Em 15 de Março de 2014, A celebrou com o Instituto de Habitação (IH) um contrato para arrendar um fogo na habitação social na Alameda da Harmonia em Coloane. O agregado familiar de A era composto só por ela própria. Em 18 de Março de 2014, A apresentou ao IH requerimento de ausência temporária da habitação social, alegando nela que ia sair de Macau em 23 de Março para continuar curso universitário, até à sua conclusão em Julho. Em 23 de Maio de 2014, o IH respondeu ao requerimento através de ofício, em que salientou que o IH ia rescindir o contrato de arrendamento de habitação social, se a arrendatária conservar o fogo desabitado por mais de quarenta e cinco dias ou não tiver nela residência permanente, habite ou não outra habitação. Tal ofício foi devolvido em 3 de Julho do mesmo ano por ninguém o receber. Além disso, em 26 de Maio de 2014, A fez uma consulta, por email, ao IH sobre a forma de requer o prolongamento do período de ausência temporária da habitação social, mas não obteve nenhuma resposta. Em 19 de Agosto de 2014, o pessoal do IH realizou uma entrevista com A, na qual A admitiu que por continuar o curso universitário saiu de Macau em 23 de Março de 2014 e deixou de residir no fogo da habitação social até 8 de Agosto do mesmo ano. O Vice-Presidente proferiu despacho em 15 de Julho de 2015, apontando que mesmo A tivesse apresentado esclarecimento escrito, isso não significou que ela podia deixar o fogo não residido por longo tempo depois de comunicar o motivo ao IH e que o estudo no exterior não era motivo justificativo para o não cumprimento das disposições do Regulamento Administrativo n.º 25/2009, pelo que considerou que ela não tem razão, e decidiu rescindir o contrato de arrendamento de habitação social celebrado entre A e o IH.
Em 17 de Agosto de 2015, A interpôs recurso hierárquico necessário para o Presidente do IH contra o acto de rescindir o contrato de arrendamento. O Presidente do IH proferiu despacho em 7 de Outubro de 2015, negando provimento ao recurso hierárquico necessário de A e mantendo o despacho proferido em 15 de Julho de 2015 pelo Vice-Presidente do IH, que decidiu rescindir o contrato de arrendamento de habitação social celebrado entre o IH e A.
Inconformada, A recorreu contenciosamente para o Tribunal Administrativo.
O Tribunal Administrativo proferiu sentença em 31 de Outubro de 2016, apontando que o IH só respondeu em 23 de Maio de 2014 ao pedido escrito apresentado por A em 18 de Março do mesmo ano, tendo ultrapassado o período de 45 dias previsto na primeira parte do art.º 19.º, nº 2, al. 2) do Regulamento Administrativo n.º 25/2009, e no ofício nem foi negada explicitamente a justificação de A. Ademais, o IH não acompanhou ou respondeu à consulta feita no email de A, ao contrário, recolheu dados para proceder ao procedimento de rescinsão do contrato celebrado com A. O Tribunal Administrativo entendeu que o IH não revelou oportunamente a não admissão do motivo que ele já sabia que não ia aceitar, o que fez com que A pensasse erradamente que foi aceite o seu pedido de não habitar na habitação social arrendada durante o período indicado. Posteriormente, A requereu o prolongamento do período pela mesma razão e nesta vez também não recebeu qualquer mensagem sobre a recusa em aceitar a razão apresentada. Ainda por cima, depois da verificação do elemento objectivo mais desfavorável a A, o IH utilizou-o como fundamento factual para rescindir o contrato de arrendamento de habitação social celebrado com A. A sua forma de tratar o caso defraudou manifestamente a confiança e expectativas nela depositadas por A, violando o princípio da boa-fé previsto do art.º 8.º do Código do Procedimento Administrativo, que é um dos princípios gerais no direito administrativo que se devem observar no exercício do poder discricionário. Pelo exposto, o Tribunal Administrativo julgou procedente o recurso contencioso de A, anulando o acto recorrido.
Inconformado, o Presidente do IH interpôs recurso jurisdicional para o Tribunal de Segunda Instância.
O Tribunal de Segunda Instância apreciou o processo.
O Tribunal Colectivo concordou dos fundamentos expostos na sentença do Tribunal a quo, indicado ainda os seguintes pontos:
Primeiro, A apresentou requerimento ao IH, mas este não proferiu uma decisão expressa. Segundo o art.º 11.º do Código do Procedimento Administrativo, os órgãos administrativos têm o dever de se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competência que lhes sejam apresentados pelos particulares.
Segundo, o direito conferido a arrendatários pelo contrato de arrendamento de habitação social não pode ser privado ou diminuído, salvo haja motivos ponderosos, tal como dispõe o art.º 19.º do Regulamento Administrativo n.º 25/2009. Além disso, conforme o disposto no art.º 22.º do mesmo diploma legal, quando verificar algum facto que dê ou possa dar origem à rescisão do contrato, a Autoridade procede à notificação do arrendatário para que este lhe preste esclarecimento. O contrato de arrendamento nunca rescinde automaticamente.
Nos termos expostos, o Tribunal Colectivo julgou improcedente o recurso jurisdicional interposto pelo Presidente do IH, mantendo a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo.
Cfr. o acórdão proferido no processo nº 196/2017 do Tribunal de Segunda Instância.
Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância
29/08/2018