O passado é a pedra basilar do futuro e as acções são orientadas pelos problemas. Antes de mais, farei uma breve retrospectiva do desenvolvimento de Macau e a identificação de alguns problemas que hoje enfrentamos.
1. Retrospectiva do desenvolvimento de Macau ao longo dos 20 anos desde o seu retorno à Pátria
Durante estes 20 anos desde o retorno de Macau à Pátria, com o forte apoio do Governo Central e sob a liderança dos dois Chefes do Executivo, Senhor Ho Hau Wah e Senhor Chui Sai On, os sucessivos Governos da RAEM, em conjugação de esforços com todos os sectores da sociedade, prosseguiram de forma plena e precisa os princípios «um País, dois sistemas» e «Macau governado pelas suas gentes» com alto grau de autonomia, cumprindo escrupulosamente a Constituição Nacional e a Lei Básica de Macau, sempre focados no desenvolvimento do posicionamento de Macau como «um Centro, uma Plataforma, uma Base». Abriu-se, assim, uma nova era na aplicação do princípio «um País, dois sistemas» em Macau, assente em alicerces consolidados e experiências de referência para o futuro desenvolvimento da RAEM.
Nestes 20 anos, estabeleceu-se firmemente uma ordem constitucional baseada na Constituição Nacional e na Lei Básica de Macau. O sistema, liderado pelo poder executivo e com o Chefe do Executivo como núcleo, tem funcionado serenamente. A base socio-política centrada nos valores do amor à Pátria e a Macau tem vindo a ser constantemente consolidada. A articulação do poder pleno de governação do Governo Central com o alto grau de autonomia da RAEM está concretizada e cumpre-se o dever da defesa da soberania, da segurança e dos interesses de desenvolvimento do País.
Nestes 20 anos, a economia de Macau registou um crescimento galopante. A liberalização do sector do jogo foi o motor do crescimento acelerado da economia. Viveu-se o período de desenvolvimento económico mais rápido da história de Macau, com o seu Produto Interno Bruto per capita a ocupar uma das posições cimeiras a nível mundial.
Nestes 20 anos, as condições de vida da população de Macau tem vindo a ser continuamente melhoradas, e a educação, a saúde, a segurança social e os benefícios sociais gradualmente reforçados e aperfeiçoados. Os sentimentos de realização, de felicidade e de segurança dos residentes de Macau aumentaram continuamente.
Nestes 20 anos, o sistema político democrático de Macau desenvolveu-se ordeiramente e os direitos e as liberdades dos residentes de Macau definidos na lei estão amplamente garantidos. A sociedade de Macau mantém-se harmoniosa e estável, tendo a debilitada situação da cidade, em termos de segurança pública, sido rapidamente invertida, apresentando-se hoje uma cidade segura, de ordem pública, onde as diferentes culturas, com predominância da cultura chinesa, coexistem em harmonia.
Nestes 20 anos, o alcance e a profundidade da integração de Macau na grande conjuntura de desenvolvimento do País têm vindo a intensificar-se continuamente. Na sequência da assinatura e implementação do «Acordo de Estreitamento das Relações Económicas e Comerciais entre o Continente Chinês e Macau» e através da promoção das estratégias «Uma Faixa, Uma Rota» e da construção da Grande Baía de Guangdong-Hong Kong-Macau, o intercâmbio e a cooperação, nos vários domínios, entre Macau e o Interior do País têm sido continuamente aprofundados. Macau tem contribuído significativamente para a reforma e abertura do País e a este processo de reforma e abertura se deve, igualmente, o desenvolvimento socio-económico de Macau. Sem a reforma e abertura do País, não teria sido possível a Macau alcançar a prosperidade de que hoje goza.
Ao longo destes 20 anos, após o seu retorno à Pátria, Macau trilhou com sucesso o caminho da aplicação do princípio «um País, dois sistemas» com características próprias, o que comprova em pleno o valor científico e a grande vitalidade deste princípio. A aplicação bem sucedida em Macau do princípio «um País, dois sistemas» alcançou reconhecimento a nível internacional e provou ao mundo que este princípio é totalmente viável, alcançável e querido por todos.
