Por excesso de velocidade em 18 de Março de 2015, A foi notificado da data de audiência de julgamento em primeira instância, marcada para o dia 27 de Outubro de 2015, e da faculdade de nela se fazer representar por um advogado seu, de apresentar defesa e de oferecer prova. No entanto, A não compareceu nessa audiência de julgamento. No fim, A foi condenado como autor de uma contravenção, p. e p. pelos art.ºs 31.º, n.º 1, e 98.º, n.º 3, alínea 2) da Lei de Trânsito Rodoviário, na pena de três mil patacas de multa, convertível em vinte dias de prisão e na pena acessória de inibição de condução por sete meses. Esta sentença transitou em julgado em 30 de Junho de 2016.
Na pendência do recurso ordinário, então interposto pelo arguido da sentença condenatória, o Tribunal de Segunda Instância (TSI), por promoção do Ministério Público, solicitou ao Serviço de Migração do CPSP o envio do registo de entrada/saída de A nos postos fronteiriços de Macau nos dias 16 a 21 de Março de 2015, tendo o CPSP respondido: a última saída de Macau de A data de 16 de Março de 2015 pelo Aeroporto Internacional de Macau e, depois, não se regista a reentrada de A em Macau. O TSI julgou improcedente o recurso. Posteriormente, o Ministério Público e A pediram a revisão da sentença, nos termos do art.º 431.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Penal, e, por Acórdão de 13 de Dezembro de 2016, no Processo n.º 755/2016, mas o TSI denegou a revisão pretendida.
A interpôs recurso extraordinário, para a fixação de jurisprudência em processo penal, para o Tribunal de Última Instância (TUI), deste Acórdão do TSI, com fundamento de que ele se encontrava em oposição com o Acórdão do mesmo TSI, de 23 de Outubro de 2014, no Processo n.º 385/2013.
O TUI procedeu ao julgamento ampliado do recurso.
Indicou o Tribunal Colectivo que, perante o confronto entre os dois valores fundamentais do Direito, o valor da segurança jurídica e o da justiça, em matéria penal, mas não só, o legislador optara por uma solução de compromisso, firmando o princípio da imutabilidade das sentenças transitadas em julgado, mas admitindo, em termos muito limitados, a revogação de caso julgado, por meio do chamado recurso de revisão, para aqueles casos em que considerações clamorosas de justiça se deviam sobrepor ao mencionado princípio da imutabilidade das sentenças transitadas em julgado. No entanto, a revogação do caso julgado penal só podia ocorrer se se verificasse um dos fundamentos taxativamente indicados no n.º 1 do artigo 431.º do Código de Processo Penal.
Referiu também o Tribunal Colectivo que, de acordo com a alínea d) do n.º 1 do artigo 431.º do Código de Processo Penal, a revisão da sentença, transitada em julgado, era admissível quando se descobrissem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitassem graves dúvidas sobre a justiça da condenação. Ora, no processo do recurso de revisão com este fundamento, o preceito do art.º 435.º do mesmo Código pode iluminar o caminho que leve à interpretação desta norma. Face ao n.º 2 do art.º 435.º, no recurso de revisão, o requerente não pode indicar testemunhas que não tenham sido ouvidas no processo, quando já conhecia a sua existência ao tempo do julgamento, a menos que elas não tivessem podido depor. Ora, se o requerente não pode indicar testemunhas, cuja existência já conhecia, parece seguro que a lei, no recurso de revisão, não considera, como novos, os factos ou meios de prova que o recorrente já conhecia ao tempo do julgamento, a menos que ele justifique suficientemente, em termos a avaliar pelo Tribunal, a sua não apresentação no julgamento.
Neste sentido, e no caso dos autos, ao tempo do julgamento, para o qual foi notificado, mas não compareceu, A sabia perfeitamente aquilo que veio alegar no recurso para o TSI da sua condenação, de que não se encontrava em Macau no momento em que lhe foi imputada uma infracção na condução de veículo automóvel em Macau. Por outro lado, não apresentou qualquer justificação para a não apresentação, no julgamento, do facto em questão. Logo, não se verifica o pressuposto, previsto na alínea d) do n.º 1 do artigo 431.º do Código de Processo Penal, para requerer o recurso de revisão.
Face ao exposto, o Tribunal Colectivo do TUI fixa, nos termos do artigo 427.º do Código de Processo Penal, a seguinte jurisprudência: Para efeitos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 431.º do Código de Processo Penal, não são novos os factos ou meios de prova que o recorrente já conhecesse ao tempo do julgamento, a menos que ele justifique suficientemente, em termos a avaliar pelo Tribunal, a sua não apresentação nesse julgamento.
E negou o provimento ao recurso.
Cfr. Acórdãos do TUI, no Processo n.º 15/2017 e do TSI, no Processo n.º 755/2016.
Nos termos do artigo 426.º do Código do Processo Penal, a referida decisão de uniformização de jurisprudência é publicada no Boletim Oficial, I Série, de 18 de Novembro de 2019.