O Comissariado contra a Corrupção (CCAC) divulgou, no Relatório de Actividades do CCAC de 2018, 8 casos de provedoria de justiça, entre os quais um referente ao Centro de Produtividade e Transferência de Tecnologia de Macau (CPTTM), no qual foi apontado que devido a irregularidades e à não transparência no recrutamento e na promoção de trabalhadores, bem como à existência de uma proporção demasiado alta dos trabalhadores com relações familiares entre si, tudo isto suscita inevitavelmente suspeitas por parte do público relativamente a eventuais actos de nepotismo. Foi referido no caso que, até Abril de 2017, de entre os 101 trabalhadores do CPTTM, 16 tinham relações familiares entre si.
Posteriormente, foi referido, num artigo publicado por um órgão de comunicação social, que se verificavam discrepâncias entre a situação real e a indicada pelo CCAC e imaginada pelo público. Aparentemente parecia que o que fora indicado pelo CCAC e imaginado pelo público se tinha focado só no número total sem atender às razões, às situações reais e às alterações ocorridas nos casos. Foi referido detalhadamente naquele artigo o processo de ingresso dos vários trabalhadores do CPTTM que tinham relações familiares entre si. Segundo o artigo, a simples descrição de que 15% do pessoal tinha relações familiares entre si parecia ser um relato parcial que, muito provavelmente, não representava a situação integral.
Em 13 de Abril, o director-geral do CPTTM, Shuen Ka Hung, quando entrevistado pelos órgãos de comunicação social, afirmou que o CPTTM tinha revisto os processos dos seus trabalhadores, desde 1996, incluindo os daqueles que já se tinham desvinculado do serviço e daqueles ainda em efectividade de funções no CPTTM, e tinha verificado que existiam 14 pessoas com relações familiares entre si, no entanto, não conseguiu determinar se aqueles eram parte das 16 pessoas referidas no Relatório do CCAC. Salientou ainda que, após uma consulta preliminar dos processos daquelas 14 pessoas, não se verificou nenhuma irregularidade no que respeitava à questão do seu ingresso, ou seja, os seus familiares não tinham participado nos respectivos processos de recrutamento.
Com vista a assegurar a exactidão e justiça das conclusões da investigação, o Comissário contra a Corrupção determinou, por despacho, a instauração de uma investigação complementar sobre o caso do CPTTM. Com recurso a diversas diligências tais como solicitação de documentos e solicitação de realização de autos de declarações por parte do director-geral e de outros trabalhadores do CPTTM, o CCAC concluiu recentemente os trabalhos da investigação complementar.
Número de trabalhadores com relações familiares entre si no CPTTM
No Relatório de Actividades do CCAC, foi referido que 16 pessoas tinham relações familiares entre si, o que é uma conclusão obtida na altura após a verificação da identificação dos trabalhadores constantes na lista de trabalhadores, até Abril de 2017, fornecida pelo CPTTM.
No decorrer da investigação complementar, o CPTTM realizou, em resposta à solicitação do CCAC, um exame interno e verificou que 18 trabalhadores tinham relações familiares entre si. Tendo comparado com a lista investigada anteriormente, o CCAC verificou que, até Abril de 2017, existiam 21 trabalhadores no CPTTM que tinham relações familiares entre si, sendo que 6 deles já se desvincularam do serviço, enquanto 15 deles ainda se encontravam em efectividade de funções e tinham relações familiares entre si.
Ingresso dos trabalhadores do CPTTM com relações familiares entre si
No artigo publicado pelo órgão de comunicação social, foram expostas as situações de ingressos dos trabalhadores com relações familiares entre si, nomeadamente de pai-filha, pai-filho e cônjuge, para explicar que não existia nenhum problema com os seus ingressos. É de esclarecer que, devido à falta de informações completas, o CCAC não chegou, na investigação anterior, à conclusão de que os ingressos dos trabalhadores que tinham relações familiares entre si eram sempre irregulares.