O progresso e os êxitos do desenvolvimento da RAEM são indissociáveis do forte apoio do Governo Central e do Interior da China e do esforço conjunto de toda a população. A Pátria foi e será sempre o mais firme respaldo de Macau e os residentes são a força motriz do desenvolvimento e do progresso da RAEM.
2. Situação económica e social no ano de 2019
O ano de 2019 foi marcado pelas celebrações do 70.o aniversário da fundação da nossa grandiosa Pátria e do 20.o aniversário do retorno de Macau à Pátria, o que o tornou um ano extremamente invulgar e de profundo significado histórico para Macau.
O ano de 2019 foi, também, o ano da mudança do Governo da RAEM. O Presidente Xi Jinping honrou-nos com a sua visita e com a sua presença na Cerimónia Comemorativa do 20.o Aniversário do Retorno de Macau à Pátria e na Cerimónia de Tomada de Posse do Quinto Governo da Região Administrativa Especial de Macau, tendo proferido discursos de grande importância. O Presidente Xi sintetizou, com uma visão estratégica e de uma forma profunda, as experiências da prática bem-sucedida do princípio «um País, dois sistemas» em Macau, e as suas palavras consagram o rumo do futuro desenvolvimento de Macau e servem de orientações para as nossas acções.
As conjunturas interna e externa, que desde o ano passado se apresentam extremamente complexas e severas, conduziram a uma desaceleração da economia de Macau. Apraz-nos, contudo, verificar que, não obstante a conjuntura turbulenta vivida nas regiões vizinhas, o desenvolvimento económico-social de Macau se mantém estável, em geral. Todos os sectores de Macau permanecem unidos e salvaguardam, por sua própria iniciativa, a linha inultrapassável do «não caos», numa defesa conjunta da estabilidade da conjuntura geral.
– Com a divulgação das «Linhas Gerais do Planeamento para o Desenvolvimento da Grande Baía Guangdong – Hong Kong – Macau», a construção da Grande Baía Guangdong – Hong Kong – Macau entrou numa nova fase de desenvolvimento. O Governo Central adoptou um pacote de políticas e medidas benéficas para Macau, que proporciona oportunidades sem precedentes para a prosperidade de Macau e desenvolvimento da diversificação adequada da sua economia.
– A economia, em geral, mantém-se estável, apresentando uma tendência de desaceleração. Em 2019, o Produto Interno Bruto de Macau atingiu 434,7 mil milhões de patacas, o que corresponde a uma contracção anual real de 4,7%; o Produto Interno Bruto per capita foi de cerca de 645,4 mil patacas (cerca de 80 mil dólares americanos), representando, em termos reais, uma queda de 6,6%; a inflação registou um crescimento moderado de 2,75%; a população atingiu um total de 679,6 mil pessoas, o que significa um aumento anual de 1,8%; a taxa de desemprego manteve-se a um nível, relativamente baixo, de cerca de 1,7%; a mediana do rendimento mensal da população empregada foi de 17 000 patacas, o que representa um aumento anual de 6,25%; o número total de visitantes foi de 39,42 milhões, representando um aumento anual de 10,1%.
– As finanças públicas mantêm-se sólidas. Até finais de Setembro de 2019, a reserva financeira da RAEM apresentava uma reserva básica de 148,89 mil milhões de patacas e uma reserva extraordinária de 424,59 mil milhões de patacas. O saldo orçamental do ano financeiro de 2018 foi de 53,87 mil milhões de patacas, e findo o processo de liquidação prevê-se que o montante da reserva extraordinária atinja os 478,46 mil milhões de patacas, pelo que a reserva financeira contabilizará, assim, um montante global de 627,35 mil milhões de patacas. Até finais de Dezembro de 2019, a reserva cambial atingiu 178,3 mil milhões de patacas.
