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O CCAC concluiu a investigação sobre a integração dos cônjuges dos candidatos à habitação económica no agregado familiar


Recentemente, o Comissariado contra a Corrupção (CCAC) recebeu 27 queixas apresentadas por promitentes-compradores de habitação económica e uma queixa do escritório da deputada à Assembleia Legislativa, Lei Cheng I, nas quais se alega que o Instituto de Habitação (IH) indeferiu os pedidos para que os cônjuges dos promitentes-compradores de fracção de habitação económica não façam parte do agregado familiar, o que não só viola a Lei n.º 10/2011 (Lei da habitação económica), mas também se opõe ao previsto nas instruções que foram inicialmente disponibilizadas aos candidatos à aquisição de fracções de habitação económica, pelo que os queixosos solicitaram a intervenção do CCAC.

1. Desenvolvimento do caso da apresentação de queixas

Segundo foi apurado, todos os queixosos são candidatos às chamadas 19.000 habitações económicas anunciadas pelo Governo, candidataram-se, nos termos da antiga Lei da habitação económica, à habitação económica durante os anos de 2003 a 2005, tendo sido admitidos na lista de espera de habitação económica. Os queixosos, a quem foram atribuídas fracções de habitação económica, por volta do ano 2012, e com quem foram celebrados os respectivos contratos-promessa de compra e venda, passaram a habitar nas respectivas fracções.

Entre Abril e Maio de 2016, os queixosos receberam um ofício do IH em que, para efeitos da celebração da escritura pública de compra e venda das respectivas fracções de habitação económica, o IH solicitou aos mesmos a entrega de informações actualizadas sobre os elementos dos seus agregados familiares, nomeadamente no que respeita ao estado civil dos mesmos. Como os queixosos contraíram matrimónio no período de espera, preencheram a “Declaração para cônjuges que não façam parte do agregado familiar” disponibilizada pelo IH, solicitando assim que os respectivos cônjuges não passem a ser considerados elementos dos seus agregados familiares.

Entre Março e Abril de 2017, os queixosos receberam um ofício do IH, sendo notificados de que, nos termos da Lei da habitação económica, os seus pedidos para que os cônjuges não façam parte dos agregados familiares foram indeferidos, os cônjuges têm que passar a ser considerados como elementos integrantes dos agregados familiares. Nos casos em que os cônjuges dos queixosos possuem habitações próprias em Macau, e quando passaram a ser elementos integrantes dos agregados familiares, deixaram de se encontrar reunidos os requisitos legalmente previstos relativos à aquisição da fracção de habitação económica, e nesses casos os respectivos contratos-promessa serão resolvidos.

No entender dos queixosos, a decisão do IH não só viola a Lei da habitação económica, mas também é contrária ao esclarecimento incluso nas instruções que o próprio IH emitiu inicialmente, uma vez que quando os queixosos se preparavam para casar, informaram-se junto do IH sobre este assunto, e obtiveram a resposta de que desde que fosse adoptado o regime da separação de bens e o respectivo cônjuge não fizesse parte do agregado familiar para efeitos da candidatura, a qualificação para aquisição de fracção de habitação económica não seria posta em causa.

Muitos dos interessados ficaram preocupados que as fracções de habitação económica que lhes foram atribuídas possam ser recuperadas, e algumas figuras públicas, tais como alguns deputados à Assembleia Legislativa, têm estado também atentos ao caso. Em 21 de Abril de 2017, quando o Chefe do Executivo esclareceu os deputados na sessão plenária da Assembleia Legislativa, referiu que, sem prejuízo do cumprimento da Lei da habitação económica, o Governo da RAEM iria rever, de forma objectiva e justa, a legalidade e a razoabilidade das decisões administrativas do serviço público competente, de modo a proteger os direitos e interesses legítimos dos cidadãos.

Segundo o despacho do Secretário para as Obras Públicas e Transportes datado de 26 de Abril de 2017, tendo o mesmo tido conhecimento que foram expedidos diversos ofícios para promitentes-compradores de habitação económica, nos quais se questionava a legalidade da celebração da respectiva escritura pública de compra e venda, determinou que fosse de imediato comunicado àqueles que o ofício anteriormente enviado ficava sem efeito, e por outro lado exigiu que fosse prestada a plena colaboração na investigação do CCAC sobre o caso em apreço.

