é que entre o “sequestro” e o “resultado” haja uma conexão causal, e que este “resultado” possa ser imputado aos agentes do crime a título de negligência, nos termos do regime do art.º 17.º do Código Penal. In casu, não se provou que foi para poder escapar do quarto em causa é que D entrou na casa de banho e abriu a janela para fugir, e que os actos dos três réus levaram a que D, com o objectivo de escapar do quarto mencionado, abrisse a janela para fugir. Pelo contrário, conforme os factos provados, a porta da casa de banho estava trancada, e puxando as grades da janela para trás ligeiramente com mais força, já dava para um adulto sair pela janela através do espaço; além disso, nem por cima, nem por baixo da janela, havia objectos adicionais instalados que pudessem servir, a quem fugisse, como ponto de apoio, onde colocar os pés. Tendo apreciado os factos provados e os não provados em apreço, entendeu o Tribunal Colectivo que o falecimento de D não foi consequência de uma fuga tentada, mas sim de uma queda intencional pelo próprio D procurada. As próprias regras de experiência e da normalidade das coisas o ditam: a privação da liberdade, as agressões, coacções, e todos os demais factores teriam colocado D em situação de desespero e perturbação psicológica que, por sua vez, contribuíram, para que viesse a adoptar a conduta de cair da janela. O Tribunal Colectivo concluiu que não se deveria subsumir a conduta dos três réus no preceituado no n.º 3 do art.º 152.º do Código Penal, mas sim no previsto no n.º 2, al. e), ou seja, o “sequestro”, praticado pelos três réus, causou o suicídio de D. A morte, prevista no n.º 3, é alheia à vontade da vítima, como, por exemplo, em consequência das lesões sofridas pelas agressões e com a falta de cuidados, a falta de alimentação, etc.

Alterada a qualificação jurídico-penal, mostra-se indispensável a nova determinação da pena. Considerando as fortes imposições de prevenção geral e especial no caso, tendo em atenção o tipo, a natureza e as consequências do crime e o seu impacto na paz social da R.A.E.M., tem-se, por justa e adequada, a pena individual de 6 anos de prisão. Considerando que o presente recurso foi interposto pelos réus e tendo-se em conta o princípio da proibição da reformatio in pejus, manteve-se a pena de 5 anos e 6 meses de prisão antes aplicada ao 3.º réu.

Nos termos expostos, acordaram no Tribunal Colectivo em conceder parcial provimento ao recurso interposto pelos três réus, ficando os mesmos condenados como co-autores de um crime de sequestro (agravado), p. e p. pelo art.º 152.º, n.º 2, al. e), do Código Penal de Macau, mantendo-se, no restante, o decidido pelas Instâncias recorridas.

Cfr. Acórdão do processo n.º 43/2020 do Tribunal de Última Instância.



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