A e B divorciam-se no Interior da China em 8 de Maio de 2012. No dia 19 de Novembro de 2015, por Acórdão do Tribunal de Segunda Instância da RAEM, a sentença do divórcio foi revista e confirmada. A adquiriu uma fracção autónoma em Macau mediante escritura pública de aquisição outorgada em 4 de Junho de 2013. Na referida escritura pública de aquisição, A declarou-se casada com B, no regime de comunhão de adquiridos, facto esse que veio a constar do respectivo registo predial. C é o exequente de um processo de execução ordinária do Tribunal Judicial de Base e, o imóvel acima mencionado foi penhorado naqueles autos. A fracção autónoma em causa foi inscrita no Registo Predial por ter sido adquirido como bem próprio de A no dia 12 de Fevereiro de 2015.
A deduziu, no Tribunal Judicial de Base, acção declarativa, contra B e C, pedindo que fosse declarada como legítima e única proprietária da fracção autónoma. O Tribunal Judicial de Base conheceu do caso, e declarou que a fracção autónoma pertence apenas a A por o ter adquirido no estado de divorciada, julgando improcedente a excepção invocada por C de lhe ser inoponível o reconhecimento do direito. Inconformado com o decidido, C recorreu para o Tribunal de Segunda Instância, que decidiu ampliar a matéria de facto e, conceder provimento a excepção de ineficácia, declarando consequentemente que o reconhecimento da propriedade exclusiva de A sobre a fracção autónoma em referência é ineficaz em relação a C.
Inconformada com a decisão do Tribunal de Segunda Instância, A recorreu junto do Tribunal de Última Instância.
O Tribunal Colectivo do Tribunal de Última Instância procedeu ao julgamento do recurso. O Tribunal Colectivo entendeu que não se deve dar relevância à declaração que A fez aquando outorgada a escritura pública, em 4 de Junho de 2013, quanto ao seu estado de casada com B, declaração esta, aliás, pelo Tribunal a quo, acertadamente, considerada falsa. O relevo devia era ser atribuído à factualidade que A e B se divorciaram e que a sentença do divórcio foi revista e confirmada. Com tal reconhecimento do dito divórcio, declarada estando, a sua eficácia perante o ordenamento jurídico local, (cfr., art. 1199.° do C.P.C.M.), impõe-se concluir que, entre os cônjuges, os seus efeitos retroagem à data em que foi decretado, ou seja, o dia 8 de Maio de 2012. Por sua vez, cabe atentar que o estatuído no n.° 3 do art. 1644.° do C.C.M., destina-se a regular os efeitos patrimoniais do divórcio em relação a terceiros, mas tão só em relação a situações que lhe são anteriores, e não, em relação àquelas que apenas ocorreram depois do divórcio, como no caso em apreço. Provado que A já estava efectivamente divorciada quando adquiriu a fracção autónoma, a mesma não integra o património (comum) do casal, motivos não havendo para se falar em protecção de 3os, pois que o normativo em questão apenas actua em relação a bens comuns do casal e já não em relação a bens (próprios) adquiridos depois do divórcio. Enfim, apontou o Tribunal Colectivo que, importa pois atentar que, provado que o que consta no registo não corresponde à verdade, e que A já estava divorciada aquando da registada aquisição, motivos não existem para, mesmo assim se manter a presunção prevista nos termos do art. 7.° do Código do Registo Predial e da mesma se extrair qualquer efeito para a decisão a proferir.
Pelo exposto, o Tribunal Colectivo concedeu provimento ao recurso, revogando o acórdão recorrido.
Cfr. Acórdão do processo n.º 5/2020 do Tribunal de Última Instância.