A era médico de medicina tradicional chinesa. Desde 23 de Novembro de 2018, os Serviços de Saúde receberam, sucessivamente, oito queixas de infracção apresentadas contra A e, em consequência, instauraram-lhe logo o processo de investigação. Em 24 de Julho de 2019, os Serviços de Saúde oficiaram a A, indicando-lhe que lhe seria cancelada a autorização da licença para o exercício da medicina tradicional chinesa por ter cometido infracções ao prestar cuidados de saúde e que A poderia apresentar, no prazo designado, parecer escrito aos Serviços de Saúde. Em 7 de Agosto de 2019, através do mandatário judicial, A apresentou contestação escrita. Por despacho de 19 de Agosto de 2019, os Serviços de Saúde, nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2 do art.º 4.º do Decreto-Lei n.º 81/99/M, de 15 de Novembro, decidiram cancelar a A a autorização da licença para o exercício da medicina tradicional chinesa, uma vez que, no período compreendido entre Dezembro de 2017 e Novembro de 2018, A, no exercício da actividade de médico, praticara actos ilícitos que violaram a ética e a deontologia médicas e que não foram associados a tratamento clínico, contra, pelo menos, oito utentes. Em 24 de Setembro de 2019, da aludida decisão A recorreu contenciosamente para o Tribunal Administrativo. Findo o julgamento, concluiu o TA que o art.º 4.º do Decreto-Lei n.º 81/99/M não previa o cancelamento da licença e que os Serviços de Saúde violaram o princípio da legalidade por terem cancelado a A a licença com base na disposição em apreço; assim sendo, concedeu provimento parcial ao recurso interposto por A, anulando a decisão proferida pelos Serviços de Saúde. Inconformados, os Serviços de Saúde interpuseram recurso jurisdicional para o Tribunal de Segunda Instância.
O Tribunal Colectivo do TSI conheceu do caso.
Conforme o Tribunal Colectivo, a norma do n.º 2 do art.º 4.º do Decreto-Lei n.º 81/99/M visa conferir à autoridade sanitária poderes de actuação expedita e célere que lhe permitam tomar determinadas medidas que, em concreto, se mostrem indispensáveis e adequadas à prevenção da doença, fora do modo normal de actuação administrativa, se existir um perigo para a saúde individual ou colectiva iminente, nomeadamente, porque a autoridade sanitária age sem dependência hierárquica e sem necessidade de observar qualquer procedimento administrativo. A citada norma confere poderes excepcionais à autoridade sanitária e como é evidente deve ser usada excepcionalmente. A alínea e) do n.º 2 do art.º 8.º do Decreto-Lei n.º 81/99/M prevê expressamente que a competência para o cancelamento da licença, prevista para o exercício da actividade privada de prestação de cuidados de saúde, é do Director dos Serviços de Saúde, não enquanto autoridade sanitária, mas enquanto órgão da Direcção dos Serviços de Saúde no exercício das funções de regulação da actividade privada de prestação de cuidados de saúde. Ademais, o cancelamento da licença para exercício da medicina tradicional chinesa encontra-se disciplinado nos artigos 21.º e 24.º do Decreto-Lei n.º 84/90/M, de 31 de Dezembro, isto é, os Serviços de Saúde só podem cancelar a licença supramencionada em caso de reincidência ou quando esta tenha sido objecto de suspensão mais do que duas vezes no prazo de três anos. Sub judice, não se verificava a sobredita situação. Independentemente do grau de censurabilidade das infracções cometidas por A, os Serviços de Saúde só lhe poderiam cancelar a licença quando se verificassem os pressupostos legalmente previstos, mas sempre dentro do quadro legal.
Face ao expendido, acordaram no Tribunal Colectivo em negar provimento ao recurso, interposto pelos Serviços de Saúde, mantendo-se a sentença do TA.
Cfr. Acórdão, proferido pelo Tribunal de Segunda Instância no processo n.º 638/2020.