A Macau Investimento e Desenvolvimento, S.A. (adiante designada por MID) é uma sociedade de capitais públicos e goza de diversas vantagens no que toca a políticas, capital e regime. Até 31 de Dezembro de 2020, foram registados seis aumentos de capital social, totalizando 9 285 milhões de patacas. Por outro lado, o valor despendido nos projectos de investimento foi de 8 964 milhões de patacas, das quais 8 074 milhões de patacas foram investidas no projecto do Parque Industrial em Hengqin e 890 milhões de patacas foram investidas no Projecto de Zhongshan. No relatório de auditoria de resultados sobre a “Gestão da Macau Investimento e Desenvolvimento, S.A.” divulgado em Dezembro de 2020, o CA verificou problemas flagrantes na gestão e tomada de decisões relativas ao projecto do Parque Industrial. A fim de analisar mais aprofundadamente o estado dos avultados fundos investidos pelo Governo da RAEM nas cidades vizinhas, o CA conduziu, logo a seguir, uma auditoria ao projecto de Zhongshan desenvolvido pela MID que culminou no relatório de auditoria de resultados sobre a “Gestão da Macau Investimento e Desenvolvimento, S.A. – 2.º Relatório”. Durante a auditoria, verificou-se que a Parafuturo de Macau Investimento e Desenvolvimento, Lda. (adiante designada por Parafuturo de Macau), subsidiária da MID, não tinha efectuado estudos preliminares antes de decidir sobre os – avultados – investimentos a realizar, ignorou potenciais riscos e falhou na concretização dos projectos que envolveram grandes somas de dinheiro público.
O relatório referiu que, a fim de criar a Base de Inovação e Empreendedorismo para os Jovens de Guangdong-Macau, estabelecer a sede da Parafuturo de Macau em Zhongshan, criar um centro de formação e intercâmbio para jovens empreendedores do Interior da China, Taiwan, Hong Kong e Macau, um centro de distribuição de produtos dos países de língua portuguesa e um centro de exposição de produtos característicos de Macau, em Outubro de 2016, a Parafuturo de Macau propôs a aquisição do Centro Internacional de Conferências Torch (adiante designado por Centro de Conferências), apesar de saber que não havia sido emitido o certificado predial do imóvel. Posteriormente, em Julho de 2018, a Parafuturo de Macau optou por arrendar primeiro o Centro de Conferências, de quatro andares, por um período de 18 anos e com um período de isenção de renda de um ano, sem ter realizado uma due diligence quanto à sua utilização e operação sem o certificado predial e respectivas consequências legais, deixando para uma fase posterior a sua aquisição. Após a celebração do contrato de arrendamento, a Parafuturo de Macau não conseguiu rentabilizar os primeiro a terceiro andares do imóvel conforme o previsto, devido à falta de emissão do certificado predial, tendo apenas procedido a obras de renovação do primeiro andar para a sua utilização a título experimental. Após a conclusão das obras de renovação do primeiro andar (que, entretanto, já se encontrava em funcionamento a título experimental) não foi possível a realização da inspecção de segurança contra incêndios e de outras vistorias necessárias devido à falta do referido certificado. Consequentemente, as companhias seguradoras podem recusar indemnizar o segurado por danos causados por incêndios ou ocorrências semelhantes por não ter havido a necessária inspecção de segurança contra incêndios. Em situações mais graves, os dirigentes e o pessoal directamente responsável pelo imóvel poderão ser responsabilizados criminalmente, de acordo com a lei do Interior da China.
O relatório revelou ainda que, além dos investimentos acima referidos, a Parafuturo de Macau também participa no capital social de uma instituição financeira. Em 2017, a Parafuturo de Macau investiu 18 milhões de patacas numa instituição financeira, passando a ser seu accionista (a empresa detém 15% do capital social). Esta instituição tem como escopo a criação de uma plataforma de negociação para empresas do Interior da China com activos no estrangeiro e de emissão de obrigações para as PME de Macau. Antes de ter tomado esta decisão importante, a Parafuturo de Macau não fez uma análise global e suficiente do investimento, das condições externas e do próprio projecto e não houve um estudo de viabilidade, pelo que, no momento da apresentação da proposta, a Comissão Executiva não foi capaz de indicar ao Conselho de Administração os pontos essenciais que influenciaram a decisão, as vantagens e as desvantagens, os riscos e as exigências do projecto. Após um ano de funcionamento, tendo em conta os prejuízos que atingiram quase metade do capital social e a necessidade de injecção de capitais para os próximos anos de modo a garantir o funcionamento da instituição financeira, foi proposto o aumento do capital social. Conforme a sugestão proposta pela Parafuturo de Macau em Outubro de 2019, tendo em conta a proposta de aumento de capital e a expansão de investimentos, as exigências da autoridade supervisora, a execução do projecto e as dificuldades na operação da instituição, fizeram com que fosse sugerido um aumento de capital na proporção da participação de cada accionista, tendo a Parafuturo de Macau que realizar um aumento de participação no capital social no valor de 30 milhões de patacas. Em Agosto de 2020, a MID informou a Parafuturo de Macau acerca da possibilidade de utilização dos fundos da sociedade para pagar o aumento do capital.
