Em 14 de Outubro de 2017, por volta das 17h40, A conduzia um automóvel ligeiro, circulando na faixa de rodagem central da Alameda Dr. Carlos d’Assumpção, enquanto B conduzia um ciclomotor, circulando à frente de A. Posteriormente, A seguia na faixa de rodagem central até à retaguarda e à direita de B e começou a efectuar a manobra de ultrapassagem. No decurso, o lado esquerdo do automóvel, conduzido por A, embateu no lado direito do ciclomotor conduzido por B, o que desencadeou a queda de B juntamente com seu veículo e as lesões deste, ficando o mesmo com 6 a 9 meses de convalescença e sofrendo de ofensa grave à integridade física. Feita a peritagem, averiguou-se que B sofria de deslocamento para fora da clavícula (cura deforme) e era classificado com 5% da taxa de incapacidade permanente. Por esta razão, o Ministério Público acusou A da prática de um crime de ofensa grave à integridade física por negligência; e B deduziu pedido cível aderido à acção em causa contra a companhia seguradora que segurou o automóvel ligeiro de A, reclamando o pagamento duma quantia total de MOP$989.901,39, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, e o pagamento da indemnização por despesas médicas e medicamentosas despendidas e por perda de salários, contadas a partir de 15 de Março de 2018, a liquidar na execução do acórdão.
Após o julgamento, o Tribunal Judicial de Base condenou A, pela prática de um crime de ofensa grave à integridade física por negligência, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão, suspensa na sua execução por 2 anos, e na pena acessória de inibição de condução pelo período de 9 meses. No que concerne à indemnização civil, o TJB julgou parcialmente procedente o pedido cível formulado por B (demandante civil), condenando o demandado civil a pagar a B uma quantia total de MOP$539.089,24, a título de indemnização, bem como os respectivos juros legais e a indemnização a determinar no processo de execução.
Inconformada, a companhia seguradora recorreu do acórdão para o Tribunal de Segunda Instância.
O Tribunal Colectivo do TSI conheceu do caso. Relativamente à questão de falta de examinação ou de omissão de conhecimento que condicionou o pedido de revogação do acórdão recorrido, apontou o Tribunal Colectivo que, na verdade, sub judice, tal questão era realmente existente, uma vez que a recorrente tinha questionado na sua contestação que o ofendido usou capacete de modelo não conforme o autorizado, requerendo ao Tribunal que oficiasse à Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego, a fim de a inquirir sobre o assunto em causa. Depois da admissão do requerimento, o TJB oficiou à DSAT e obteve a resposta que mostrou o resultado da irregularidade do capacete usado pelo ofendido. Como o TJB já concluiu os actos processuais em apreço e obteve as provas legais, deveria responder à questão colocada pela recorrente sobre “a regularidade do capacete usado pelo recorrido na data da ocorrência dos factos”, visto que tal “questão” era relevante na influência da gravidade das lesões sofridas pelo ofendido, embora não desempenhasse um papel decisivo na atribuição da responsabilidade pelo acidente de viação. Apesar de o Tribunal a quo ter descrito geralmente na acta de audiência de julgamento que o Tribunal Colectivo apreciou as provas, constantes dos autos e produzidas na audiência, este não deu qualquer explicação quanto ao resultado da apreciação das provas documentais supramencionadas e à conclusão adequada que devia ter sido tirada, já que essa era uma “questão” constitutiva do objecto da acção que devia ser apreciada pelo tribunal. A falta de apreciação da referida questão constituía o vício de omissão de pronúncia previsto no art.º 571.º do Código de Processo Civil aplicado por remissão do art.º 4.º do Código de Processo Penal, o que implicava a nulidade dessa parte da decisão do acórdão. A avaliação científica do facto de o recorrido ter usado capacete de modelo não conforme o autorizado na data da ocorrência dos factos consistia nos pressupostos da influência das lesões do ofendido do acidente de viação; a par disso, só se podia tomar decisão quando houvesse resultado da avaliação, pelo que o TSI não seria competente para apreciar o aludido facto, tornando-se indispensável o reenvio do processo ao Tribunal a quo, cabendo ao Tribunal Colectivo que proferiu o acórdão recorrido, conhecer da questão de pronúncia e, em seguida, proceder à nova apreciação da matéria de facto e proferir a decisão.
A recorrente invocou a questão relativa à repartição da culpa pelo acidente de viação e a excessividade da taxa de desconto de 80% no cálculo da indemnização por incapacidade para o trabalho (5%) a pagar ao recorrido, motivos esses que foram julgados improcedentes pelo TSI.
Face ao expendido, acordaram no Tribunal Colectivo em conceder provimento parcial ao recurso interposto pela recorrente, determinando o reenvio do processo ao TJB para novo julgamento.
Cfr. Acórdão, proferido pelo Tribunal de Segunda Instância no processo n.º 1062/2019.