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CCAC concluiu a investigação sobre o terreno da Colina da Ilha Verde


O Comissariado contra a Corrupção (CCAC) recebeu, no ano passado, várias queixas de associações, nas quais se referia que existem dúvidas relativamente aos procedimentos da aquisição do direito de propriedade, da delimitação e do cálculo da área do terreno da Colina da Ilha Verde, solicitando a intervenção do CCAC. O Comissário contra a Corrupção determinou, ao abrigo da Lei n.º 10/2000 (Lei Orgânica do CCAC), por despacho, a instauração de uma investigação relativamente a este caso. Após a investigação, o CCAC considera que não existem indícios suficientes ou provas para ilidir a propriedade inscrita no registo predial e os limites e a área do terreno definidos na planta cadastral, no entanto, os serviços competentes do Governo não cumpriram rigorosamente as disposições da Lei de Salvaguarda do Património Cultural e da Lei do Planeamento Urbanístico relativamente à conservação e ao planeamento do terreno da Colina da Ilha Verde.

Registo predial do terreno da Colina da Ilha Verde

De acordo com as informações do registo predial e cadastrais, o terreno da Colina da Ilha Verde é composto pela colina e pelos terrenos marginais à colina, sendo a colina a maior parte, a totalidade do terreno tem uma área de 56.166 m2 e com o número de descrição predial 2506. O registo mais antigo daquele terreno data de Maio de 1886, tendo sido feito pela Conservatória do Registo Predial no seguimento de um pedido do Bispo da Diocese de Macau, enquanto administrador de bens do Seminário de São José, e baseou-se na escritura pública da compra daquele terreno pelo Seminário de São José em Março de 1828.

De acordo com as informações do registo predial, em Maio de 1886, uma parte do terreno da Colina da Ilha Verde foi dada de arrendamento, pelo prazo de 25 anos, pelo Seminário de São José, para a construção e operação da fábrica de cimento da Companhia de Cimento da Ilha Verde Limitada; em Setembro de 1991, a Diocese de Macau e a Empresa de Fomento e Investimento Kong Cheong (Macau) Limitada celebraram uma escritura pública, e o terreno sob a descrição n.º 2506 foi vendido àquela empresa pelo valor de 95 milhões de patacas; em Janeiro de 2007, a Empresa de Fomento e Investimento Kong Cheong (Macau) Limitada revendeu o referido terreno ao actual proprietário, a Companhia de Desenvolvimento Wui San Limitada, pelo valor de 188,3 milhões de Hong Kong dólares.

Direito de propriedade do terreno da Colina da Ilha Verde

Os queixosos consideram que, tendo em consideração que, segundo os registos da documentação histórica, a Administração Portuguesa de Macau tomou posse efectiva e a governança sobre a Ilha Verde apenas em 1890, existem dúvidas em relação à veracidade e à validade da transmissão ocorrida em 1828 e do respectivo registo predial efectuado em 1886. Na sequência da investigação efectuada pelo CCAC, não se deparou com quaisquer provas que demonstrem situações de contrafacção ou de falsidade sobre a escritura pública da aquisição do terreno da Colina da Ilha Verde pelo Seminário de São José naquela altura, nem tão pouco relativamente ao posterior registo predial. De acordo com o artigo 7.º do Código do Registo Predial, o registo ao tornar-se definitivo, constitui presunção legal de que o indivíduo, ou a entidade, inscrito como titular possui o direito nos termos em que o registo o define.

Os queixosos levantaram dúvidas sobre a razão de se encontrarem construídas instalações militares na Colina da Ilha Verde, incluindo quartel militar, casamata militar, armazém, entre outros. Após investigação, o CCAC constatou que em Novembro de 1923, a Administração Portuguesa de Macau enviou uma carta à Diocese de Macau, solicitando autorização para alojar instalações militares no terreno da Colina da Ilha Verde e para enviar para aquele local pessoal militar de guarnição; em Março de 1927, o departamento militar português enviou carta à Diocese de Macau, solicitando a esta última que desse de arrendamento partes do terreno e edificações da Colina da Ilha Verde para utilização militar; em Maio de 1975, o departamento militar português entregou partes do terreno arrendadas e edificações à Administração Portuguesa de Macau para efeitos de gestão; e em Maio de 1981, a Administração Portuguesa de Macau procedeu oficiosamente à rescisão do contrato de arrendamento, devolvendo as partes do terreno com fins militares da Colina da Ilha Verde e as respectivas edificações à Diocese de Macau.

