A, sendo mediador de jogos, exercia funções de vice-presidente de operações e mediador duma sala de VIP do casino B. Em 2016, A foi suspeito de alcançar o dinheiro da companhia onde trabalhava e ausentou-se, portanto, ora se encontra em paradeiro desconhecido. Em 1 de Janeiro de 2016, A emitiu um cheque no montante de HKD$20.000.000,00 a favor da sociedade limitada C. Face à dívida resultante do cheque em apreço, C intentou no Tribunal Judicial de Base uma acção executiva contra A. D, ora cônjuge de A, intentou no TJB uma acção de separação de bens, como apenso do processo principal supracitado (acção executiva). Na acção de separação de bens, o TJB decidiu classificar a dívida resultante do cheque em causa como dívida comum dos cônjuges A e D, ordenando a inclusão dessa dívida na parte passiva da relação de bens. Inconformada com a decisão, D apontou que a dívida resultante do cheque não era aquela que foi presumida como dívida comercial, ao abrigo do art.º 81.º do Código Comercial, e também não foi contraída em proveito comum do casal, pelo que não seria aplicável a presunção das dívidas que responsabilizam ambos os cônjuges prevista na alínea d) do n.º 1 do art.º 1558.º do Código Civil. A par disso, D ainda assinalou que a impossibilidade do saque do cheque resultou do acto ilícito praticado por A, pelo que, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º 1559.º do Código Civil, tal dívida deveria ser assumida, exclusivamente, por A. D interpôs recurso jurisdicional para o Tribunal de Segunda Instância contra a decisão que ordenou a inclusão da dívida na relação de bens.
O Tribunal Colectivo do TSI conheceu do caso.
Conforme o Tribunal Colectivo, nos termos do disposto no art.º 1.º do Código Comercial, A, sendo mediador de jogos, deve ser considerado como empresário comercial. A emissão de cheque está preceituada nos artigos 1212.º e subsequentes do Código Comercial. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 3.º do Código Comercial, a emissão de cheque é um acto de comércio, por ser prevista no Código Comercial. Ao abrigo do disposto no art.º 81.º do Código Comercial, a dívida comercial resultante do cheque em apreço presume-se contraída no exercício da empresa. Assim sendo, segundo a presunção prevista na alínea d) do n.º 1 do art.º 1558.º do Código Civil, a dívida em causa é assumida por ambos os cônjuges A e D. Se D pretender ilidir a aludida presunção, é indispensável provar que a dívida não foi contraída em proveito comum do casal, contudo, esta não conseguiu fornecer prova suficiente para demonstrar a situação supramencionada e convencer os Juízes a adoptarem a tese dela. Além do mais, mesmo que os factos em causa sejam provados no procedimento cautelar, nos termos do disposto no n.º 5 do art.º 328.º do Código de Processo Civil, isto não significa que, na acção principal, a parte seja dispensada do devido ónus da prova. In casu, D não só não efectuou nenhuma apresentação de prova para mostrar que a dívida em causa não foi contraída em proveito comum do casal, assim como não apresentou nenhuma prova que demonstrasse que a dívida resultou do acto ilícito.
Em face do exposto, acordaram no Tribunal Colectivo em negar provimento ao recurso.
Cfr. Acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância no processo n.º 755/2020.