A Comissão de Assuntos Eleitorais da Assembleia Legislativa (CAEAL) reiterou que, o entendimento das disposições sancionatórias quanto à subscrição múltipla previstas na Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa deve atender e fundamentar-se na intenção legislativa e no seu objectivo, devendo os respectivos casos serem tratados nos termos da lei, não implicando a questão da prevalência de uma língua oficial sobre outra.
A CAEAL cumpre rigorosamente as disposições previstas na Lei Básica e os termos legais vigentes
Consagra-se no artigo 9° da Lei Básica, “Além da língua chinesa, pode usar-se também a língua portuguesa nos órgãos executivo, legislativo e judiciais da Região Administrativa Especial de Macau, sendo também o português língua oficial.” Para além disso, nos termos do artigo 1° e artigo 5° do Decreto-Lei n.° 101/99/M, as línguas oficiais, a língua chinesa e a língua portuguesa, são ambas veículo de expressão válido de quaisquer actos jurídicos. Qualquer das versões nas duas línguas oficiais de um acto normativo faz fé pública. No caso de se verificarem divergências entre as versões de um acto normativo, adopta-se o sentido admitido por ambas, tendo em conta as regras normais de interpretação da lei ou, não sendo tal possível, o sentido que melhor se coaduna com os objectivos prosseguidos pelo acto.
Por outro lado, de acordo com o Código Civil, a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada.
O n.° 1 do artigo 150.° da Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa vigente, na sua versão em língua chinesa refere que “在同一選舉中提名同一人參與不同候選名單者,科最高一百日罰金” , e o n.° 2 do artigo 186.°, na versão em língua chinesa refere que “任何市民,因過失在同一選舉中提名同一人參與不同的候選名單者,科澳門幣五百元至一千五百元罰金”.
Enquanto que, na versão em língua portuguesa, o n.° 1 do artigo 150.° prevê: “quem propuser candidaturas concorrentes entre si à mesma eleição é punido com pena de multa até 100 dias”, o que, literalmente, exprime a ideia de que quem propuser candidaturas que concorrem entre si à mesma eleição é punido com pena de multa até 100 dias; a versão em língua portuguesa do n.° 2 do artigo 186.° preceitua que “Os cidadãos que, por negligência, propuserem candidaturas concorrentes entre si à mesma eleição são punidos com multa de 500 a 1 500 patacas”, significando literalmente, que os cidadãos que, por negligência, propuserem candidaturas que concorrem entre si à mesma eleição são punidos com multa de 500 a 1 500 patacas.
Como acima referido, e no que respeita à interpretação da lei, não existe efectivamente a questão da prevalência de uma língua oficial sobre outra, em virtude de qualquer das versões nas duas línguas oficiais de um acto normativo fazer fé pública, sendo o mais importante o esclarecimento da intenção legislativa dos respectivos articulados.
A seguir ao estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau, foi aprovada, em 2001, a primeira Lei Eleitoral. Procedendo-se à análise da estrutura global e de todos os articulados dessa lei, verifica-se que a Lei Eleitoral após a transferência de soberania foi elaborada basicamente tendo por referência a Lei Eleitoral antes da transferência, aprovada pela Lei n.° 4/91/M.
Em comparação com a Lei Eleitoral vigente antes da transferência de soberania, os articulados em causa correspondem aos artigos 146.° e 179.°, cujas redacções na versão em língua portuguesa são idênticas às da Lei Eleitoral em vigor. No entanto, o que não acontece nas redacções da versão em língua chinesa, embora as redacções em língua portuguesa desses dois articulados sejam muito semelhantes.
O órgão legislativo procedeu, respectivamente, em 2008, 2012 e 2016 a alterações a alguns articulados da Lei Eleitoral, não tendo contudo procedido a alterações materiais dos artigos 150.° e 186.° da Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa, com excepções das meras alterações no que respeita à sanção estipulada no n.° 2 do artigo 186.°, que passou de uma pena de multa de 250 a 750 patacas para a de 500 a 1 500 patacas.
Após uma interpretação sistemática sobre a Lei Eleitoral, a CAEAL considera que a versão em língua portuguesa é a mais aproximada à intenção legislativa original.
