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No processo de obras ilegais executadas em Kun Iam Tong, o TSI convolou o crime para o de dano ao património cultural previsto pelo Código Penal


Ao abrigo da Lei n.º 11/2013 – Lei de Salvaguarda do Património Cultural, o Templo Pou Chai Sim Iun (Kun Iam Tong) foi classificado como monumento. Dispõe-se no art.º 38.º da mesma Lei que o licenciamento, por parte da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, de novas construções ou obras de demolição nos conjuntos ou sítios classificados, é precedido de parecer obrigatório e vinculativo do Instituto Cultural. A é Bonzo-Mor de Kun Iam Tong, e Presidente e Director da Assembleia Geral da Associação de Beneficência dos Bonzos de Kun Iam Tong, e a partir de 22 de Maio de 2018, B começou a exercer a função de Director da referida Associação, responsabilizando-se pelos trabalhos de reparação de Kun Iam Tong. No dia 18 de Maio de 2018, durante uma acção de vistoria realizada pelos trabalhadores do IC e da DSSOPT, descobriu-se que estavam em curso obras de construção de edificações informais e de demolição em Kun Iam Tong. No dia 21 de Maio, foi emitida pela DSSOPT a ordem de embargo das referidas obras, com advertência de que a violação da ordem de embargo seria punida pelo crime de desobediência qualificada previsto pelo Código Penal. No dia 23 de Maio, as autoridades realizaram de novo acção de vistoria a Kun Iam Tong, e verificaram indícios de andamento das obras, em consequência, os trabalhadores do IC elaboraram auto de notícia e tiraram fotos, notificando a supracitada ordem de embargo ao trabalhador C no local. Posteriormente, A usou telemóvel para tirar foto da referida ordem de embargo, e enviou-a a B, que por sua vez, acusou a recepção da notificação. No período entre 18 de Maio de 2018 e 30 de Janeiro de 2019, as autoridades realizaram várias vistorias a Kun Iam Tong e descobriram que as obras ilegais continuaram a ser executadas. Apos julgamento, o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base condenou A pela prática, como cúmplice material e na forma consumada, de 1 crime de dano qualificado, p. p. pelo art.º 207.º, n.º 2, al. c), conjugado com os art.ºs 26.º e 67.º do CPM, na pena de 1 ano de prisão, suspensa na execução pelo período de 3 anos; e condenou B pela prática, em autoria material e na forma consumada, de 1 crime de desobediência qualificada, p. p. pelo art.º 312.º, n.º 2 do CPM, conjugado com o art.º 96.º, n.º 3 da Lei de Salvaguarda do Património Cultural, na pena de 5 meses de prisão, e 1 crime de dano qualificado, p. p. pelo art.º 207.º, n.º 2, al. c) do CPM, na pena de 3 anos; em cúmulo jurídico, condenou B numa pena de 3 anos e 3 meses de prisão efectiva.

Inconformados, A e B recorreram para o Tribunal de Segunda Instância, entendendo que as suas condutas deveriam constituir o crime de dano qualificado previsto pela al. d) do n.º 1 do art.º 207.º do CPM, e o tribunal a quo aplicou erradamente a lei ao condená-los pelo crime de dano qualificado previsto pela al. c) do n.º 2 do art.º 207.º do CPM.

O Tribunal Colectivo do TSI conheceu do caso. Na sua resposta, o Magistrado do Ministério Público disse que, do texto do n.º 1 do art.º 207.º do CPM resulta que, o “património cultural” (em chinês: 文化財產) é classificado por uma outra lei. O património cultural da RAEM é regulado pela Lei de Salvaguarda do Património Cultural, que prevê a definição do património cultural, para efeitos de protecção de bens classificados como património cultural. Não é difícil constatar que, na al. d) do n.º 1 do art.º 207.º do CPM, diz-se “文化財產”, e na Lei de Salvaguarda do Património Cultural, usa-se a expressão “文化遺產”, mas ambos os diplomas usam o termo jurídico de “património cultural” nas suas versões portuguesas, pelo que o “património cultural” referido na al. d) do n.º 1 do art.º 207.º do CPM é o “património cultural” definido pela Lei de Salvaguarda do Património Cultural. O Tribunal Colectivo concordou com a aludida análise do MP, indicando que, desde que Kun Iam Tong foi classificado como monumento nos termos da Lei de Salvaguarda do Património Cultural, deveria ser aplicável o disposto na al. d) do n.º 1 do art.º 207.º do CPM, tomando como referência o conceito na al. b), em vez da al. c) do n.º 2 (coisa que possua importante valor histórico). Procedem, assim, os recursos dos dois recorrentes na parte relativa à errada aplicação da lei no que diz respeito à incriminação, impondo-se a nova determinação da medida da pena a aplicar aos dois recorrentes.

Pelo exposto, o Tribunal Colectivo julgou parcialmente procedentes os recursos dos dois recorrentes, passando a condenar A pela prática, como cúmplice material e na forma consumada, de 1 crime de dano qualificado, p. p. pelo art.º 207.º, n.º 1, al. d), conjugado com os art.ºs 26.º e 67.º do CPM, na pena de 6 meses de prisão, suspensa na execução pelo período de 2 anos; e condenar B pela prática, em autoria material e na forma consumada, de 1 crime de dano qualificado, p. p. pelo art.º 207.º, n.º 1, al. d) do CPM, na pena de 1 ano, conjugando com a pena de 5 meses de prisão aplicada pelo tribunal a quo pela prática de 1 crime de desobediência qualificada, p. p. pelo art.º 312.º, n.º 2 do CPM, conjugado com o art.º 96.º, n.º 3 da Lei de Salvaguarda do Património Cultural; em cúmulo jurídico, foi B condenado numa pena de 1 ano e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução por 3 anos.

Cfr. Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, no Processo n.º 600/2021.



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