2. A mudança do ponto de vista jurídico do IH

Em relação à questão sobre o facto de os candidatos à habitação económica contraírem matrimónio durante a fase de espera e os respectivos cônjuges possuírem habitação própria, o IH emitiu em 12 de Outubro de 2011 uma instrução interna, indicando que se for adoptado o regime da separação de bens ou o regime da participação nos adquiridos, e os candidatos fizerem uma declaração para que o respectivo cônjuge não faça parte do agregado familiar, a qualificação para aquisição de fracções de habitação económica não será posta em causa.

A referida instrução interna foi distribuída aos trabalhadores do IH para que apliquem e prestem informações aos candidatos à aquisição de fracções de habitação económica. Em relação ao conteúdo desta instrução interna, o IH chegou a divulgar uma nota de imprensa e a elaborar uma série de perguntas e respostas que disponibilizou na sua página electrónica. Até ao início de 2017, o IH prestava esclarecimento e geria estas questões de acordo com aquela instrução interna.

Recentemente, surgiram alguns problemas na aplicação da Lei da habitação económica, nomeadamente nos casos em que os candidatos à aquisição de fracção de habitação económica se casaram durante a fase de espera, e o respectivo cônjuge possui habitação própria mas não faz parte do agregado familiar, pelo que a direcção do IH solicitou aos seus juristas que procedessem a um estudo sobre aquela disposição da Lei da habitação económica.

Segundo o parecer jurídico do IH datado de 9 de Fevereiro de 2017, consideram-se elementos do agregado familiar, nos termos definidos na Lei da habitação económica, todos aqueles que tenham relação familiar e vivam em comunhão com o candidato, pelo que, o candidato à fracção de habitação económica não pode fazer uma declaração com o objectivo de que os seus familiares que vivem em comunhão com ele não façam parte do agregado familiar, sob pena de incorrer no crime de “falsas declarações” previsto no artigo 50.º da mesma lei.

A direcção do IH está de acordo com o referido parecer e mandou aplicá-lo pelas suas subunidades. Por isso, desde Fevereiro de 2017, o IH mudou a sua posição e a prática até aí adoptada, passando a considerar que, desde que o casal tenha uma relação conjugal e viva em comunhão, o cônjuge passa automaticamente a ser considerado elemento do agregado familiar e, sendo assim, não serão deferidos os pedidos para os cônjuges não fazerem parte dos agregados familiares, a não ser que seja apresentado um motivo justificativo para tal, nomeadamente a separação do casal.

Segundo os dados disponibilizados pelo IH, relativamente aos pedidos para os cônjuges não fazerem parte dos agregados familiares, é de 104 o número total de pedidos indeferidos, tendo tais decisões sido comunicadas aos interessados; 77 casos foram já deferidos (mas a possível alteração desta decisão está em fase de ponderação); e 37 pedidos encontram-se ainda por decidir. Nestes 218 pedidos, há 183 casos em que os cônjuges dos candidatos à habitação económica possuem habitação própria em Macau.

3. Análise jurídica feita pelo CCAC

A questão-chave consiste em saber se o candidato à aquisição da fracção de habitação económica contrair matrimónio durante a fase de espera, poderá o seu cônjuge não fazer parte do agregado familiar? De acordo com o novo ponto de vista jurídico que o IH defende, a definição do agregado familiar prevista na Lei da habitação económica é uma norma imperativa, se o candidato contrair matrimónio durante a fase de espera, o seu cônjuge fará parte necessariamente do agregado familiar, não podendo deixar de declarar tal situação.

No entanto, na sequência de uma análise, o CCAC considera que, no n.º 1 do artigo 6.º da actual Lei da habitação económica, o agregado familiar define-se apenas a partir da qualificação da candidatura à aquisição da fracção de habitação económica, não estabelecendo a obrigatoriedade de que sempre que as pessoas vivam em comunhão devido à sua relação familiar, tenham de fazer parte do agregado familiar.

Em 2011, durante a discussão sobre a elaboração da actual Lei da habitação económica, na versão inicial da então proposta de lei apresentado à Assembleia Legislativa, o Governo da RAEM sugeriu que sendo residente da RAEM, o cônjuge do candidato à aquisição de fracção de habitação económica teria de fazer parte da lista do respectivo agregado familiar. Mas depois da discussão com a Assembleia Legislativa, esta solução foi eliminada no projecto de revisão e na versão final da lei aprovada.