– Reforço da reserva de terrenos. Até finais de Dezembro de 2019, foram publicados 77 despachos de declaração da caducidade da concessão de terrenos, o que envolve uma área total de 691,1 mil m2. Recuperaram-se, com sucesso e nos termos da lei, 39 terrenos, o que representa uma área total de 293,7 mil m2.
3. Principais problemas que Macau enfrenta actualmente
Reconhecemos os resultados alcançados no passado, porém devemos, também, identificar os problemas e desafios que a RAEM enfrenta no processo do seu desenvolvimento. Têm surgido alguns problemas, estruturais e profundos, que afectam o desenvolvimento sustentável da sociedade e da economia.
– Alguns dos aspectos da Administração Pública e do sistema jurídico não acompanham a nova conjuntura de desenvolvimento. A Administração Pública e o sistema jurídico existentes há mais de 20 anos, apresentam alguns aspectos que tem vindo a gradualmente a deixar de estar ajustados às alterações conjunturais e às necessidades de desenvolvimento social, estando muito aquém das expectativas e exigências da população. Os principais problemas são, designadamente, a sobreposição de serviços públicos e a falta de clareza das respectivas atribuições, a baixa eficiência administrativa e uma oferta de serviços pouco conveniente para os residentes, um processo de recrutamento de trabalhadores para a Administração Pública burocrático e moroso e uma incorrecta afectação de recursos humanos, uma deficiente coordenação interdepartamental dos trabalhos sem assunção de responsabilidades, o regime de delegação de poderes e o regime de responsabilização dos titulares de cargos públicos a requererem melhoramentos, a necessidade do reforço da integridade na Administração Pública, a falta de fiscalização do uso dos recursos públicos e uma legislação desajustada às necessidades do desenvolvimento. O aprofundamento da reforma da Administração Pública e o aperfeiçoamento do sistema jurídico são exigências da população e requisitos indispensáveis para uma boa governação na RAEM.
– A estrutura económica é praticamente monolítica e o avanço do desenvolvimento diversificado da economia não é notório. Desde o retorno de Macau à Pátria, e apesar de se ter registado uma fase de crescimento económico relativamente acelerado, a situação de predominância da indústria do jogo não se alterou, tendo até se tornado mais evidente. A indústria do jogo em Macau sofreu um profundo ajustamento, de 2014 a 2016, com uma desaceleração significativa da economia que apresentou um crescimento negativo durante 3 anos consecutivos. Com o surto da pneumonia causada pelo novo tipo de coronavírus, no início do corrente ano, a indústria do jogo e o turismo registaram quedas expressivas, com profundo impacto nas indústrias com estas correlacionadas, o que demonstra, uma vez mais, a vulnerabilidade e os enormes riscos da dependência excessiva da economia de Macau das indústrias do jogo e do turismo, ao que acresce a grande pressão competitiva que Macau enfrenta com a exploração do jogo em países e regiões vizinhas. Apesar do empenho dos anteriores governos da RAEM, ao longo dos anos, no fomento da diversificação económica, não se registam resultados notórios. O peso das indústrias emergentes na economia em geral continua a ser relativamente baixo. O peso da indústria de convenções e exposições e das indústrias culturais e criativas promovidas pelo Governo, no Produto Interno Bruto não chega a 1%, enquanto o peso da indústria do jogo atinge os 50%.
– A construção das infra-estruturas urbanas não acompanha o ritmo do desenvolvimento económico. Inexiste um planeamento global científico para o desenvolvimento urbano de Macau e é evidente o atraso na construção de infra-estruturas urbanas face ao desenvolvimento social e económico. Quer o sistema de transporte local, quer a rede de transportes para o exterior, em especial o sistema de transporte colectivo, apresentam-se gravemente desajustados às necessidades da construção de Macau enquanto centro mundial de turismo e lazer. A construção da cidade inteligente regista um atraso significativo comparativamente às regiões vizinhas.
