Em 28 de Janeiro de 2022, o Tribunal de Última Instância conheceu dos dois recursos contenciosos interpostos por agentes do Corpo de Polícia de Segurança Pública contra decisões que lhes aplicaram a pena disciplinar de demissão.
No 1.º caso (processo n.º 137/2021), o agente policial A apresentou os atestados médicos ao serviço a que pertencia, para justificar a sua ausência no período de 10 de Maio a 8 de Agosto de 2019. Durante esse período, em 5 de Julho de 2019, A compareceu à Junta de Saúde, tendo o mesmo sido informado pela presidente da Junta de que ele perdera em 5% a capacidade de trabalho, e deveria regressar ao posto de trabalho. Porém, A ignorou essas informações e continuou a ausentar-se do serviço. Por fim, em 16 de Agosto do mesmo ano, A voltou a comparecer à Junta de Saúde, tendo sido informado pela presidente da Junta de não ter sido confirmado o período de ausência supramencionado. Esse parecer da Junta de Saúde foi homologado pelo Director dos Serviços de Saúde em 20 de Agosto de 2019. Em 25 de Outubro do mesmo ano, A foi pessoalmente notificado, por escrito, daquele acto de homologação. Por despacho do Secretário para a Segurança, datado de 20 de Abril de 2020, por violação do dever de assiduidade, foi aplicada a pena disciplinar de demissão a A que se encontrava em 73 dias de faltas sucessivas injustificadas ao serviço. Desse despacho A recorreu contenciosamente para o Tribunal de Segunda Instância que julgou improcedente o recurso. Inconformado, A interpôs recurso para o TUI.
No 2.º caso (processo n.º 141/2021), o agente policial B começou a faltar ao serviço no dia 29 de Março de 2019, assim se mantendo até 22 de Outubro, justificando as faltas com atestados médicos. Em 1 de Novembro de 2019 a Junta de Saúde deliberou não confirmar os atestados médicos apresentados por B e determinou que se deveria apresentar ao serviço de imediato, deliberação essa homologada pelo Director dos Serviços de Saúde na mesma data. Porém, B ignorou a deliberação e continuou a ausentar-se do serviço. A Junta de Saúde reuniu de novo no dia 6 de Dezembro de 2019 e determinou não confirmar a falta de assiduidade de B desde 29 de Março. Por despacho do Secretário para a Segurança, datado de 21 de Setembro de 2020, por violação dos deveres de assiduidade e de disponibilidade, foi aplicada a pena de demissão a B que se encontrava em sucessivas ausências ilegítimas. Inconformado, B recorreu contenciosamente para o TSI que julgou procedente o recurso, anulando-se a decisão recorrida. Inconformado com a decisão, veio o Secretário para a Segurança recorrer para o TUI.
O Tribunal Colectivo do TUI conheceu dos dois casos.
De acordo com o Tribunal Colectivo, o que está em causa é saber se só com o acto de homologação praticado pelo Director dos Serviços de Saúde é que se produz um acto administrativo definitivo e executório, ou se, pelo contrário, a Junta de Saúde já havia praticado um acto executório, valendo a homologação do Director dos Serviços de Saúde como uma mera confirmação ou ratificação. Ora, resulta claramente do disposto no n.º 7 do art.º 105.º do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau (ETAPM) e na al. f) do n.º 2 do art.º 8.º do Decreto-Lei n.º 81/99/M, a lei designa os actos da Junta de Saúde como “pareceres”. A regra geral no nosso direito é que, se a lei não disser o contrário, os pareceres são obrigatórios, mas não vinculativos. No entendimento do Tribunal Colectivo, nos presentes dois casos, a Junta de Saúde limitou-se a emitir pareceres, obrigatórios ao abrigo do art.º 105.º do ETAPM, mas não vinculativos atento o disposto no art.º 91.º do Código do Procedimento Administrativo, uma vez que não se encontra nenhuma norma legal expressa em contrário a impor a natureza vinculativa dos pareceres emitidos pela Junta de Saúde. Por outro lado, é o acto de homologação praticado pelo Director dos Serviços de Saúde o acto definitivo e executório, que produz efeito vinculativo sobre os trabalhadores da função pública, não sendo a Junta de Saúde a tomar uma decisão. Por conseguinte, os meros pareceres não constituíram os dois agentes policiais em causa no dever de regressar ao trabalho no dia seguinte, não os podendo impedir de continuar a justificar as suas faltas por doença com atestados médicos nos termos previstos na alínea a) do art.º 100.º do ETAPM.
Apontou ainda o Tribunal Colectivo que, sendo os actos homologatórios em apreço os actos administrativos que produzem efeito vinculativo, afectando a posição jurídica do trabalhador, afigura-se necessária a sua notificação de acordo com o disposto nos artigos 68.º a 70.º do Código do Procedimento Administrativo. O dever de apresentação ao serviço dos aludidos agentes só se constitui com a notificação dos actos administrativos de homologação dos ditos pareceres pelo Director dos Serviços de Saúde, não se podendo afirmar que os agentes não cumpriram o dever de apresentação.
Pelo exposto, acordaram no TUI em conceder provimento ao recurso interposto pelo Recorrente A do 1.º caso, revogando-se o acórdão recorrido e anulando-se o acto administrativo recorrido; e negar provimento ao recurso interposto pelo Recorrente do 2.º caso, Secretário para a Segurança, confirmando-se o acórdão recorrido.
Cfr. os acórdãos proferidos pelo Tribunal de Última Instância nos processos n.ºs 137/2021 e 141/2021.