Fazendo uma comparação, a definição do agregado familiar dada pelo Regulamento Administrativo n.º 25/2009 (Atribuição, Arrendamento e Administração de Habitação Social) é basicamente igual à prevista na Lei da habitação económica. No entanto, quanto aos requisitos para arrendamento de habitação social, o referido Regulamento Administrativo estabelece expressamente que “Com excepção dos cônjuges não residentes na RAEM, os cônjuges dos elementos do agregado familiar devem constar do mesmo boletim de candidatura.”

Na elaboração da Lei da habitação económica não foi adoptada a solução que defendia que o cônjuge do candidato à aquisição de fracção de habitação económica era obrigatório fazer parte da lista de elementos do agregado familiar, mas a mesma lei determina no seu artigo 18.º que é preciso declarar o rendimento mensal e o património líquido do cônjuge do candidato, quando este seja residente da RAEM e não faça parte do agregado familiar para efeitos de candidatura, sendo estes valores contados para efeitos da contagem dos rendimentos e património dos elementos do agregado familiar. Se os rendimentos e património dos elementos do agregado familiar forem superiores aos limites legalmente estabelecidos, o candidato não reunirá os requisitos de candidatura à aquisição de fracção de habitação económica.

Além disso, nos termos da alínea 5) do n.° 5 do artigo 14.° da Lei da habitação económica, não pode candidatar-se à aquisição de fracções quem seja cônjuge de candidato à compra, de promitente-comprador ou de proprietário de uma fracção de habitação económica, de modo a evitar que cada um dos membros do casal se candidatem individualmente à aquisição de fracções de habitação económica. Assim, esta norma não faria sentido algum se o cônjuge de candidato fosse obrigatoriamente elemento do agregado familiar.

O CCAC considera que a actual Lei da habitação económica não impõe a obrigatoriedade do cônjuge de candidato ter de fazer parte do agregado familiar. E a partir da entrada em vigor desta lei em Outubro de 2011, esta interpretação tem sido defendida pelo IH nos seus pareceres jurídicos, instruções internas, divulgações ao público e operações práticas. Nem o parecer do IH datado de Fevereiro de 2017 tem fundamentos de direito e de facto para alterar aquela interpretação. Por isso, o IH deve aceitar os pedidos apresentados pelos candidatos à aquisição de fracções de habitação económica que contraírem matrimónio durante a fase de espera para que os cônjuges não façam parte do agregado familiar, devendo emitir-lhes o termo de autorização para a celebração da escritura pública de compra e venda das fracções de habitação económica quando as demais condições legais estejam reunidas.

4. Serviços públicos devem agir de acordo com a lei

Desde Fevereiro de 2017, o IH alterou a sua posição e prática habitual, passando a indeferir os pedidos apresentados pelos candidatos que contraíram matrimónio durante a fase de espera para que os cônjuges não façam parte do agregado familiar. O motivo de tal indeferimento consiste em que os cônjuges de alguns candidatos possuem habitação própria em Macau e tem como objectivo um melhor aproveitamento dos limitados recursos da habitação pública. No entanto, a decisão do IH deve ser tomada com base num fundamento legal expresso e estar em conformidade com as disposições respectivas previstas na Lei da habitação económica.

O parecer jurídico elaborado pelo IH em 9 de Fevereiro de 2017 dá uma nova interpretação da Lei da habitação económica, o que não só contraria o parecer e a instrução interna que o próprio serviço tinha emitido em 12 de Outubro de 2011, alterou as instruções divulgadas ao público e as suas operações práticas ao longo dos anos, mas também poderá fazer com que os candidatos que seguiram as referidas instruções possam perder as fracções de habitação económica que já se encontram a habitar.

O CCAC considera que os serviços públicos, no exercício das suas funções, devem lidar atempadamente com os problemas eventualmente lesivos do interesse público, cumprir a lei e fazê-lo dentro da esfera das suas próprias atribuições. Além disso, a prossecução do interesse público tem como pressupostos o respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.

Se o candidato contrair matrimónio durante a fase de espera por aquisição de uma fracção de habitação económica e o cônjuge que tenha habitação própria não fizer parte do agregado familiar, isso afecta certamente a distribuição razoável das habitações públicas, mas a resolução deste problema não pode depender apenas de um parecer jurídico e de uma directiva administrativa, devendo proceder-se à alteração das disposições respectivas previstas na actual Lei da habitação económica. O CCAC considera que deve ser aperfeiçoado em tempo útil o regime jurídico da habitação económica em vigor, no sentido de que os recursos da habitação pública sejam aproveitados de forma justa, razoável e eficiente.



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