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O TSI manteve a decisão que recusou a emissão do Certificado de Confirmação do Direito de Residência às filhas de uma residente permanente de Macau de nacionalidade portuguesa


A é nacional portuguesa nascida em Macau, e já detinha o Bilhete de Identidade de Residente de Macau antes do retorno de Macau à Pátria. Em 2003, A começou a frequentar o curso de direito em Portugal. Cinco anos depois, tendo concluído o curso, A ingressou no Centro de Estudos Judiciários de Portugal, a frequentar o curso de formação de magistrados. Findos três anos de formação, A iniciou a sua carreira na magistratura portuguesa. Durante esse período, nasceram em Portugal as suas filhas B e C, respectivamente em Outubro de 2007 e em Setembro de 2010. Em 2013, A regressou a Macau para exercer funções na Administração Pública. E, em representação das suas filhas B e C, requereu à Direcção dos Serviços de Identificação a emissão dos Certificados de Confirmação do Direito de Residência.

Por despacho proferido em 7 de Novembro de 2013, a subdirectora dos Serviços de Identificação de Macau indeferiu os requerimentos em causa, com os fundamentos seguintes: B e C não têm nacionalidade chinesa por não preencherem o disposto no art.º 5.º da Lei da Nacionalidade da República Popular da China, e não são residentes permanentes da RAEM nos termos do art.º 1.º, n.º 1, al. 6) da Lei n.º 8/1999, pelo facto de a sua mãe ter fixado residência permanente em Portugal à data do seu nascimento.

Inconformada, A, enquanto representante das duas filhas, interpôs recurso contencioso para o Tribunal Administrativo, pedindo a anulação do referido acto administrativo.

Por sentenças proferidas em 20 de Março de 2019, o Tribunal Administrativo anulou o acto administrativo recorrido, pronunciando-se no sentido de que B e C têm direito a adquirir o estatuto de residente permanente de Macau.

Inconformada com as sentenças, a subdirectora dos Serviços de Identificação veio delas interpor recurso jurisdicional para o Tribunal de Segunda Instância.

O Tribunal de Segunda Instância procedeu ao julgamento dos dois recursos. Conforme asseverou o Tribunal Colectivo, só se poderá adquirir o estatuto de residente permanente de Macau ao abrigo do disposto no art.º 1.º, n.º 1, al. 6) da Lei n.º 8/1999, quando se verifiquem cumulativamente cinco requisitos, nomeadamente, que o requerente 1) seja filho de residente permanente de ascendência chinesa e portuguesa; 2) tenha a nacionalidade chinesa (ou ainda não tenha feito a opção da nacionalidade); 3) tenha nascido fora de Macau; 4) tenha o seu domicílio permanente em Macau; e que 5) o seu progenitor tenha também domicílio permanente em Macau à data do seu nascimento.

No que concerne ao primeiro requisito, a mãe das duas requerentes é, inquestionavelmente, residente permanente de Macau, com sangue português. Mas é preciso ainda que essa progenitora tenha sangue chinês. Não obstante A ter afirmado, numa declaração apresentada à Direcção dos Serviços de Identificação e que foi aceite pela mesma, que as suas filhas B e C têm ascendência chinesa e portuguesa, consta do processo administrativo um documento em que se enumeram os nomes dos progenitores, dos avôs maternos e paternos, dos bisavós, também maternos e paternos das requerentes, no qual não se vê nenhum nome chinês, nem sequer um apelido chinês. Isso pode levantar uma dúvida fundada quanto à alegada ascendência chinesa das requerentes.

Em relação ao segundo requisito, não há dúvida que B e C não têm nacionalidade chinesa, podendo, no máximo, invocar que ainda não tenham feito a opção da nacionalidade (chinesa). Não cabe ao Tribunal Colectivo adivinhar se as requerentes podem adquirir ou não a nacionalidade chinesa, mas uma coisa certa que é a de que elas nunca podem adquirir a nacionalidade chinesa por critério jus soli. O resto, depende da avaliação por parte da entidade competente perante os fundamentos e o pedido apresentados em concreto pela interessada.

O terceiro requisito, sem sombra de dúvida, está verificado, já que as requerentes nasceram em Portugal.

Relativamente aos quarto e quinto requisitos, ou seja, à questão de saber se as requerentes e os seus progenitores têm domicílio permanente em Macau, adiantou o Tribunal Colectivo que por domicílio permanente pode entender-se que é o local de residência habitual, tendencialmente estável e duradouro de uma pessoa, onde se encontra a sua casa em que a pessoa vive com estabilidade e tem instalado e organizado a sua economia doméstica, envolvendo, assim, necessariamente, fixidez e continuidade e constituindo o centro da vida pessoal e profissional de uma pessoa.

Para saber se B e C têm domicílio permanente em Macau, o único meio é ponderar as circunstâncias concretas dos progenitores à data do seu nascimento e estas ficavam à guarda de quem. Ora, à data do nascimento de B e C (em 2007 e 2010, respectivamente), A, por sua própria opção de vida, estava a frequentar o curso superior e a formação de magistrados em Portugal. Mas o exercício da magistratura portuguesa exige ter domicílio profissional necessário em Portugal. Tudo isto indica que, na altura, A deixou de ter domicílio permanente em Macau. O mesmo poder dizer-se quanto a B e C que têm vivido sempre com os progenitores desde o seu nascimento, elas não tinham domicílio permanente em Macau à data do seu nascimento. Por esses motivos, nenhum dos dois requisitos está preenchido.

Nos termos acima expendidos, o Tribunal Colectivo entendeu que foi bem tirada a conclusão da entidade recorrida no sentido de as requerentes não poderem adquirir o estatuto de residente permanente de Macau por não satisfazerem a previsão do art.º 1.º, n.º 1, al. 6) da Lei n.º 8/1999.

Face ao exposto, acordaram no Tribunal de Segunda Instância conceder provimento aos recursos jurisdicionais, revogando as sentenças impugnadas e confirmando a decisão administrativa da Direcção dos Serviços de Identificação que recusou a emissão do Certificado de Confirmação do Direito de Residência pretendida por B e C.

Vide os Acórdãos do Tribunal de Segunda Instância, no processo n.º 734/2019 e no processo n.º 735/2019.