A era funcionário da tesouraria de um Casino. Em 24 de Setembro de 2014, A acedeu ao sistema informático da tesouraria deste Casino com a sua credencial de profissional autorizado, quando B não estava no local nem depositara qualquer verba na sua conta, e A registou um depósito de 10 milhões de dólares de Hong Kong na conta aberta por B no dia anterior. No mesmo dia, B, C e D entraram juntos no Casino, e levantaram tal verba da referida conta, com o apoio de A, no valor de 10 milhões de dólares de Hong Kong, para jogarem e trocarem por dinheiro. O Ministério Público deduziu acusação, na condenação de A, B, C e D como co-autores materiais, pela prática de um crime de burla informática (de valor consideravelmente elevado), p. e p. pelo art.º 11.º, n.º 1, al. 1) e n.º 3, al. 2), da Lei n.º 11/2009. Após julgamento, o juízo criminal do Tribunal Judicial de Base concedeu na total procedência da dita acusação, condenou A, B, C e D como co-autores materiais e na forma consumada, pela prática de um crime de burla informática (de valor consideravelmente elevado), p. e p. pelo art.º 11.º, n.º 1, al. 1) e n.º 3, al. 2), da Lei n.º 11/2009, conjugado com o art. 196.°, al. b), do Código Penal, na pena individual de 4 anos de prisão efectiva, bem como no pagamento solidário da indemnização, pelos quatro arguidos, à vítima.
Inconformados, o Ministério Público, C e D recorreram para o Tribunal de Segunda Instância. O TSI conheceu do caso e julgou improcedentes os recursos dos C e D, concedendo provimento ao do Ministério Público e alterando a condenar C e D na pena (individual) de 5 anos de prisão.
Inconformados, C e D recorreram para o Tribunal de Última Instância.
O TUI conheceu do caso. O Tribunal Colectivo indicou que o crime de burla informática se caracteriza como um crime de execução vinculada, no sentido de que a lesão do património se produz através da “intrusão, interferência e utilização (em certos termos) dos sistemas e meios informáticos”, sendo também um crime de resultado parcial ou cortado, exigindo-se que seja produzido um prejuízo patrimonial de alguém. A sua dimensão típica remete, pois, para a realização de actos e operações específicas de “intromissão e interferência em programas ou utilização de dados (nos quais está presente)”, e aos quais, está subjacente algum modo de engano, fraude ou artifício, que tenha a finalidade ou através da qual se realiza a intenção de obter enriquecimento ilegítimo, causando prejuízo patrimonial a terceiros.
O Tribunal Colectivo entendeu que não há questão, invocada por C, sobre o excesso de pena. Quanto ao recurso interposto por D, conforme os factos apurados em causa relativos a D, que em parte alguma deles se descreve, de forma minimamente objectiva, qualquer tipo de intervenção ou participação do mesmo no projecto criminoso consistente na prática do crime de burla informática, para que se possa decidir no sentido da sua condenação a título de co-autor (ou cúmplice); a mera referência, em abstracto, à sua ajuda e ao prejuízo que causou, sem a mínima concretização e densificação de tal “ajuda”, em actos concretos e materiais, (com explicitação do que a mesma consistiu), assim, apresentam-se tão só como juízos meramente conclusivos, insusceptíveis de servirem para a subsunção dos elementos objectivos e subjectivos do tipo de crime de burla informática. Portanto, não se mostra adequada a decisão que condenou o recorrente D, como co-autor material da prática do crime de burla informática, havendo que se revogar o decidido, com a consequente absolvição do mesmo.
Pelo exposto, o Tribunal Colectivo negou provimento ao recurso de C e revogou o segmento decisório que condenou D, como co-autor material da prática do crime de burla informática (de valor consideravelmente elevado), do mesmo ficando o arguido absolvido.
Vide Acórdão do Processo n.º 40/2021 do Tribunal de Última Instância.