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O passageiro do veículo causador do acidente e também responsável pelo acidente deve assumir, solidariamente com a empresa de seguros, a responsabilidade civil


No dia 9 de Outubro de 2014, por volta das 13h48, o motociclo conduzido pelo ofendido e onde era também transportado um passageiro, circulava pela faixa de trânsito da esquerda da Rua do Mercado de Iao Hon, em direcção à Avenida da Longevidade. Durante a marcha, eles viram à sua frente um veículo ligeiro, conduzido pelo 1.º arguido parado no centro da faixa de trânsito da esquerda, sem nenhum sinal luminoso aberto. O ofendido continuou a circular pela esquerda da falada faixa de rodagem. Quando passou pelo lado esquerdo do dito veículo ligeiro, o 2.º arguido (passageiro deste veículo) abriu, repentinamente, a porta do lado esquerdo e atingiu com ela o corpo do passageiro do motociclo, fazendo com que este, o ofendido, perdesse o controlo do motociclo e caísse, juntamente com o passageiro, sofrendo lesões. O ofendido sofreu, devido ao acidente, contusões de tecidos moles em muitos partes do corpo, lesões que precisaram de 80 dias para convalescença. Os dois arguidos foram, por conseguinte, acusados da prática, em co-autoria material e na forma consumada, dum crime de ofensa à integridade física por negligência, previsto e punido pelo artigo 142.º, n.º 1, do Código Penal e artigo 93.º, n.º 1, da Lei n.º 3/2007 (Lei do Trânsito Rodoviário). O ofendido (autor) também deduziu pedido de indemnização civil contra a empresa de seguros (1.ª ré) do veículo ligeiro em causa e os dois arguidos (2.º e 3.º réus) solicitaram uma indemnização, no valor global de MOP$599.561,21, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais.

Realizado o julgamento, o TJB indicou que não existia nexo de causalidade adequada entre a infracção do 1.º arguido e as lesões sofridas pelo ofendido, pelo que absolveu o 1.º arguido do imputado crime. Adiantou, porém, que o 2.º arguido abriu a porta do lado esquerdo da viatura sem prestar atenção ao trânsito do mesmo lado, o que resultou na ocorrência do referido acidente e causou ofensas à integridade física do ofendido; assim, condenou-o na pena de 120 dias de multa, à taxa diária de MOP$100, perfazendo um montante total de MOP$12.000, convertível em 80 dias de prisão, se não fosse paga ou substituída por trabalho.

No que diz respeito à indemnização civil, o TJB, em base no motivo acima referido, isentou o 2.º réu (1.º arguido) da responsabilidade de indemnizar os danos sofridos pelo autor, enquanto decidiu atribuir a mesma responsabilidade ao 3.º réu (2.º arguido). O mesmo Tribunal ainda indicou que, no acidente em análise, o autor (ofendido) não efectuou, de acordo com a lei, a ultrapassagem pela direita do respectivo veículo, o que também contribuiu, até certo ponto, para a ocorrência do acidente. Porém, o acidente deveu-se principalmente ao facto de o 3.º réu ter aberto a porta imprudentemente. Portanto, reputou uma repartição de responsabilidades/culpa nas proporções de 20% e 80%, respectivamente. Por o aludido veículo automóvel se encontrar com seguro na 1.ª ré, a responsabilidade civil do 3.º réu foi transferida para esta, ficando a mesma obrigada a pagar ao autor uma indemnização no valor de MOP$279.255,31.

Inconformada, a empresa seguradora recorreu para o TSI, argumentando que, por o proprietário do veículo, em seguro nela, ter sido absolvido da instância, relativamente ao pedido de indemnização civil, ao abrigo do disposto no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 57/94/M, o seguro não garante quaisquer responsabilidades que, transferidas mediante contrato de seguro, resultem do acidente de viação, causado pela actuação de não beneficiário.

O TSI conheceu do caso. O Tribunal Colectivo indicou que, da factualidade dada como provada podia saber-se que o acidente em questão se deveu à conjunção dos actos dos 2.º e 3.º réus. No que toca ao 3.º réu, ou seja, passageiro transportado de livre vontade no referido veículo e beneficiador do uso deste, a empresa de seguros só estava isenta da satisfação da indemnização devida por este passageiro para com terceiros quando ele “tivesse conhecimento da posse ilegítima do veículo e de livre vontade nele fosse transportado” (artigo 3.º, n.º 3, do DL n.º 57/94/M). Ainda asseverou que, não obstante a responsabilidade solidária devida pelos 2.º e 3.º réus, a absolvição do 2.º réu da conexa responsabilidade civil impediu o Tribunal Colectivo de o condenar novamente, o que significou a impossibilidade da transferência da sua responsabilidade para a seguradora, mas ainda a necessidade de transferir, pelo motivo atrás mencionado, a responsabilidade do 3.º réu para a entidade seguradora. Todavia, não se podia excluir o direito de regresso da companhia de seguros contra o 3.º réu. Razão por que o 3.º réu e a empresa seguradora (responsabilidade transferida, mediante contracto de seguro) deviam ser, solidariamente, responsáveis. Por conseguinte, procedeu parcialmente o recurso da seguradora.

Face ao exposto, o Tribunal Colectivo concedeu parcial provimento ao recurso, condenando a recorrente e o 3.º réu a responsabilizarem-se, solidariamente, pela indemnização fixada.

Cfr. Acórdão do TSI, Processo n.º 976/2017.