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Cláusula compromissória que afasta a competência dos tribunais também impede o conhecimento dos procedimentos cautelares


Companhia B deduziu providência cautelar junto do Tribunal Judicial de Base (TJB) contra Companhia A, pedindo que se decrete o arresto dos eventuais créditos que esta possa ter sobre outras duas companhias. O TJB conheceu do caso e deferiu o pedido da Companhia B, tendo decretado o arresto dos saldos bancários e créditos da Companhia A.

Notificada do decretamento da providência referida, a Companhia A deduziu oposição a esta decisão, indicando que entre as duas partes tinha sido acordado no contrato que, primeiramente, os eventuais litígios estão sujeitos a mediação a ser realizada pelo Centro de Arbitragem Internacional de Hong Kong, e que, falhando essa mediação, serão dirimidos por árbitro único segundo a lei de arbitragem de Hong Kong, pelo que o TJB não tem competência para julgar este caso. Depois de apreciação, o TJB julgou improcedente a oposição, mantendo a providência cautelar mencionada.

Ainda inconformada, a Companhia A recorreu para o Tribunal de Segunda Instância (TSI).

O Tribunal Colectivo do TSI conheceu do caso.

O Tribunal Colectivo indicou que, para saber se os tribunais de Macau são competentes para julgar a providência cautelar requerida, terá que saber se os tribunais de Macau são competentes para julgar a respectiva acção principal. Nos termos do artigo 18.º do Código de Processo Civil, os procedimentos cautelares podem ser conhecidos nos tribunais de Macau, quando a acção respectiva possa aqui ser proposta ou aqui esteja pendente. O Tribunal a quo entendeu que, a excepção de preterição do tribunal arbitral só pode ser suscitada pelas partes da acção e não pode ser conhecida oficiosamente pelos tribunais, de maneira que, em termos abstractos, os tribunais são competentes para julgar o procedimento cautelar desde que a acção possa ser intentada pelas partes. Porém, entendeu o Tribunal Colectivo que, o legislador não tem intenção de admitir a conhecer os procedimentos cautelares se os tribunais não são efectivamente competentes para conhecer a acção principal, porque já se antevê a consequente declaração de caducidade da providência cautelar, quando a requerida venha invocar a excepção de preterição do tribunal arbitral. Isto não está conforme com o princípio da economia processual. Por outro lado, os procedimentos cautelares são dependências da causa que tenha por fundamento o direito acautelado (artigo 328.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), daí que é muito natural que a competência para conhecer dos procedimentos cautelares depende de se os tribunais ter efectivamente competência para conhecer da acção principal, e não, em abstracto, de mera possibilidade da acção proposta.

Indicou ainda o Tribunal Colectivo que, pese embora que nos termos do artigo 328.º, n.º 6, do Código de Processo Civil, quanto à situação de as partes terem acordado atribuir a jurisdição aos tribunais ou tribunais arbitrais do exterior da RAEM, os tribunais de Macau continuam a ter competência para conhecer dos respectivos procedimentos cautelares, mas isto está sempre no pressuposto de existirem convenções internacionais ou acordos no domínio da cooperação judiciária que regule a tal questão, e as partes devem fazer prova da pendência da causa principal. O que acontece é que, não há este tipo de disposições no Acordo sobre a Confirmação e a Execução Recíprocas de Decisões Arbitrais entre a Região Administrativa Especial de Macau e a Região Administrativa Especial de Hong Kong, pelo que não é aplicável ao presente caso o artigo 328.º, n.º 6, do Código de Processo Civil.

Face ao exposto, ao abrigo do artigo 18.º do Código de Processo Civil, o Tribunal Colectivo entendeu que, não tendo os tribunais de Macau competência para conhecer da acção principal, eles são também incompetentes para conhecer dos respectivos procedimentos cautelares. Nestes termos, acordou em conceder provimento ao recurso interposto pela Companhia A, e absolver da instância cautelar deduzida pela Companhia B.

Vide Acórdão do TSI, no Processo n.º 139/2018.