
Os representantes da Direcção dos Serviços de Assuntos de Justiça (DSAJ) e do Instituto de Acção Social (IAS) visitaram, há alguns dias, a Associação Geral das Mulheres de Macau apresentando em detalhe o ponto da situação legislativa sobre a "Lei da violência doméstica" aos dirigentes desta Associação. A presidente da Associação Geral das Mulheres de Macau, Ho Teng Iat, referiu que a Associação tem acompanhado com muita atenção os trabalhos legislativos da "Lei da violência doméstica", desde o lançamento desta iniciativa legislativa até às várias consultas efectuadas nos últimos dois anos, acrescentando ainda que a Associação tem insistido sempre na necessidade da produção de um diploma autónomo que estabeleça um regime eficaz de protecção das mulheres e crianças contra os actos de violência doméstica, com efeitos dissuasivos e punitivos sobre os agressores. O director da DSAJ, Cheong Weng Chon, fez uma apresentação em detalhe do ponto da situação legislativa sobre a "Lei da violência doméstica", adiantando que, desde Setembro de 2011, foram realizadas em conjunto pela DSAJ e pelo IAS duas consultas públicas sobre a "Lei da violência doméstica", e que, com base nas opiniões recolhidas, tem-se procedido a um aperfeiçoamento contínuo do projecto da referida iniciativa legislativa. Por outro lado, desde Junho do corrente ano, foram realizadas cerca de 20 reuniões e palestras com as associações, instituições de serviços sociais e grupos de interesses envolvidos, deputados da Assembleia Legislativa, profissionais e especialistas, em que foram amplamente ouvidas as opiniões e propostas dos diversos sectores da sociedade sobre a legislação da violência doméstica. Definição clara e rigorosa do acto de violência doméstica No tocante à orientação legislativa da "Lei da violência doméstica", a questão mais discutida pelos diversos sectores da sociedade, numa fase anterior, centrou-se essencialmente na questão da qualificação do acto de violência doméstica como crime público ou como crime semi-público. Cheong Weng Chon manifestou que, nos termos das normas legais em vigor, todos os actos de violência doméstica já são considerados crime e um acto de violência grave também já constitui crime público. Em relação à qualificação dos actos mais graves de ofensa corporal e de maus tratos psicológicos ou físicos que vai passar de crime semi-público para crime público, os diversos sectores já chegaram, em princípio, a consenso, discordando-se essencialmente quanto à eventual qualificação dos confrontos físicos ocasionais e leves entre os membros de família como crime público. Após a realização recente de um diálogo amplo com as instituições e personalidades que se preocupam com o problema da violência doméstica, percebeu-se que as instituições de serviços sociais, as associações envolvidas e a população em geral raramente consideram como actos de violência doméstica os confrontos físicos ocasionais e leves que se verificam entre os membros de família. Por esta razão, o fulcro do processo legislativo relacionado com a "Lei da violência doméstica" não devia ser a questão de ser crime público ou crime semi-público, mas sim a necessidade de uma definição clara e rigorosa do acto de violência doméstica, de forma a permitir, mediante a alteração das disposições em causa no Código Penal, a instauração de procedimento penal contra os actos de violência doméstica que correspondam à definição dada, nos termos do procedimento relativo aos crimes públicos. Desta forma, poderá resolver-se, no caso de crime semi-público, não só o problema de necessidade de manifestação da vontade da vítima de violência doméstica em pedir a responsabilização penal do agressor junto dos órgãos judiciais (apresentação de queixa) para que seja instaurado o respectivo procedimento penal, como também será possível evitar que o "dar uma bofetada" entre os membros de família que resulte num dano físico leve seja considerado como acto de violência doméstica. Nesse contexto, a "Lei da violência doméstica", cujo projecto está na fase de elaboração, irá qualificar como actos de violência doméstica as ofensas corporais e os maus-tratos psicológicos ou físicos praticados entre os membros de família de que resultem uma consequência que não seja leve. No entanto, persistem reservas quanto à proposta apresentada pelas associações envolvidas sobre a qualificação de actos tais como "uso de palavrões ou injúrias, de forma oral ou através de telefone ou mensagem" ou do "convívio com uma atitude indiferente ou com falta de respeito perante os membros de família" como actos de violência doméstica. A eventual inclusão nos actos de violência doméstica da "violência financeira ou económica" tais como o facto de "não se contribuir para as despesas da família" ou "se contribuir com dinheiro insuficiente" merece ainda uma ponderação mais cuidadosa, na medida em que, por um lado, no entender da maioria das pessoas, os referidos actos estão longe de serem considerados violência doméstica e, por outro, há dificuldades na execução da lei e na prática judicial. Reforço das medidas de protecção das vítimas da violência doméstica Cheong Weng Chon referiu que, tendo como referência as experiências de diversos países e regiões, a proposta da "Lei da violência doméstica" irá reforçar as medidas de protecção das vítimas da violência doméstica, nomeadamente medidas de protecção policial, social e judicial, assegurando assim a segurança física, económica e de assistência médica das vítimas e evitando, mediante a tomada de medidas de interdição aplicadas ao agressor, a repetição de situações de violência doméstica. Por outro lado, propõe-se ainda a alteração das correspondentes disposições do Código Penal, no sentido de que todos os actos de abuso sexual contra menores passam a ser qualificados como crimes públicos, independentemente da existência ou não de relação familiar entre o agressor e a vítima menor. A relação de "coabitação entre pessoas do mesmo sexo" não é, por enquanto, incluída no conceito de membro de família Na definição de membro de família a constar da "Lei da violência doméstica", para além dos cônjuge e parentes ou afins na linha recta, inclui-se também os ex-cônjuges e as pessoas com relação de adopção, entre outros. As pessoas de sexo diferente que coabitem em condições análogas às dos cônjuges serão incluídas na definição de membro de família, uma vez que essa relação é reconhecida pelo regime jurídico civil de Macau. Considerando que não estão actualmente previstas quaisquer disposições legais sobre a relação de "coabitação entre pessoas do mesmo sexo" no regime jurídico de Macau e que a "Lei da violência doméstica" vai introduzir alterações ao Código Penal e ao Código de Processo Penal em vigor, a sua inclusão no conceito de membro de família vai dar origem a uma desconformidade no regime jurídico. No entanto, os serviços actualmente prestados pelo IAS e pelas instituições de serviços sociais não serão afectados pela definição de membro de família a constar da "Lei da violência doméstica", podendo os respectivos serviços ser estendidos também às vítimas que se encontrem numa relação de coabitação com pessoa do mesmo sexo. Além disso, as respectivas vítimas também poderão intentar acção penal contra os agressores nos termos do regime geral da lei penal em vigor. A DSAJ e o IAS manifestaram os seus agradecimentos à Associação Geral das Mulheres de Macau pelo apoio dado ao longo do desenvolvimento dos trabalhos legislativos relativos à violência doméstica, afirmando que os dois serviços irão concluir o projecto da proposta da "Lei da violência doméstica" com a maior brevidade possível, esforçando-se pela sua entrega à apreciação da Assembleia Legislativa até ao final do corrente ano. Em relação ao regime e às medidas definidos pela "Lei da violência doméstica", poderá proceder-se à sua avaliação e aperfeiçoamento ao fim de algum tempo após a entrada em vigor do diploma, de acordo com os resultados da sua execução.