Tendo em conta que a legislação de Macau em vigor não estabelece uma regulamentação abrangente no que diz respeito à transacção de activos financeiros, o Governo da RAEM estabeleceu algumas restrições quanto a certos aspectos relacionados com a natureza e funcionamento da referida instituição. A regulamentação legal é fundamental para uma infraestrutura financeira sólida, porém, de momento, não existe legislação que regule os mercados financeiros ou plataformas de negociação de activos financeiros. Tendo em conta a falta de uma supervisão abrangente, a instituição financeira deve ser mais prudente na sua actuação de modo a minimizar a ocorrência de potenciais riscos. Aliás, entende-se que a escolha da Parafuturo de Macau (responsável pela cooperação regional entre Zhongshan e Macau) para participar na criação de uma instituição financeira não foi uma decisão adequada.
O CA referiu nos comentários gerais que, a Parafuturo de Macau insistiu na assinatura do Acordo-Quadro sem ter em conta a questão do certificado predial, tendo até organizado uma cerimónia de assinatura que contou com a presença dos dirigentes do Governo. Ao contrário do entusiasmo inicial, os riscos não passaram e os trabalhos de acompanhamento não foram realizados de acordo com o previsto; pior, a Parafuturo de Macau perdeu uma boa ocasião para resolver os problemas encontrados e corrigir os planos de trabalho. É de notar que os objectivos principais da Parafuturo de Macau são criar a Base de Inovação e Empreendedorismo para os jovens das duas cidades, promover os produtos de Macau, Zhongshan e dos países lusófonos, a instalação de empresas, etc., e não adquirir imóveis ou terrenos. A troca na prioridade dos objectivos cria não só confusão como também situações imprevistas, algo que se deve evitar aquando da implementação de projectos. Sendo a Parafuturo de Macau uma sociedade que tem como um dos objectos a promoção da implementação das políticas referidas, deve saber negociar, levar a cabo estudos de viabilidade, ter capacidade de elaborar planos razoáveis, capacidade de análise, saber ouvir sugestões, saber tomar decisões razoáveis, ter capacidade de supervisão e coordenação, etc., de modo a ser capaz de formular propostas que sejam rentáveis e que justifiquem o investimento do Governo da RAEM e evitar o desperdício do erário público.
Conforme foi enfatizado pela MID, constitui desejo do Governo Central e do Governo da RAEM a diversificação da economia, nomeadamente, através da criação de um mercado financeiro moderno com características próprias. Assim, é de extrema importância que a MID cumpra este desígnio fundamental para a diversificação económica de Macau, levando a cabo um estudo devidamente ponderado no sentido de alcançar os resultados pretendidos. Todavia, o que aconteceu foi que a MID se precipitou. Os estudos de viabilidade não são mera formalidade, pelo contrário, têm uma função prática e crítica de controlo. A função de controlo depende em grande medida dos conhecimentos dos administradores da sociedade, não sendo suficiente depender somente da due diligence levada a cabo pela empresa de consultadoria contratada para o efeito. Os resultados da auditoria revelaram que houve precipitação e imprudência por parte da administração da sociedade na decisão de investir na referida instituição, o que torna difícil à Parafuturo de Macau assegurar o bom uso do erário público.
O relatório de auditoria salienta que as sociedades de capitais públicos são um instrumento importante do Governo na senda do desenvolvimento diversificado da economia, desempenham um papel crucial e gozam de grande flexibilidade quanto ao cumprimento da sua missão. Ora, para tal, é essencial aperfeiçoar continuamente a gestão destas sociedades, ter conhecimento das consequências das decisões a tomar, optimizar a estrutura destas sociedades, elevar a eficiência da fiscalização, prevenir o desperdício de capitais, ser responsável na gestão da sociedade e promover o desenvolvimento saudável da mesma por forma a atingir os objectivos de preservação e valorização das actividades e dos activos investidos pelo Governo da RAEM.
O relatório de auditoria de resultados foi já submetido ao Chefe do Executivo, podendo os interessados aceder à sua versão electrónica através do site do CA ( https://www.ca.gov.mo ) ou levantar exemplares em papel, disponibilizados na sua sede, durante o horário de expediente.