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A um servidor público foi aplicada a pena disciplinar de demissão pelo uso pródigo do“sistema de busca”da versão do Governo


A exercia o cargo de assistente de relações públicas especialista, 2.º escalão, no Instituto para os Assuntos Municipais, cujo conteúdo funcional era atendimento ao balcão, recepção de documentos, e recepção de queixas, entre outros, sendo competente para usar a “versão do Governo” da “Plataforma de Serviços Registais e Notariais via Internet” (sistema de busca) da Direcção dos Serviços de Assuntos de Justiça, sistema esse que só poderia ser usado quando fosse necessário no exercício das suas funções. Segundo a DSAJ, no período de 20 de Junho de 2017 a 13 de Setembro de 2019, A consultou, através do referido sistema, as informações do registo predial por 461 vezes. Após investigação, detectou-se que A tinha usado injustificadamente por tantas vezes o aludido sistema para consultar e/ou extrair as informações do registo predial e/ou as buscas. A alegou, no auto de declaração no procedimento disciplinar instaurado contra ele, que pretendia mudar da residência, pelo que usou o sistema em causa para encontrar informações do registo predial relativas às fracções autónomas favoritas. Ademais, A ainda admitiu que quando se sentia entediado, consultava os dados pessoais constantes dos outros sistemas internos do IAM. De acordo com as instruções internas do IAM, devem os trabalhadores usar, em objecto de serviço, os equipamentos informáticos de software e hardware, e os diversos serviços de informação fornecidos pelo referido Instituto, bem como garantir a segurança das informações e o uso razoável dos recursos. Pelos factos acima expostos, por despacho do Secretário para a Administração e Justiça, datado de 14 de Julho de 2020, a A foi aplicada a pena disciplinar de demissão. Inconformado, A recorreu contenciosamente para o Tribunal de Segunda Instância que negou provimento ao recurso.

Ainda inconformado, veio A interpor recurso para o Tribunal de Última Instância, entendendo que o acto administrativo impugnado padecia do vício de “défice de instrução” já alegado no recurso contencioso e violava as normas legais dos artigos 59.º e 86.º do Código do Procedimento Administrativo.

O Tribunal Colectivo do TUI conheceu do caso.

Conforme o Tribunal Colectivo, o “princípio do inquisitório” consagrado no art.º 59.º do Código do Procedimento Administrativo constitui um princípio geral do procedimento administrativo, o que tem a ver com os poderes de a Administração proceder às investigações necessárias ao conhecimento dos factos essenciais ou determinantes para a decisão, exigindo-se dela (ou imputando-lhe a responsabilidade correspondente) a descoberta e ponderação de todas as dimensões de interesses públicos e privados que se liguem com a decisão a produzir, cuja omissão pode implicar ilegalidade do acto final do procedimento, por deficit de instrução. No entendimento do Tribunal Colectivo, nenhuma censura merece o acórdão recorrido, uma vez que, tal como foi mencionado no parecer emitido pelo Ministério Público, se é certo que a Administração tem o dever de investigação dos factos procedimentalmente relevantes, devendo fazê-lo do modo mais completo possível, não o é menos que, nesta matéria, se mostra inarredável uma dimensão discricionária na condução da própria instrução. Por isso, se deve considerar que é o órgão instrutor o único a quem compete julgar da necessidade das diligências em termos de instrução do procedimento administrativo e da consistência da comprovação já existente sobre as questões de facto e de direito relevantes. Assim, se o órgão instrutor ou a própria entidade decisora considerar que as diligências probatórias efectuadas são suficientes no sentido de permitirem uma decisão fundada sobre todas as questões de facto cujo apuramento constitui objecto do procedimento administrativo e que são pertinentes e relevantes tendo a vista a prolação da decisão final, não se poderá falar, nessa circunstância, de um défice instrutório, o qual apenas ocorre se o agente deixa por averiguar todos os factos cujo conhecimento seja conveniente para a justa e rápida decisão do procedimento. Assim sendo, nenhuma censura merece a decisão administrativa, ora objecto do recurso contencioso.

Nos termos expostos, acordaram no Tribunal Colectivo em negar provimento ao recurso interposto por A.

Cfr. Acórdão proferido pelo Tribunal de Última Instância no processo n.º 135/2021.