Saltar da navegação

TSI negou provimento ao recurso interposto pela arguida de um caso de burla do amor


A partir da primeira metade de 2019, A (de sexo feminino) contactou B (de sexo masculino) por um aplicativo de rede social, manifestando-lhe a este a intenção de desenvolver uma relação amorosa com ele. A disse a B que era solteira, tinha uma família rica, era nobre em Shenzhen e possuía várias propriedades, incluindo uma fracção autónoma sita na Taipa, One Grantai. No fim de Maio, A e B tornaram-se namorados. No dia 5 de Junho do mesmo ano, A disse falsamente a B que estava grávida com filho de B e queria ir junto com B aos Estados Unidos registar o casamento e realizar a cerimónia, dizendo também que no casamento em Shenzhen era hábito a parte feminina prover a residência após o casamento e o homem era responsável pela prenda de casamento. B concordou com isso. No período compreendido entre 4 de Julho e 20 de Agosto, B, anuindo ao pedido de A, entregou-lhe sucessivamente um total de MOP230.000 a título de prenda de casamento. No início de Setembro, A disse a B que o negócio da sua família estava com problemas de dívida e, como eles dois iam casar-se, A registaria a fracção autónoma de One Grantai, de que era proprietária, em nome de B, mas a despesa da alteração de titular em causa, no valor de MOP120.000, devia ser paga por B e guardada provisoriamente a respectiva despesa por A. B concordou e entregou a A o montante de MOP120.000 no dia 2 de Setembro. No fim de Setembro, A disse a B que tinha falta de dinheiro vivo e que os depósitos a prazo no banco ainda não estavam disponíveis para levantamento, receando que B não tivesse dinheiro suficiente para cuidar do feto no seu ventre, por isso, pediu a B que lhe entregasse a quantia de MOP100.000 para que ela pudesse manter a gravidez tranquilamente. Nessa altura, B começou a suspeitar de A, por isso, dirigiu-se à Conservatória do Registo Predial para consultar os dados do proprietário da fracção autónoma de One Grantai, a qual A tinha declarado ser sua, e descobriu que o proprietário da fracção autónoma em causa não era A. Suspeitando ter sido burlado, B apresentou queixa à polícia. Com a investigação, foram inventados os factos alegados por A de que estava grávida de B e, em resultado, pediu o casamento e que era proprietária da fracção autónoma de One Grantai. A exibiu a ilusão de que a sua família era muito rica e inventou uma série de mentiras a B, com o objectivo de o enganar para lhe entregar o dinheiro em causa e dele se apropriar. Após a acusação deduzida pelo Ministério Público, o caso foi encaminhado para o Tribunal Judicial de Base para julgamento. Findo o julgamento, o Tribunal Judicial de Base condenou A pela prática de um crime de burla de valor consideravelmente elevado, p. e p. pelo art.º 211.º, n.º 4, alínea a), conjugado com o n.º 1 e o art.º 196.º, alínea b) do Código Penal de Macau, na pena de três anos de prisão efectiva. Inconformada, recorreu A para o Tribunal de Segunda Instância.

O Tribunal Colectivo do Tribunal de Segunda Instância conheceu do caso.

A impugnou vários factos dados como provados pelo Tribunal a quo, imputando a este Tribunal o erro notório na apreciação da prova. Mais concretamente, A alegou que nunca tinha ocultado a ninguém os factos de que era casada e tinha filhos, factos esses não dados como provados pelo Tribunal a quo. Perante isso, indicou o Tribunal Colectivo que, conforme o teor do aplicativo de rede social no telemóvel de A constante dos autos, A disse a B que era solteira e apenas extraiu a parte nas conversas do aplicativo de rede social que lhe era favorável, a fim de negar que ela tinha ocultado a B o facto de ser casada, ignorando deliberadamente a integridade e coerência das conversas no aplicativo de rede social, por isso, a pretensão de A não era credível. Além disso, A alegou que nos autos, para além da declaração prestada pela mãe de B, não havia nenhuma prova objectiva de que B lhe tinha pagado a quantia de MOP350.000. Face a isto, indicou o Tribunal Colectivo que os montantes de burla em causa eram a prenda de casamento e a despesa da transferência de titular. O Tribunal Colectivo entendeu que os registos de levantamento nas máquinas bancárias e os registos da conta bancária de B constantes dos autos eram suficientes para provar as declarações de B e da sua mãe sobre a entrega do dinheiro a A. O Tribunal a quo deu como provados os factos em causa, não se verificando erro notório na apreciação da prova. Além disso, A também imputou ao Tribunal a quo a violação da presunção da inocência e do princípio in dubio pro reo e o erro na qualificação jurídica, os quais foram indeferidos, um por um, pelo Tribunal Colectivo.

Face ao exposto, o Tribunal Colectivo do Tribunal de Segunda Instância negou provimento ao recurso interposto por A, mantendo a decisão recorrida.

Cfr. Acórdão do Tribunal de Segunda Instância no Processo n.º 39/2023.