Top Builders Internacional, Limitada, interpôs recurso contencioso de anulação do despacho do Chefe do Executivo da RAEM, de 28 de Outubro de 2016, que adjudicou a obra de “Arruamentos e redes de drenagem da zona E2 dos novos aterros urbanos” à Empresa de Construção e Obras de Engenharia Tak Fat Kin Ip, Limitada. Por Acórdão, proferido em 31 de Maio de 2018, o Tribunal de Segunda Instância julgou improcedente o recurso, mantendo-se a decisão recorrida. Inconformada com a decisão, Top Builders Internacional, Limitada, recorreu para o Tribunal de Última Instância. Como fundamento, a recorrente alegou que, para cumprir a exigência prevista no Programa do Concurso, relacionada com a experiência dos concorrentes e a qualidade de obras já executadas, a recorrente apresentou documentos para demonstrar a relação das cinco melhores obras concluídas em Macau na qualidade de empreiteiro nos últimos 10 anos, a saber, entre outras, a Empreitada de construção de habitação púbica no Bairro da Ilha Verde, Lote 3, a Obra de construção da 1a fase do Venetian e da Obra de construção da 2ª fase do Venetian, as quais não foram objecto de pontuação, imputando violação do disposto no art.o 194.o do DL n.o 74/99/M, do princípio da boa-fé, previsto no art.º 8.º do CPA e das regras de interpretação da declaração negocial, previstas no art.º 228.º do Código Civil.
O Tribunal de Última Instância conheceu do caso.
No tocante à não admissão da Empreitada de construção de habitação pública no Bairro da Ilha Verde, Lote 3, imputando a recorrente violação do disposto no art.º 194.º do DL n.º 74/99/M e do princípio da boa-fé, o Tribunal Colectivo indicou que a obra referida não foi objecto de pontuação, porque a recorrente não apresentara prova do valor de liquidação da obra, já que, nos autos, não se encontra qualquer documento com a indiciação do valor de liquidação. Entregou a recorrente os autos de recepção provisória, emitidos pelo Gabinete para as Infra-Estruturas de Transportes, mas a recepção provisória acontece antes da liquidação da obra, ou seja, numa altura em que não é ainda liquidado o valor da obra. Só com a conta final é que se conhece o valor da liquidação da obra; não se sabe, no presente caso, o motivo determinante do atraso na elaboração da conta; muito menos fica provado que tal atraso se deveu à culpa da Administração; e não se vislumbra como foi violado o princípio da boa-fé. Por conseguinte, improcede esta questão levantada.
No que concerne à não avaliação da Obra de construção da 1.ª fase do Venetian e da Obra de construção da 2.ª fase do Venetian, e à alegação da recorrente de que o acórdão recorrido viola as regras de interpretação da declaração negocial, previstas no art.º 228.º do Código Civil, o Tribunal Colectivo indicou que a tais obras apresentadas pela recorrente não foi atribuída qualquer pontuação, porque os documentos entregues pela recorrente não correspondem à designação das obras indicadas na relação das obras. Embora a Venetian Cotai Lda. haja declarado que, não obstante a divisão em vários contratos para cada uma das fases da obra, cada fase, em termos de planeamento e de gestão, incorpora-se numa obra unitária, mas a recorrente concluiu apenas as obras parcelares aí apontadas e não todas as obras planeadas no projecto global de construção das 1.ª e 2.ª fases do Venetian. Quanto a um documento, apresentado pelo concorrente para provar certos factos e que contém uma declaração, cabe, claramente à entidade administrativa e ao órgão judicial apreciar os elementos constantes desse documento, interpretando devidamente a respectiva declaração. Por isso, não se vê como foi violada a norma referida.
No que respeita à não avaliação da Obra de construção da 1.ª fase do Venetian e da Obra de construção da 2.ª fase do Venetian, imputando a violação do princípio da boa-fé e da igualdade, invoca a recorrente que ela já houvera apresentado os mesmos documentos para obter avaliação e ganhar o concurso de outra obra pública, pelo que tinha a expectativa legítima na admissão de tais documentos; o Tribunal Colectivo indicou que o princípio da boa-fé manda atender à confiança do interessado suscitado na actuação da entidade pública, com vista à protecção da confiança na actuação dos poderes públicos. Assim se impõe à Administração, no concurso público, “o respeito pelas expectativas que criou com a abertura do concurso”, mas, no presente caso, não se afigura existir a expectativa legítima invocada pela recorrente, uma vez que cabe à recorrente demonstrar a existência de razões sérias que legitimem a sua expectativa em ver avaliadas as obras no concurso público reportado nos presentes autos, o que não sucedeu. Assim sendo, não se vislumbra a verificação dos vícios imputados pela recorrente.
Cfr. Acórdão do TUI, no Processo n.º 64/2018.
Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância
31/10/2018