De acordo com o n.° 3 do artigo 27.° da Lei Eleitoral para a Assembleia Legislativa, cada eleitor só pode subscrever uma lista de candidatos.
De todo o processo de propositura até a candidatura, a participação dos eleitores apenas limita-se à assinatura do formulário de constituição de comissão de candidatura. Nos procedimentos posteriores, cabe ao mandatário da comissão de candidatura e não ao próprio eleitor apresentar a respectiva candidatura, por essa razão, a lista de candidatura reflecte a vontade dos proponentes. Se o mandatário apresentar posteriormente a candidatura, o eleitor pode ser considerado como tendo proposto candidaturas diferentes e concorrentes entre si.
Assim, o exposto acima explica a razão pela qual o legislador exige a cada eleitor que apoie e assine uma só candidatura. Exactamente neste sentido, nos termos do artigo 150° ou artigo 186° da Lei Eleitoral, a propositura de candidaturas diferentes e concorrentes entre si nas mesmas eleições incorre em violação à lei.
De facto, da análise dos procedimentos de candidatura e das situações práticas, tendo em consideração que os interesses de cada comissão de candidatura são contraditórios, só há possibilidade de existir propositura de várias candidaturas que concorrem entre si, sendo impossível que várias comissões de candidatura proponham uma mesma pessoa integrante nas diferentes candidaturas. Portanto, a nível de interpretação jurídica, as redacções do artigo 150° ou artigo 186° na versão chinesa da Lei Eleitoral não estão conforme a intenção do legislador.
A CAEAL tem sempre vindo a observar de forma rigorosa os princípios plasmados na Lei Básica e na Lei acima referida, aplicando as respectivas disposições legais de acordo com a lei.
A propositura de candidatura constitui uma séria tomada de posição política de um eleitor e a subscrição múltipla pode conduzir ao apoio de candidaturas divergentes
A constituição de uma comissão de candidatura é considerada uma etapa essencial para se propor uma lista de candidatos. A intenção inicial e o objectivo do legislador seria o de opor-se a que um qualquer cidadão pudesse organizar candidaturas concorrentes entre si em caso de subscrição múltipla.
Assim, cada eleitor apenas poderia subscrever e apoiar uma só comissão de candidatura por assinatura, porque o eleitor ao subscrever a constituição duma comissão de candidatura, é automaticamente considerado como pretendente a constituir-se membro da comissão de candidatura, o que na prática, é considerado uma séria tomada de posição política do mesmo, já não sendo considerado, meramente, um apoio feito por assinatura de outrem.
Um eleitor que apoia a constituição de duas ou mais comissões de candidatura através de assinaturas é, deste modo, conduzido para apoios simultâneos a candidaturas diferentes (ou seja, candidaturas concorrentes entre si) nas mesmas eleições.
Assim, caso ocorram violações à lei, especialmente casos que possivelmente violem, por tentativa, as disposições do artigo 150° (Candidaturas plúrimas) e do artigo 144°, à CAEAL cabe proceder ao acompanhamento e sensibilizar os eleitores.
A CAEAL apela novamente, aos que angariam assinaturas e aos eleitores, para que não subscrevam multiplamente
Quanto à discrepância verificada na disposição dos artigos em causa entre a versão chinesa e a portuguesa da Lei Eleitoral respeitante a candidaturas plúrimas, o Governo da RAEM já se pronunciou no sentido de que irá verificar de forma abrangente todos os artigos da Lei Eleitoral. Na actual fase, a CAEAL irá realizar, para a próxima semana, encontros com as pessoas envolvidas nos casos de subscrição múltipla para verificar se efectivamente, as mesmas não entendem a lei.
A CAEAL apela novamente a que, cada eleitor assine apenas um pedido de reconhecimento de comissão de candidatura, devendo o eleitor ponderar prudentemente antes de fazer qualquer subscrição. Aos angariadores de subscrição cabe também o dever de explicar claramente aos eleitores as responsabilidades jurídicas que advêm de subscrições múltiplas e as eventuais consequências que possam resultar desse acto, evitando-se situações indesejadas de irregularidades.