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TSI: A sentença penal absolutória não implica necessariamente a exoneração de responsabilidade da indemnização civil


Em Outubro de 2016, num certo casino em Macau, o recorrente A, tendo aproveitado a desatenção dum croupier de turno, subtraiu as fichas doutros jogadores e abandonou logo o local em causa, mas o caso foi detectado por um guarda de segurança que estava presente no casino; por conseguinte, ele entregou as referidas fichas a esse guarda e fugiu. Em seguida, o oficial de segurança B reparou na situação e começou logo a perseguir A; no decurso, foi empurrado por A e perdeu o equilíbrio, colidindo com o ofendido C e, por seu turno, C caiu no chão, ficando com lesões na perna inferior e no joelho do lado esquerdo. C foi diagnosticado com fractura cominutiva da plataforma da tíbia esquerda e com fractura do perónio proximal esquerdo, ficando 9 meses de convalescença.

Realizado o julgamento, o Tribunal Judicial de Base absolveu A dum crime de ofensa grave à integridade física por negligência que lhe foi imputado; porém, foi condenado no pagamento da indemnização patrimonial e não patrimonial, respectivamente, nos valores de RMB$177.409,50 e MOP$500.130,00. Ademais, foi rejeitado o pedido, formulado por C, que reclamava o pagamento solidário da indemnização civil por A, B e a sociedade anónima D (sociedade em que trabalhava B).

Inconformados, A e C recorreram para o Tribunal de Segunda Instância. Entendeu A que ele não tinha culpa da responsabilidade extracontratual, enquanto C estava insatisfeito com a quantia da indemnização e considerou que B e a sociedade anónima D eram responsáveis pela indemnização.

No entendimento do Tribunal Colectivo do TSI, embora o Tribunal a quo tivesse proferido sentença penal absolutória de A, isto não demonstra que A não tivesse praticado os factos criminosos que lhe foram imputados ou a conduta dele fosse legal. Na verdade, com base na corrida feita por A na sala grande do casino, onde havia muitos clientes e na fuga de A da operação de intercepção exercida pelo guarda de segurança, averiguou-se que A violou manifestamente o dever de se movimentar com cautela em lugar público, sendo culpado pelas lesões corporais sofridas pelo guarda de segurança e pelo ofendido. Além do mais, verificou-se o nexo de causalidade adequado entre o acto danoso praticado por A – devido à imprudência de A, o guarda de segurança perdeu o equilíbrio, caindo e colidindo com o ofendido – e a ofensa contra o ofendido. Assim sendo, provou-se suficientemente que A seria responsável pelas indemnizações.

No que concerne ao pedido, apresentado por C, apontou o Tribunal Colectivo que, na ocorrência dos factos, A fugiu por ter sido descoberto o furto cometido por si no casino, com o objectivo de fugir da intercepção realizada pelo guarda de segurança do casino e da eventual responsabilidade criminal. B, como guarda de segurança, tinha como missão impedir a fuga de A, com vista a evitar a suscitação da situação caótica e o aumento do número de vítimas. A par disso, os danos sofridos pelo recorrente C foram causados por acto praticado por A e não por própria vontade de B, tampouco se considerou B como culpado. Ora, a pretensão da assunção de responsabilidade pela sociedade anónima D ficou sem os devidos fundamentos de facto e de direito, tornando-se improcedente o motivo do recurso invocado pelo recorrente C.

Quanto à quantia da indemnização, invocou o recorrente C que a quantia da indemnização fixada pela sentença a quo não abrangia os danos pelos salários pagos a motorista. No entendimento do Tribunal Colectivo, o recorrente confundiu o conceito de despesa com o de dano. A avaliação de dano deve ser feita com a observância da diferença entre o valor patrimonial anterior ao acidente e o posterior a este, em vez de incluir meramente a despesa no dano e, em consequência, reclamar a respectiva indemnização. Pela sentença proferida pelo Tribunal a quo, o recorrente obteve a indemnização por perda de salários, por ele solicitada (referente ao período que abrangia o tempo em que foi recrutado como motorista), dano esse que era justamente a perda de benefícios que deveria receber, causada pela sofrida ofensa. Se se determinasse novamente essa parte do dano, poderia o recorrente incorrer em enriquecimento sem causa.

Nos termos expostos, acordaram no TSI em negar provimento aos recursos interpostos pelos dois recorrentes, sustentando a decisão a quo.

Cfr. Acórdão, proferido pelo Tribunal de Segunda Instância no processo n.º 718/2019.