O Comissariado da Auditoria (adiante designado por CA) divulga o relatório de auditoria de resultados intitulado “Regime de recrutamento e selecção de trabalhadores para a Administração Pública” que teve como objecto avaliar as reformas do regime de recrutamento e selecção de trabalhadores para a Administração Pública implementadas pela Direcção dos Serviços de Administração e Função Pública (adiante designado por SAFP) até Outubro de 2018, a execução e gestão dos concursos centralizados realizados sob o Regime de 2011 e os concursos de gestão uniformizada realizados sob o Regime de 2016 e, ainda, apresentar sugestões para o seu melhoramento.
Ao rever a evolução do regime de recrutamento e selecção de trabalhadores para a Administração Pública, o Relatório refere que foi proposto nas Linhas de Acção Governativa para o ano de 2007, para a área de Administração e Justiça, um estudo sobre o “mecanismo central de recrutamento e de promoção” no sentido de proceder a uma revisão geral do sistema da Administração Pública, nomeadamente das estruturas das carreiras dos trabalhadores e do Regime Jurídico da Função Pública. A 3 de Agosto de 2009, foi promulgada a Lei n.º 14/2009, que, no seu artigo 11.º, determinava que os procedimentos de recrutamento e selecção de trabalhadores seriam feitos através da gestão centralizada. Em Setembro de 2011, o Regime de 2011 entrou em vigor, e no mesmo ano, foi também concluída a ampliação e reestruturação do quadro de pessoal do SAFP. O Regime de 2011 teve quase cinco anos de vigência, contados desde a sua entrada em vigor até à sua revogação, tendo sido objecto de acompanhamento por parte da Assembleia Legislativa e posteriormente foi substituído pelo Regime de 2016.
O Relatório revela que os concursos abertos entre 2012 e 2014, isto é, durante a vigência do Regime de 2011, envolveram um custo de 5503127,90 patacas. Já durante o Regime de 2016, de acordo com as informações facultadas pelo SAFP e os serviços interessados no recrutamento de pessoal relativamente à abertura de concursos para três carreiras, as despesas realizadas e as previstas serem pagas até 30 de Junho de 2018 totalizaram as 31637009,45 patacas (o valor referido apenas diz respeito às despesas directamente relacionadas com os concursos, excluindo as despesas não quantificáveis tais como as compensações das horas extraordinárias após dedução do período normal de trabalho, bem como os recursos humanos mobilizados pelos serviços interessados).
Apesar de a Lei n.º 14/2009 ter estabelecido ao todo 34 carreiras, os resultados de auditoria revelam que, numa primeira fase, o Regime de 2011 apenas se aplicou às carreiras de técnico superior e de adjunto-técnico, enquanto os concursos para as restantes carreiras seriam abertos pelos próprios serviços interessados através de concurso comum. Portanto, a abrangência do Regime de 2011 era baixa e insatisfatória. Antes de o SAFP proceder a uma consulta sobre a nova direcção a dar ao procedimento de recrutamento, já o mesmo estava ao corrente dos problemas existentes nos modelos de concursos estabelecido pelo Regime de 1989. No entanto, até a entrada em vigor do Regime de 2011, o SAFP ainda não tinha definido medidas para a resolução dos problemas encontrados. O Regime de 2011 não só repetiria os mesmos problemas do seu antecessor, como os agravaria ao ser determinado que as primeiras carreiras a serem sujeitas ao concurso centralizado seriam as de adjunto-técnico e técnico superior, duas carreiras que requerem uma maior especialização dos candidatos (quando comparada com as carreiras que tinham sido abertas a concursos durante a vigência do Regime anterior) e nem sequer foi tido em conta o conteúdo funcional específico requerido pelos serviços interessados. Durante a vigência do Regime de 2011 os problemas foram-se agravando, sobretudo ao nível da afectação de pessoal e da substancial morosidade dos procedimentos concursais.