Após ter sido efectuado o registo do terreno da Colina da Ilha Verde em 1886, não existe nenhum documento ou registo a apontar no sentido de que alguém tivesse intentado acção junto do tribunal para anular o acto de transmissão relativo ao terreno em causa ou para levantar quaisquer dúvidas sobre o direito de propriedade do Seminário de São José. Por outro lado, existem documentos que revelam ter existido negociação e celebração de contrato de arrendamento entre a Administração Portuguesa de Macau e a Diocese de Macau para alojar instalações militares na Colina da Ilha Verde, reconhecendo-se assim a qualidade de proprietário do Seminário de São José relativamente ao terreno da Colina da Ilha Verde. Nestes termos, à luz do princípio da legalidade, o CCAC considera que não existem actualmente indícios suficientes ou provas para ilidir o direito de propriedade reconhecido pelo registo predial.

Área do terreno da Colina da Ilha Verde

Segundo o registo predial, a área do terreno da Colina da Ilha Verde sob a descrição n.º 2506 é de 56.166 m2 e é relativamente à exactidão desta área que os queixosos levantam dúvidas. Segundo as informações disponíveis, não se indicou claramente, no início, a área do terreno no registo predial, indicou-se sim o cumprimento da circunferência do terreno que era de cerca de 1.000 metros. Em Março de 1988, a Direcção dos Serviços de Cartografia e Cadastro (DSCC) procedeu a uma análise referente à área do terreno, deduzindo que o mesmo devia ter a forma de um círculo em redor da colina, sendo que a área resultante, após cálculo, era de 79.580 m2.

Segundo a análise da DSCC, tendo sido dividido por três vezes, o terreno sob a descrição n.º 2506 passou a ter uma área de cerca de 56.948 m2. Em Junho de 1988, a Administração Portuguesa de Macau informou à Diocese de Macau do resultado da análise da DSCC, solicitando a opinião da mesma. Em Julho de 1988, a Diocese de Macau oficiou à Administração Portuguesa de Macau, afirmando que tinha havido erros no cálculo e no levantamento topográfico da área do terreno e que o terreno sob a descrição n.º 2506 devia incluir ainda o terreno situado ao seu lado.

Em 27 de Abril de 1991, a Administração Portuguesa de Macau, a Diocese de Macau e o Seminário de São José assinaram um acordo, confirmando que o terreno sob a descrição n.º 2506 era constituído por 9 parcelas com uma área total de 70.228 m2 e uma planta cadastral foi elaborada nestes termos pela DSCC em Janeiro de 1991. Em 11 de Maio de 1991, o Seminário de São José apresentou à Conservatória do Registo Predial o acordo e os demais documentos, solicitando o registo de 8 destas parcelas como prédios autónomos, ficando a área restante do terreno sob a descrição n.º 2506 reduzida a 56.166 m2.

Nos termos do artigo 14.º do Decreto-Lei n.º 3/94/M, a planta cadastral é título bastante para a localização, áreas e confrontações dos imóveis. Após uma análise dos respectivos documentos e informações, o CCAC considera que não se encontram indícios que demonstrem a existência de falsidade ou erro na planta cadastral elaborada, em Janeiro de 1991, pela DSCC para o terreno sob a descrição n.º 2506. Nestes termos, a área do terreno da Colina da Ilha Verde deve ser de 56.166 m2 como consta no registo predial.

