Desde o ano 2004, A abriu e detinha uma conta de jogo na sala VIP operada pela Companhia C e mediante essa conta podia pedir emprestadas fichas mortas para jogar com notas de empréstimo assinadas. A partir de 2016, como a sua conta já tinha acumulado um certo montante em dívida, A não podia pedir emprestadas mais fichas mortas para jogo mediante essa conta. A pedido de C, A devia depositar dinheiro ou fichas em numerário na sua conta ou transferir numerário para contas bancárias de C, e só tendo feito isso é que A ou outros determinados indivíduos podiam, por assinatura de notas de empréstimo, levantar fichas mortas de valor equivalente na sala VIP para jogar. Ao mesmo tempo, C exigiu o seguinte: se perdessem todas as fichas mortas, então A não podia recuperar o dinheiro já depositado nas contas acima referidas, pois seria destinado na sua totalidade para pagar a dívida mencionada na nota de empréstimo correspondente. Por outras palavras, as verbas depositadas eram, por natureza, cauções ou garantias.
Através do procedimento acima descrito, A podia ganhar comissões de fichas concedidas por C, calculadas com base nos montantes referidos nas notas de empréstimo. B era empregado de A, assistia no acolhimento dos clientes, acompanhando-os durante os jogos e ajudando-os a trocar fichas. B não tinha linha de crédito na sala VIP de C, nem autorização para pedir emprestadas fichas mortas para jogo. Em 3 de Setembro, 30 de Setembro e 2 de Outubro de 2016, A tinha clientes que desejavam jogar na sala VIP, portanto, mandava B depositar de cada vez a quantia de HKD1.000.000,00 na sua conta, e depois, B assinava a nota de empréstimo para levantar de cada vez fichas mortas para jogo no valor de HKD1.000.000,00 através da conta, entregando-as integralmente aos clientes de A para jogar ou apostar. Os empregados de C deviam sempre obter em primeiro lugar o consentimento de A e só com a permissão de chefia de C é que podiam deixar B assinar as três notas de empréstimo em causa e prestar-lhe as correspondentes fichas mortas para jogo.
Não tendo sido liquidadas as dívidas concernentes às respectivas notas de empréstimo, a Companhia C instaurou processo de execução contra A e B perante o TJB, pretendendo a liquidação. Todavia, A e B deduziram embargos à execução.
Proferida decisão pelo TJB, foram julgados parcialmente procedentes os embargos julgando extinta a execução quanto a B e prosseguindo quanto a A.
Não se conformando, a Companhia C recorreu para o TSI.
Considerou o TSI que embora B fosse empregado de A, verdade é que não lhe tinham sido concedidos poderes para praticar os referidos actos em representação de A, pois que não lhe tinha sido outorgada procuração alguma para contrair os referidos empréstimos. Pelo que, o TSI julgou procedente o recurso, anulou a parte de concessão do provimento aos embargos de B no acórdão recorrido, substituindo-a por negação e, em consequência, prosseguindo a acção executiva contra B intentada, também determinou a responsabilidade solidária entre os dois executados e manteve o remanescente da decisão recorrida.
Inconformado, B recorreu para o TUI.
O TUI assinalou que, não obstante B apenas ter aposto a sua assinatura sem expressa menção da qualidade em que intervinha, afigura-se no caso inaplicável o regime da responsabilização pessoal, previsto no art.º 70.º n.º 1 do Código Comercial, uma vez que esse regime tem especialmente o fim de evitar que através da não invocação do nome do proponente este se conseguisse furtar aos negócios que não lhe fossem úteis, aproveitando-se da aparência que resultava da posição socialmente típica do preposto, o que não é bem a situação dos presentes autos, em que C tinha cabal conhecimento de que B actuava sob instruções e em nome de A, de resto, em boa verdade e rigor, B era tão só e apenas um empregado de A.
Sustentou o TUI que, não se mostra adequado que C, sabendo perfeitamente das circunstâncias em que actuava B, pretenda, mesmo assim, prevalecer-se da assinatura por este aposta nas notas de empréstimo para, assim, conseguir uma maior garantia patrimonial dos valores em dívida.
Indicou que, sem esforço se alcança, o acórdão recorrido partiu de uma aplicação do regime civil da representação voluntária para afastar qualquer actuação em nome alheio de B. Entretanto, na verdade, afigura-se mais adequado considerar que se trata duma representação institória que não exige contemplatio domini, sendo esta uma das principais diferenças face ao regime da representação voluntária civil. A representação institória foi criada para evitar argumentações formais destinadas a evitar a sua aplicação, um dos seus argumentos formais mais eficientes consiste precisamente na falta de contemplatio domini, enquanto o TUI não tem nenhuma dúvida quanto à imputação de A e quanto aos termos e limites da actuação de B. Nos presentes autos, em que C tinha cabal conhecimento de que B actuava sob instruções e em nome de A, senão, não se poderia explicar porque tivesse vindo posteriormente, em 11 de Dezembro de2018, a exigir que A assinasse nas respectivas notas de empréstimo para lhe solicitar o pagamento. Assim, impõe-se concluir que B, no exercício da sua actividade profissional e sob instruções de A, actuou em nome deste último, não tendo celebrado negócios jurídicos em nome próprio, não tendo assim assumido – nem se tendo vinculado ao pagamento de – qualquer dívida.
Face ao exposto, em conferência, acordaram no Colectivo do TUI em conceder provimento ao recurso, anular o acórdão do TSI e, por conseguinte, confirmar a decisão do TJB.
Cfr. Acórdão do Tribunal de Última Instância no Processo n.º 19/2024.