De modo a ultrapassar os problemas constatados com o Regime de 2011, em 2016, entrou em vigor o Regime de 2016, tendo sido realizados concursos para as carreiras de técnico superior, adjunto-técnico e auxiliar. Cada concurso envolveu uma fase de avaliação de competências integradas, e entre 13 a 100 avaliações de competência profissionais ou funcionais. Apesar de o Regime de 2016 prever a colaboração entre o SAFP e os serviços interessados no recrutamento de pessoal, mesmo relativamente aos concursos para o preenchimento de lugares com conteúdo funcional ou exigências técnicas comuns e que não requeriam especialização dos candidatos, essa colaboração nunca chegou a ocorrer. Por outro lado, devido ao facto de a maioria dos candidatos apresentarem mais de uma candidatura para as vagas postas a concurso, tal provocou um aumento drástico no número de candidaturas à segunda fase, fazendo com que os recursos investidos pelos serviços duplicassem. Para além disso, e para agravar ainda mais o problema, as avaliações de competências profissionais ou funcionais tinham de ser realizadas em datas próximas uma da outra e de ser realizadas por cada um dos serviços interessados fazendo aumentar o tempo gasto e os recursos necessários para a sua realização. O valor total das despesas dos três concursos realizados no âmbito do Regime de 2016 foi de 31637009,45 patacas, enquanto o valor total das despesas com as avaliações de competências profissionais ou funcionais foi de 25663721,85 patacas. A taxa média de comparência nas provas escritas das etapas de competências profissionais ou funcionais, nomeadamente, para as carreiras de técnico superior e adjunto-técnico foi de apenas 30% a 40%, sendo mais baixa do que a taxa de comparência nos concursos anteriormente realizados pelos próprios serviços – 60%. Portanto, perante a baixa taxa de comparência, os procedimentos concursais realizados durante o Regime de 2016 implicaram não só um grande dispêndio do erário público como também constituíram um desperdício de recursos administrativos e humanos. Além disso, os serviços sentiram grandes dificuldades em encontrar um local adequado para albergar um grande número de candidatos aos exames da etapa de avaliação de competências profissionais ou funcionais devido ao facto de os exames serem realizados em datas muito próximas e por se querer evitar a sobreposição das datas das provas para a mesma carreira e área funcional. Os trabalhos de coordenação do SAFP apenas se cingiram à marcação das datas dos exames escritos. Em relação à procura de espaços para a realização das provas, o SAFP disse que caberia aos próprios serviços os procurarem. No que toca à plataforma electrónica de apresentação de candidaturas, o SAFP ao permitir que, através de um simples clique, os candidatos pudessem concorrer a todos os lugares postos a concurso independentemente de terem ou não as habilitações académicas exigidas, fez com que os serviços acabassem por receber mais de cem mil candidaturas, porém, depois de verificadas as habilitações dos candidatos pelos serviços interessados, constatou-se que mais de metade deles não preenchia os requisitos exigidos, constituindo um desperdício de tempo.
Nos comentários gerais do presente Relatório é afirmado que o SAFP enquanto entidade com competência para “estudar e desenvolver o planeamento do contingente dos trabalhadores dos serviços públicos da RAEM” e “coordenar e desenvolver a gestão centralizada dos processos de recrutamento e selecção para ingresso e acesso” deveria dispor de uma visão abrangente e clara do processo de recrutamento de trabalhadores para a Administração Pública da RAEM e uma compreensão global da estrutura e do desenvolvimento do contingente dos trabalhadores dos serviços públicos de modo a auxiliar o Governo na definição de um plano viável para o recrutamento de talentos e na organização de acções de formação. Os resultados da presente Auditoria revelam que a eficiência da organização e coordenação dos trabalhos de recrutamento a cargo do SAFP é estranhamente baixa, aliás, durante o processo de recrutamento, esse organismo nunca chegou a ter uma noção clara sobre a necessidade de pessoal dos serviços públicos. Durante os últimos anos, o aumento do leque de serviços prestados ao público tem vindo a pressionar e perturbar o normal funcionamento dos organismos públicos, devido à insuficiência de trabalhadores e à morosidade do processo do seu recrutamento, tendo vindo a influenciar negativamente a Administração Pública a vários níveis. Em virtude destes problemas de longa data, os serviços tiveram que auxiliar o SAFP na prossecução das suas atribuições tendo sido necessário despender mais recursos para suprir as insuficiências verificadas no regime de recrutamento de trabalhadores para a Administração Pública. A desorganização verificada no recrutamento centralizado acabou por afectar directamente o funcionamento dos serviços públicos, prejudicando o andamento dos processos de recrutamento de pessoal em todas as áreas.
O presente Relatório revela ainda que, durante os últimos anos, o SAFP tem vindo a aprender através da sua própria experiência, realizado estudos e passado tarefas aos serviços interessados no recrutamento. O SAFP não foi capaz de coordenar os trabalhos de forma activa, desvalorizou o impacto causado no desenvolvimento global no Governo da RAEM devido às insuficiências e demoras no processo de recrutamento e ignorou a urgência e a importância de um regime de recrutamento estável e viável de pessoal adequado. Em 2011, foi aumentada a estrutura orgânica e o quadro de pessoal do SAFP, no entanto, após vários anos, a nova estrutura não foi capaz de auxiliar os serviços públicos no sentido de adiantar os trabalhos com um recrutamento de trabalhadores. Ademais, devido à falta de uma boa compreensão da Administração Pública, o regime definido e os diplomas elaborados pelo SAFP acabaram por criar problemas a diversos níveis.
Após a presente Auditoria, o SAFP deve rever profunda e minuciosamente o regime de recrutamento, corrigir os problemas constatados, abandonar os maus hábitos de gestão e formas de pensamento e ter em consideração a realidade dos factos. Além disso, é necessário assegurar e manter um rumo para atingir os objectivos a que se propôs no intuito de implementar de forma plena as Linhas de Acção Governativa e as estratégias delineadas pelo Governo da RAEM.
O Relatório de Auditoria de Resultados foi já submetido ao Chefe do Executivo, podendo os interessados aceder à sua versão electrónica através do site do CA (http://www.ca.gov.mo) ou levantar exemplares em papel, disponibilizados na sua sede, durante o horário de expediente.