Conservação e planeamento do terreno da Colina da Ilha Verde

Os queixosos puseram ainda em causa a insuficiência da conservação e do planeamento do terreno da Colina da Ilha Verde por parte do Governo, o que teria provocado danos na colina e na paisagem. No âmbito da investigação, o CCAC constatou que se verifica realmente a situação em que os respectivos serviços públicos não cumpriram rigorosamente a Lei de Salvaguarda do Património Cultural e a Lei do Planeamento Urbanístico no que respeita à conservação e planeamento do terreno da Colina da Ilha Verde.

Na sequência do pedido da Empresa de Fomento e Investimento Kong Cheong (Macau) Limitada, enquanto proprietário original do terreno da Colina da Ilha Verde, os serviços competentes para as obras públicas emitiram, em Dezembro de 1997 e em Agosto de 2005, as plantas de alinhamento oficial do terreno sob a descrição n.º 2506. Em Agosto de 2011, a Companhia de Desenvolvimento Wui San, que tinha comprado o referido terreno, pediu a emissão da planta de alinhamento oficial. Em Fevereiro de 2014, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT) referiu em resposta que, devido a que o respectivo terreno fazia parte do escopo do estudo do “Plano de Ordenamento Urbanístico - Ilha Verde”, não podia ser emitida a planta antes que o referido plano fosse finalizado.

De acordo com as informações recolhidas pelo CCAC, a Administração Portuguesa de Macau elaborou, em Outubro de 1996, o “Estudo do Reordenamento Urbanístico Ilha Verde”, segundo o qual, a zona da Ilha Verde foi dividida em 26 lotes, e a finalidade, a altura máxima permitida e outras condições de construção de cada um dos lotes foram reguladas detalhadamente. Em articulação com o desenvolvimento social de Macau, desde 2008, a DSSOPT iniciou estudos com vista à elaboração do novo planeamento e, em Outubro de 2010, o “Plano de Ordenamento Urbanístico - Ilha Verde” foi concluído, sendo posteriormente, em Fevereiro de 2011, o plano anunciado ao público para auscultação de opiniões e sugestões da população.

Segundo o “Plano de Ordenamento Urbanístico - Ilha Verde”, a zona da Ilha Verde foi dividida em 53 lotes, cada um dos lotes tem a sua própria finalidade de desenvolvimento, nomeadamente zonas verdes protegidas, habitações públicas, instalações sociais e terrenos destinados a habitação e comércio. Destes esses lotes, o terreno sob a descrição n.º 2506 foi dividido em 8 lotes com finalidades diferentes. Segundo o “Plano de Ordenamento”, uma parte da Colina da Ilha Verde e a ruína do convento destinam-se a ser zonas verdes protegidas e instalações públicas, enquanto que uma outra parte debaixo da encosta da colina e os terrenos fora da colina têm finalidades habitacionais e comerciais.

Com a entrada em vigor da Lei de Salvaguarda do Património Cultural e com a classificação da Colina da Ilha Verde como sítio de interesse de património cultural, o “Plano de Ordenamento Urbanístico – Ilha Verde” já não se encontrava adaptado à realidade, e por isso a DSSOPT iniciou, em Agosto de 2014, o procedimento de alteração do referido “Plano de Ordenamento”. Em Dezembro de 2017, a DSSOPT procedeu à alteração de uma parte do conteúdo do “Plano de Ordenamento” de acordo com o parecer do Instituto Cultural (IC), estendendo o espaço verde que se encontrava sob protecção a todo o maciço montanhoso da Colina da Ilha Verde, reduzindo a área do terreno onde era permitido a construção de edifícios, bem como diminuindo a altura máxima permitida dos edifícios em algumas partes do terreno.

No entanto, a revisão do referido “Plano de Ordenamento Urbanístico – Ilha Verde” efectuada pela DSSOPT não só não foi objecto de consulta pública, como não foi objecto de divulgação oficial. O CCAC considera que o “Plano de Ordenamento” possui uma natureza semelhante à dos “planos de pormenor” previstos na Lei do Planeamento Urbanístico, possuindo ambos uma função idêntica, pelo que a revisão do mesmo deveria ser efectuada em conformidade com os termos do artigo 4.º daquela Lei, obedecendo nomeadamente ao “princípio da transparência e da promoção da participação da população”, ouvindo assim a opinião do Conselho do Planeamento Urbanístico, do público e dos interessados, bem como ao “princípio da publicidade”, procedendo a uma divulgação oficiosa ao público.