– A exiguidade de terrenos é um permanente obstáculo ao desenvolvimento da RAEM. Em 2019, a área total de Macau era de 32,9 km2, situando-se a sua densidade populacional entre as mais elevadas do mundo. Os terrenos disponíveis encontram-se praticamente saturados. A escassez de terrenos constitui um entrave a um desenvolvimento sócio-económico sustentável. Devemos investir os maiores esforços na procura de meios para superar este obstáculo. Para além de uma gestão e aproveitamento criteriosos dos 85 km2 de área marítima nos termos da lei, torna-se imperioso, para a expansão do espaço de desenvolvimento de Macau, a promoção gradual da cooperação regional, a integração no quadro da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau e o aprofundamento da cooperação entre Macau e Guangdong, especialmente com Zhuhai no que ao desenvolvimento conjunto de Hengqin se refere.
– Alguns problemas que desde há muitos anos afectam a vida da população e que estão ainda por resolver. Desde o retorno de Macau à Pátria, o Governo, valendo-se dos recursos financeiros acumulados e fruto do desenvolvimento, tem promovido activamente o melhoramento das condições de vida da população. Estabeleceu-se, gradualmente, uma rede de segurança social que oferece múltiplos apoios e protecção a vários níveis, e que apresenta resultados preliminares positivos. Contudo, a resolução das dificuldades inerentes à aquisição de habitação, à mobilidade quotidiana, ao acesso aos cuidados de saúde e a solução para as inundações na zona do Porto Interior continuam a ser as aspirações mais prementes da população.
– O envelhecimento demográfico continua a agravar-se. A população de Macau continua a envelhecer, tendo-se registado, durante anos consecutivos, subidas do índice de envelhecimento. Em 2019, a população idosa, de idade superior a 65 anos, correspondeu a 14,6% da população local, o índice de envelhecimento foi de 90,3% e o índice de dependência dos idosos pertencentes à população local fixou-se em 21%, o que significa ser necessário cerca de cinco adultos para o sustento de um idoso. O agravamento do envelhecimento demográfico traz-nos, sem dúvida, diversos desafios, nomeadamente o aumento de encargos com a segurança social, a redução de mão-de-obra e a sustentabilidade do desenvolvimento socio-económico. A resposta ao envelhecimento demográfico não deve limitar-se, apenas, à prestação de cuidados e serviços de apoio básico aos idosos. A adopção de medidas dispersas não é adequada à satisfação das carências de um crescente número de idosos com necessidades de cuidados, à elevação da sua qualidade da vida nem ao desenvolvimento das suas potencialidades.
– A integração de Macau na Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau depende da elevação da sua competitividade. A reduzida área territorial de Macau constitui uma condicionante ao desenvolvimento sustentável da sua sociedade e economia. A construção da Grande Baía Guangdong –Hong Kong -Macau irá proporcionar a Macau grandes oportunidades de integração na conjuntura do desenvolvimento nacional e permitirá, também, ultrapassar a existente limitação de espaço de desenvolvimento nas várias vertentes, designadamente o desenvolvimento adequado, diversificado e sustentável da economia, bem como elevar o estatuto e o papel de Macau no desenvolvimento económico nacional e na abertura do País ao exterior. Porém, a construção da Grande Baía e a integração de Macau no seu desenvolvimento colocam-nos numa situação de concorrência directa e perante pressões e desafios. O aprofundamento da construção da Grande Baía permitirá que esta zona do Interior da China venha a ser um ambiente de desenvolvimento muito vantajoso e atractivo e com uma forte concentração dos mais diversos recursos, designadamente recursos financeiros e humanos oriundos das regiões que lhe são adjacentes, incluindo Macau. Macau deverá reforçar o seu desempenho, elevar a sua competitividade e integrar-se proactivamente e com um espírito de abertura no desenvolvimento da Grande Baía, sob pena de eventualmente poder vir a ser marginalizada ou substituída em algumas funções que lhe estão atribuídas.
As questões acima expostas merecem a atenção da acção governativa, sendo a resolução e o tratamento adequado destas questões a missão e a prioridade da acção do Governo da RAEM.