O CCAC referiu no Relatório de Actividades que “O CPTTM não conseguiu fornecer ao CCAC documentos relativos à contratação de alguns trabalhadores, nem mesmo as propostas de contratação e os respectivos despachos.” A título de exemplo, em relação a um casal, referido no artigo, que tinha ingressado no CPTTM sucessivamente, o CPTTM não conseguiu disponibilizar qualquer informação sobre o recrutamento dessas duas pessoas. Na circunstância da falta de informações objectivas, para efeitos de comprovação, dificilmente pode o CCAC chegar a uma conclusão de que a relação familiar em questão teve, ou não, influência no ingresso.
O director-geral do CPTTM manifestou ao CCAC que, tendo em conta que não se encontrou, na investigação interna, qualquer documento que podia comprovar irregularidades em relação aos trabalhadores em questão, julgou que “os familiares não tinham participado nos respectivos processos de recrutamento” e que “não se verificou nenhuma irregularidade no que respeitava à questão do ingresso”. O CCAC considera que, na falta de informações completas relativas aos recrutamentos, a conclusão de “não existência de irregularidades porque não há documentos comprovativos” obtida pelo CPTTM é demasiado negligente, acrescendo ainda que se encontraram, na investigação complementar, documentos que demonstram a participação de um trabalhador no processo de recrutamento do seu familiar.
É de realçar que a existência de relações familiares entre trabalhadores num serviço não implica necessariamente a existência de qualquer irregularidade, nomeadamente não demonstra por si só qualquer situação de nepotismo no respectivo ingresso. No entanto, tendo em conta as práticas anteriores do CPTTM, de não divulgação ao público de informações relativas a recrutamento, de demasiada arbitrariedade nos processos de selecção, bem como da proporção demasiado alta dos trabalhadores com relações familiares entre si, mesmo que não exista qualquer irregularidade no ingresso dos trabalhadores em questão, tal pode provocar facilmente dúvidas junto do público e queixas por parte de trabalhadores. No decorrer da investigação efectuada pelo CCAC, verificou-se que uma queixa, de acordo com a qual um membro de direcção do CPTTM teria violado o regime de impedimento na matéria referente à promoção do seu familiar, corresponde à realidade.
A par disso, quando entrevistado pelos órgãos de comunicação social, Shuen Ka Hung afirmou que, desde o início do seu exercício de funções como director-geral do CPTTM em 2012, a gestão foi reforçada, sendo todos os recrutamentos tornados públicos através do website ou dos jornais. No entanto, segundo as informações disponibilizadas pelo CPTTM ao CCAC, desde 2012 até 2018, o recrutamento de trabalhadores a tempo inteiro foi realizado pelo CPTTM por 100 vezes, de entre as quais 5 não o foram de forma pública. Para além disso, o recrutamento de trabalhadores a tempo parcial foi realizado por 26 vezes, de entre as quais 11 não o foram de forma pública.
Reforço da fiscalização e aperfeiçoamento da legislação
No decorrer da investigação complementar, o director-geral, Shuen Ka Hung, referiu ao CCAC que, tendo em conta que o CPTTM é uma organização privada, a existência ou não de irregularidades no ingresso de trabalhadores é determinado nos termos do disposto na “Lei das relações de trabalho”. O CCAC considera que o CPTTM, enquanto pessoa colectiva de utilidade pública administrativa cujo funcionamento depende principalmente de verbas do Governo, e que o seu responsável é meramente um gestor do erário público e não um seu “possuidor”, não podendo, por isso, ter meramente a “Lei das relações de trabalho” como critério único da sua actuação em matérias tais como o recrutamento e a promoção de pessoal e deve agir de acordo com os princípios fundamentais, nomeadamente os princípios da publicidade, da justiça, da imparcialidade e do impedimento.
O CCAC considera que, em simultâneo com o aperfeiçoamento contínuo dos regimes jurídicos de recrutamento e de promoção da função pública, deve ser reforçada também a fiscalização sobre as pessoas colectivas de utilidade pública administrativa, criadas pelo Governo e cujo funcionamento depende principalmente de verbas do Governo, e sobre as sociedades com capitais públicos, nomeadamente através da criação de legislação para o efeito, por forma a garantir que o recrutamento e a promoção dos respectivos trabalhadores correspondam às expectativas da sociedade no que respeita à publicidade, à justiça e à sua imparcialidade, bem como a um uso do erário público legal e razoável.