De acordo com o n.º 2 do artigo 64.º da Lei do Planeamento Urbanístico, até à data de entrada em vigor do plano director e dos planos de pormenor, a DSSOPT e os demais serviços da Administração Pública continuam a aplicar as orientações e os princípios previstos nos planos urbanísticos e estudos sobre o planeamento urbanístico existentes. O CCAC considera que, não sendo a zona da Ilha Verde uma “zona branca” e tendo o “Plano de Ordenamento Urbanístico – Ilha Verde” força vinculativa a nível de planeamento, aquando da apreciação do projecto de construção da zona da Ilha Verde, os serviços de obras públicas tinham que assegurar que os requisitos de construção definidos pelo referido “Plano de Ordenamento” se encontravam satisfeitos.

Recentemente, quando o Conselho do Planeamento Urbanístico discutiu sobre a planta de condições urbanísticas do terreno que se situa no sopé da Colina da Ilha Verde perto da Estrada Marginal da Ilha Verde, o representante da DSSOPT referiu que o projecto da referida planta de condições urbanísticas foi elaborado com base no “Plano de Ordenamento Urbanístico - Ilha Verde” de 2010. A DSSOPT deve saber perfeitamente que algumas partes do conteúdo do “Plano de Ordenamento Urbanístico - Ilha Verde” de 2010 já estão desactualizadas e em desconformidade com o disposto na Lei de Salvaguarda do Património Cultural, pelo que é necessário proceder a uma revisão do mesmo nos termos da lei e, ainda por acima, esses trabalhos de revisão já se encontram em curso.

O CCAC considera que a aprovação das plantas de condições urbanísticas dos projectos de construção antes da conclusão da revisão do “Plano de Ordenamento Urbanístico – Ilha Verde”, por parte da DSSOPT, constitui uma violação do n.º 2 do artigo 64.º da Lei do Planeamento Urbanístico. Esta prática de aprovar projectos antes de rever o respectivo plano não é apenas fazer as coisas às avessas, provoca também, inevitavelmente, no público dúvidas de que alguém efectuou uma “falsa partida” intencionalmente, o que está em desconformidade com o princípio da legalidade previsto no artigo 4.º da Lei do Planeamento Urbanístico, e conduzirá a uma redução considerável da eficácia do plano.

Para além disso, relativamente à questão da conservação da Colina da Ilha Verde sobre a qual vários sectores da sociedade têm prestado muita atenção, segundo as informações disponibilizadas ao CCAC, o IC endereçou, em Outubro de 2017, um ofício ao proprietário do terreno em questão, a Companhia de Desenvolvimento Wui San Limitada, referindo que o convento carecia de reparação e de manutenção e solicitando que a companhia iniciasse as obras de restauro e manutenção o mais breve possível. Posteriormente, e a solicitação do proprietário, o IC disponibilizou informações tais como peças desenhadas e materiais de construção do convento. No entanto, até à data, não foram ainda iniciadas as obras de manutenção do convento, nem foi apresentado o pedido para licença de obras.

Nos termos do artigo 39.º da Lei de Salvaguarda do Património Cultural, os proprietários de bens imóveis classificados devem efectuar as obras que o IC, precedendo vistoria, considere necessárias para assegurar a sua salvaguarda. No caso das obras não terem sido iniciadas ou concluídas dentro do prazo fixado, pode o IC promover a sua execução coerciva nos termos previstos na legislação em vigor, constituindo as respectivas despesas encargo do proprietário. O CCAC considera que, tendo sido conferidos pela lei meios suficientes e efectivos, o IC deveria promover e até concretizar, de forma empenhada, as respectivas obras de restauro e assumir efectivamente o dever legal de salvaguarda do património cultural, não podendo deixar a Colina da Ilha Verde e os edifícios tal como o convento continuar a ficar em estado de caos e degradação.