A Sociedade Moon Ocean Limitada, concessionária dos cinco lotes situados na Avenida Wai Long (em frente do aeroporto), Taipa, A, B e C (posteriormente, estes três últimos desistiram sucessivamente do recurso), promitentes-compradores do projecto La Scala que iria ser construído nos referidos cinco lotes, interpuseram recurso contencioso de anulação do despacho do Chefe do Executivo de 9 de Abril de 2013, que declarou a nulidade do seu despacho anterior de 9 de Março de 2011 que autorizou o pedido de revisão da concessão dos aludidos cinco lotes, reversão de nove parcelas e concessão de oito parcelas para anexação e aproveitamento conjunto, formulado pela Sociedade Moon Ocean Limitada.
O Tribunal de Segunda Instância (TSI) conheceu da causa, cujos fundamentos são, em síntese, os seguintes:
A recorrente invocou que o Chefe do Executivo, ao declarar a nulidade do contrato de concessão dos lotes em causa, usurpou o poder do tribunal, existindo o vício de usurpação de poder e a violação do artigo 173.º n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo. Face a isso, o Tribunal Colectivo do TSI entendeu que quanto à nulidade do contrato administrativo, convém distinguir duas situações: o contrato administrativo é nulo em consequência da nulidade das suas cláusulas contratuais, e o contrato padece de nulidade porque é nulo o acto administrativo de que tenha dependido a sua celebração. Compete ao tribunal a avaliação e apreciação da primeira situação e quanto à segunda, como a no presente caso, é consequência directa da nulidade dos actos administrativos de que haja dependido a sua celebração, qualquer órgão administrativo ou qualquer tribunal pode proceder à declaração, pelo que, não existe o vício de usurpação de poder, improcedendo, assim, este argumento do recurso.
A recorrente referiu que ao declarar a nulidade do contrato de concessão, o despacho recorrido ofendeu o conteúdo essencial do seu direito de propriedade. Face a isso, o Tribunal Colectivo entendeu que a perda da coisa adquirida mediante um contrato nulo é a consequência jurídica da declaração da nulidade do referido contrato, e por outro lado, a concessão do terreno por arrendamento apenas confere ao concessionário o direito de aproveitamento do terreno nos termos consagrados o contrato de concessão, nunca o direito de propriedade sobre ele, improcedendo assim a ofensa ao conteúdo essencial do direito de propriedade da recorrente por parte do acto recorrido.
A recorrente invocou que existe erro de pressupostos de facto e de direito no acto recorrido uma vez que o acto recorrido entendeu erradamente que a concessão dos lotes em causa foi regulada pela escritura pública outorgada em 14 de Dezembro de 1990, o despacho proferido pelo Chefe do Executivo em 9 de Março de 2011 que autorizou a revisão do contrato de concessão é o acto anterior que pode leva à nulidade automática do contrato administrativo de revisão de concessão de terreno previsto no artigo 172.º do Código do Procedimento Administrativo e a declaração de nulidade do referido despacho pelo Chefe do Executivo é a actividade vinculada do mesmo. Face a isso, o Tribunal Colectivo referiu que o procedimento administrativo de transmissão dos direitos resultantes da concessão enfermou do vício de nulidade pela intervenção criminosa do então Secretário para os Transporte e Obras Públicas, por isso, conforme o princípio da legalidade, a Administração deve declarar a nulidade do seu despacho proferido em 9 de Março de 2011 que autorizou a revisão do contrato de concessão, isto, manifestamente, é acto vinculado por lei, e sem o despacho do Chefe do Executivo de 9 de Março de 2011, nunca pode ter lugar o contrato administrativo em causa. Por outras palavras, a celebração do contrato de concessão de terreno depende do referido acto administrativo, pelo que, a declaração de nulidade do referido acto leva automaticamente à nulidade do contrato administrativo. Assim, a menção errada do contrato de concessão nada pode afectar a validade do acto recorrido.
A recorrente invocou ainda que ao dar como provados os factos constantes do Acórdão do Tribunal de Última Instância proferido no Processo-Crime n.º 37/2011, em que ela não foi parte, e ao aplicá-los automaticamente ao procedimento administrativo da declaração da nulidade, o acto recorrido violou os limites do caso julgado, o que consubstancia um vício da violação de lei. Face a isso, o Tribunal Colectivo entendeu que nos termos do artigo 578.º do Código de Processo Civil, a decisão condenatória proferida no processo penal constitui, em relação a terceiros que não tenham intervindo no processo penal, presunção no que se refere à existência dos factos que integram os pressupostos da punição, em quaisquer acções cíveis ou administrativas em que se discutam relações jurídicas dependentes da prática da infracção, desde que a estes seja dada oportunidade de o contraditarem. No caso em apreço, a recorrente teve oportunidade de impugnar os factos no respectivo procedimento administrativo, pelo que, não se verifica o desrespeito dos limites do caso julgado.
Por último, quanto à violação dos princípios de protecção de confiança, de boa-fé, da proporcionalidade e da adequação invocada pela recorrente, o Tribunal Colectivo referiu que os alegados princípios só são operantes no âmbito da actividade discricionária da Administração. Tal como já foi referido, a declaração de nulidade do despacho do Chefe do Executivo de 9 de Março de 2011 que autorizou a revisão do contrato de concessão é um acto vinculado da entidade recorrida, pelo que, não violou os aludidos princípios, improcedendo também este argumento do recurso.
Pelos acima expostos, acordam em negar provimento ao recurso contencioso, mantendo-se o acto administrativo recorrido.
Cfr. o Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, no Processo n.º 299/2013.
Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância
17/04/2018