Por despachos do director da Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais, foram revogadas, respectivamente, as autorizações de contratação de 13 trabalhadores não residentes por parte da Companhia A e de 6 trabalhadores não residentes por parte da Companhia B. As duas companhias interpuseram recursos hierárquicos para o Secretário para a Economia e Finanças. O Secretário para a Economia e Finanças proferiu, respectivamente, em 30 e 13 de Abril de 2018, despachos que indicaram que, como as duas companhias apresentaram esclarecimentos por escrito que, ainda assim, não bastaram à constituição de uma fundamentação suficiente que sustentasse as suas pretensões e não sendo os esclarecimentos das duas companhias e as declarações prestadas pelos trabalhadores conformes, os resultados das investigações verificaram que, sem o consentimento e o conhecimento dos trabalhadores, a Companhia A transferira as informações dos trabalhadores para Companhia B e Companhia C. Além disso, durante a investigação da DSAL, a Companhia A e a Companhia B pediram aos trabalhadores no activo ou desligados do serviço para assinarem, de novo, o contrato de trabalho com Companhia B ou Companhia C, como procederam ainda à inscrição e ao pagamento das contribuições de tais trabalhadores no FSS. Demais, os ofícios do FSS, entregues pela Companhia A e Companhia B não podem comprovar a existência de uma relação laboral entre elas e os trabalhadores e, tendo em conta também que, presentemente, há residentes locais à procura desse tipo de emprego, o Secretário para a Economia e Finanças decidiu, face ao exposto, manter a decisão proferida no despacho original.
Inconformadas com o decidido, a Companhia A e B interpuseram recurso para o Tribunal de Segunda Instância. O Tribunal de Segunda Instância, por Acórdãos de 28 de Meio de 2020, decidiram negar provimento a ambos recursos e, por sua vez, entendeu que os actos administrativos recorridos não padecem do vício de erro nos pressupostos de facto, que as recorrentes violam o disposto no art.º 32.º, n.º 2, al. 6), da Lei n.º 21/2009, e preenchem as condições que permitem a revogação da autorização de contratação de trabalhador não residente, concedida à recorrente.
Ainda inconformadas, as Companhias A e B interpuseram, respectivamente, recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância.
O Tribunal de Última Instância conheceu dos casos, indicando, primeiro, que o art. 32°, n.° 2, al. 6), da Lei n.° 21/2009 pune, a título de infracção, administrativa, o empregador que utilize o trabalhador não residente em local diferente do expressamente autorizado (ainda que se trate de outro estabelecimento pertencente ao mesmo empregador), estabelecendo o art. 33°, n.° 1, al. 1), que, como sanção acessória de tal infracção, pode ser aplicada ao empregador a revogação de todas ou parte das autorizações de contratação de trabalhadores não residentes concedidas, acompanhada da privação (pelo período de seis meses a dois anos) do direito de pedir novas autorizações; trata-se de uma situação de revogação-sanção que se afasta, em todo o caso, do regime da anulação administrativa, também chamada de revogação anulatória. Em segundo lugar, as decisões administrativas impugnadas foram determinadas pelo Secretário para a Economia e Finanças na “Informação/Parecer” da DSAL que são uma (quase integral) repetição da decisão (revogatória) da DSAL; empregam-se nelas expressões, no mínimo, dúbias – “transferiu dados dos seus trabalhadores”, sem concretizar quais, nada se explicitando quanto à sua natureza, nem também se explicita sequer se eram residentes ou não. Por sua vez, importa igualmente notar que completamente omitida foi a “fundamentação de direito”, pois que nenhuma referência é feita à norma (ou normas) que, em concreto, regula a situação para efeitos da decisão proferida; assim sendo, a invocação oficiosa dos artigos 32° e 33° da Lei n.° 21/2009 pelo Tribunal de Segunda Instância para efeitos de sua justificação não se mostra de se subscrever, como que fundamentando, a posteriori, esse mesmo acto. Estava vedado ao Tribunal a quo fazê-lo. Nem sequer ao abrigo do princípio do aproveitamento do acto administrativo, pois que, neste caso, não havia uma vinculação legal da Administração que, ao abrigo da norma do n.º 1 do artigo 33.º da Lei n.º 21/2009, levasse a revogar o acto, dado que esta norma tipicamente concede discricionariedade, tal como resulta da utilização da palavra “podem”. Daí não ser aqui aplicável a jurisprudência desse Tribunal, consagrada no acórdão tirado do processo n.º 54/2011 e que a decisão recorrida invocou. Tratando-se de um poder discricionário, era a Administração que estava obrigada a invocar a norma habilitante do respectivo exercício e o facto é que, da fundamentação do acto, nada resulta a esse propósito, não cabendo ao tribunal fazê-lo. Assim, impõe-se a procedência do presente recurso.
Face ao exposto, o Tribunal Colectivo acordou conceder provimento ao recurso, revogando-se os dois Acórdãos recorridos com a consequente anulação dos actos administrativos praticados.
Cfr. Acórdãos dos Processos n.º 168/2020 e n.º 169/2020 do Tribunal de Última Instância.