A sociedade limitada, Centro Médico A, foi estabelecida em 2010, cujas actividades abrangem tratamentos médicos, tecnologia de reprodução assistida e serviçosdeginecologiae obstetrícia. Em 23 de Agosto de 2012, foi estabelecido o Centro Médico B. C é sócio e administrador da Companhia A, bem como o técnico/orientador do B. Em Abril de 2014, D foi ao Centro Médico B com o seu marido E para consulta médica e, no mês de Agosto do mesmo ano, recebeu inseminação artificial (IUI) no referido centro médico. D pagou para tal tratamento uma quantia de MOP10.230,00, mas não ficou grávida. Quando D estava a preparar-se para o segundo IUI, C convenceu D a ir diretamente para a reprodução assistida de fertilização in vitro. D concordou e pagou um valor de MOP98.590,00 pelo tratamento. Em 25 de Setembro de 2014, C fez-lhe a colheita de óvulos. Em 3 de Outubro de 2014, D foi informada de que tinham sido colhidos mais de 20 óvulos e 10 deles tinham sido cultivados com sucesso em blastocistos. No dia 28 de Outubro, C fez a transferência de embrião congelado para o útero de D, mas esta não engravidou, decidindo vir a colocar novamente no seu útero outros embriões congelados. D, por causa do referido tratamento, deslocou-se por três vezes ao referido centro clínico para inspecção e exame médico. No início de Março de 2015, D soube através de jornal de que as instituições médicas privadas em Macau estavam proibidas de prestar serviços médicos de reprodução assistida de fertilização, portanto, deslocou-se ao centro médico para obter mais informações. C respondeu que não tinha licença emitida pelos Serviços de Saúde para prestar o serviço em causa mas podia continuar com o procedimento de transferência embrionária, acrescentando que podia também encaminhar D para os Estados Unidos da América para continuar o tratamento ou, então, proceder novamente ao tratamento depois de A e C obterem a licença. D decidiu desistir do tratamento e exigiu a A que lhe devolvesse o dinheiro, mas este recusou. D então fez queixa aos Serviços de Saúde e intentou uma acção no Tribunal Judicial de Base contra A e C, na qual pediu a dissolução ou anulação do contrato celebrado entre ela e A e a destruição dos embriões fertilizados do casal D e E, bem como a restituição da quantia paga por força do contrato e indemnização por danos patrimoniais e morais, acrescida dos juros correspondentes. Apreciado o caso, o Tribunal Judicial de Base condenou A a pagar a D uma quantia de MOP35.000,00 com juros correspondentes, mas indeferiu os demais pedidos. Inconformada com a decisão, D defendeu que o relatório elaborado pelos Serviços de Saúde em resposta à sua queixa se tratava do documento autêntico referido no artigo 363.º do Código Civil e possuía força probatória plena, acrescentando que a não admissão do dito documento com força probatória plena implicou a violação das disposições do direito probatório. Da referida decisão A recorreu para o Tribunal de Segunda Instância.
O Tribunal Colectivo do Tribunal de Segunda Instância conheceu do caso.
Apontou o Tribunal Colectivo que os documentos autênticos fazem prova plena dos factos que referem como praticados pela autoridade, assim como dos factos que neles são atestados com base nas percepções da entidade documentadora. Contudo, o relatório elaborado pelos Serviços de Saúde contém somente as opiniões e a conclusão dos Serviços de Saúde sobre a questão “a tecnologia de reprodução assistida é, ou não, regulamentada ou proibida por lei”, esta é, evidentemente, uma questão de direito e um juízo ou opinião conclusiva, os quais, de acordo com o artigo 549.º do Código de Processo Civil, n.º 4, não podem ser utilizados, direta ou indiretamente, para provar factos. Além disso, o Tribunal Judicial de Base analisou e julgou o caso com base na legislação vigente na altura da celebração do contrato entre as partes, concluindo que na falta duma lei específica sobre a reprodução assistida, os serviços prestados por A e C não podem ser considerados ilegais, sendo isso a decisão da questão de direito. D só pode pedir ao tribunal de recurso a censura de A e C mediante um recurso fundado na violação de normas jurídicas ou princípios jurídicos fundamentais, não podendo pedir a revogação ou alteração da sentença pela desconformidade entre a conclusão sobre a questão de direito deduzida pelo tribunal de primeira instância e a do relatório dos Serviços de Saúde. Acresce que, D ainda pediu subsidiariamente ao tribunal de recurso a inclusão dos factos elencados na petição inicial na matéria de facto, no sentido de ser alterada a sentença ou ser o caso reenviado para novo julgamento. O Tribunal Colectivo referiu que quanto aos dois factos que D requereu para serem aditados à matéria de facto, sendo um deles uma afirmação de que os serviços prestados por A e C são ilegais, e o outro, uma conclusão de que por lei a prestação dos serviços, como aqueles que foram prestados por eles nesta causa, devem ser sujeitos a apreciação e aprovação prévia da autoridade, aparentemente, esses factos, segundo o seu conteúdo, são questão de direito. De acordo com o artigo 549.º, n.º 4 do Código de Processo Civil, o conhecimento de facto não reconhece questões de direito, deste modo, também é improcedente o pedido subsidiário que impugna a decisão sobre a matéria de facto.
Face ao exposto, o Tribunal Colectivo julgou improcedente o recurso.
Cfr. Acórdão proferido no processo n.º 363/2020 do Tribunal de Segunda Instância.