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O ex-sócio que pediu à Wynn Macau uma indemnização de MOP$8.200.000.000,00, viu o seu recurso julgado improcedente


Kazuo Okada, ex-sócio da sociedade Wynn, expulso do Conselho de Administração com as suas acções resgatadas, e duas companhias por ele controladas (adiante designados por autores), intentaram uma acção declarativa com processo comum ordinário no TJB contra 5 réus, incluindo Wynn Resorts (Macau) S.A. (adiante designada por Wynn Macau) e STEPHEN ALAN WYNN. Os autores indicaram que, no período entre 2005 e 2008, Wynn Macau e STEPHEN ALAN WYNN pagaram, de forma tortuosa, uma quantia de USD$35.000.000,00 a uma companhia para obter a concessão dum terreno, situado no Cotai, com área superior a 200.000,00 metros quadrados, e entenderam que tal pagamento era injustificado e manifestamente contrário à lei, à ordem pública e aos bons costumes, encontrando-se fora do objecto social. Ademais, os autores consideraram injustificado o compromisso de Wynn Macau, no sentido de doar, num prazo de 10 anos, à Fundação para o Desenvolvimento da Universidade de Macau um montante global de USD$135.000.000,00, ficando assim prejudicados os interesses dos sócios da sociedade. Assim, os autores pediram que fosse declarada a dissolução de Wynn Macau nos termos do art.º 315.º, n.º 1, al.s f) e i) do Código Comercial. Além disso, os autores alegaram que Wynn Macau fornecera, em transgressão da Lei n.º 8/2005 (Lei da Protecção de Dados Pessoais), os seus dados pessoais ao órgão de investigação B para elaborar um relatório, do qual constava a prática, pelos autores, de actividades inadequadas. Na reunião extraordinária dos administradores, realizada em 18 de Fevereiro de 2012, Wynn Macau, com fundamento no referido relatório, deliberou proceder à amortização forçada das acções, tituladas por Kazuo Okada nessa sociedade, causando-lhe directamente a perda da sua qualidade de sócio e dos interesses económicos, resultantes das acções tituladas. Por isso, os autores pediram para condenar os réus a pagar, solidariamente, pelos danos patrimoniais, uma indemnização, no valor de cerca de MOP$8.000.000.000,00, bem como uma indemnização pelos danos não patrimoniais, no valor de MOP$200.000.000,00.

O TJB apreciou o caso e indicou que, em relação ao pedido de dissolução de Wynn Macau, os autores carecem, obviamente, de razões suficientes para ter acesso ao tribunal. Por outro lado, a nulidade do negócio jurídico, causada por actos dos réus, é diferente da ilicitude ou impossibilidade superveniente do objecto social, prevista na al. f) do n.º 1 do art.º 315.º do Código Comercial. Segundo o art.º 180.º do Código Comercial, o objecto social refere-se às actividades que a sociedade se propõe exercer e, de acordo com o objecto da 1ª ré, constante do seu registo comercial, esta, tem como objecto social, a exploração de jogos de fortuna ou azar ou outros jogos em casino. E a 1ª ré é, efectivamente, autorizada pelo Governo a explorar as respectivas actividades; assim, o objecto social da 1ª ré não é contrário à lei, à ordem pública ou aos bons costumes. Além disso, mesmo que uns negócios jurídicos, realizados pela 1ª ré, fossem contrários à lei, à ordem pública, aos bons costumes ou à finalidade social, seriam eles causa da consequência de nulidade dos negócios concretamente realizados, ou incorreriam no vício de anulabilidade por falta de capacidade do exercício, mas não resultariam na dissolução da sociedade; ademais, a al. f) do n.º 1 do art.º 315.º do Código Comercial concedeu 45 dias à sociedade para efeitos de alteração do objecto social ilegal. Assim, improcede, manifestamente, o pedido de dissolução de Wynn Macau apresentado pelos autores. No que concerne ao pedido de indemnização, indicou o TJB que, no caso sub judice, o acto que produziu, efectivamente, o efeito de amortização forçada das acções foi a deliberação tomada pelo Conselho de Administração naquele dia, devendo os autores impugnar a validade da deliberação no tribunal, em vez de pretenderem a indemnização com fundamento em assuntos pouco relacionados. Por isso, entendeu o TJB que inexiste o devido nexo de causalidade entre os factos ilícitos alegados pelos autores e os danos invocados por estes. Com base nisso, o Tribunal de Primeira Instância absolveu os réus dos pedidos formulados pelos autores.

Inconformado com a supracitada sentença, Kazuo Okada recorreu para o TSI. Entendeu Kazuo Okada que o tribunal a quo confundiu a “legitimidade processual” com o “interesse processual”, insistindo que os actos de Wynn Macau eram contrários ao objecto social e que devia ser declarada a dissolução da respectiva sociedade; ainda invocou que o TJB entendeu mal a sua causa de pedir, porque não interpretou, correctamente, o art.º 14.º da Lei n.º 8/2005 (Lei da Protecção de Dados Pessoais); assim, a sua decisão incorreu no vício de erro no julgamento e devia ser revogada.

O TSI conheceu do caso.

Quanto à declaração da dissolução de Wynn Macau, o Tribunal Colectivo do TSI entendeu que Kazuo Okada confundiu o exercício do objecto social que os próprios estatutos da sociedade definem, com a prática de algumas infracções no exercício do objecto social. O objecto social de Wynn Macau nunca foi alterado e os actos contrários à lei e à ordem pública (pagamento e doação injustificados), alegados por Kazuo Okada, não podem resultar na consequência da dissolução da sociedade, prevista pelo art.º 315.º do Código Comercial. Ademais, os actos da sociedade, alegados por Kazuo Okada, são acções materiais de execução praticadas pela sociedade com base nas suas deliberações, pelo que devem tais deliberações ser objecto de ataque. Nestes termos, o Tribunal Colectivo considerou não fundamentado o pedido de declaração da dissolução de Wynn Macau, apresentado por Kazuo Okada e, por não estar provado que este é credor de Wynn Macau, ele não pode obter, nos termos do art.º 315.º do Código Comercial, a tutela judicial, uma vez que lhe falta o “interesse processual”. Após análise do pedido de indemnização, o Tribunal Colectivo do TSI indicou que o facto gerador de danos não é o facto da transferência ilegítima de dados pessoais, feita por Wynn Macau, mas, sim, a elaboração do relatório com base nesses dados e a publicação de tais informações na imprensa dos EUA, feitas pelo órgão de investigação B. Por isso, o Tribunal Colectivo entendeu que há incoerência e até incompatibilidade entre o pedido, o autor dos factos danosos e os factos invocados por Kazuo Okada, decidindo indeferir o seu pedido.

Face ao exposto, o Colectivo do TSI julgou improcedente o recurso de Kazuo Okada e manteve a sentença do tribunal a quo.

Cfr. o Acórdão do TSI, no Processo n.º 244/2018.