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Padece de anulabilidade o acto administrativo praticado com base no estatuto de pessoal ilegalmente estabelecido


A é administrativa do Segundo Grupo da Autoridade Monetária de Macau (AMCM). Em Agosto de 2017, o Conselho de Administração da AMCM instaurou processo disciplinar contra A por esta infringir regras disciplinares. Em Dezembro de mesmo ano, o instrutor concluiu o processo, indicando no relatório final que da factualidade provada resultou que A infringiu com dolo diversos deveres gerais previstos no “Estatuto Privativo do Pessoal” e na “Regra Deontológica dos Trabalhadores”, tais como deveres de correcção, de zelo e de obediência, tendo infringido, além disso, vários deveres especiais indicados na “Regra Deontológica dos Trabalhadores”, nas “Orientações para o Atendimento ao Público” e no “Guia Prático para Trabalhadores” da AMCM. Em Fevereiro de 2018, o Conselho de Administração da AMCM deliberou aplicar a A a pena de suspensão com perda de vencimento de 24 dias nos termos do art.º 66.º do “Estatuto Privativo do Pessoal”. Em Março do mesmo ano, de tal decisão A recorreu contenciosamente para o Tribunal Administrativo. No entender do TA, é ilegal o regime disciplinar estabelecido no “Estatuto Privativo do Pessoal”, porquanto o legislador não estipulou no “Estatuto da AMCM” que o “Estatuto Privativo do Pessoal” pode reger o regime disciplinar. O acto administrativo em apreço foi praticado com base nas disposições dos artigos 19.º e 66.º do “Estatuto Privativo do Pessoal”, padecendo assim do vício de violação de lei. O recurso contencioso foi julgado procedente, em consequência, foi anulado o acto administrativo. Inconformado, o Conselho de Administração da AMCM recorreu para o Tribunal de Segunda Instância.

O Tribunal Colectivo do TSI conheceu do caso.

O Tribunal Colectivo concordou totalmente com a decisão e fundamentação do TA, entendendo que o artigo 17.º, n.º 3, al. f) e o artigo 33.º, n.º 1 do “Estatuto da AMCM” aprovado pelo Decreto-Lei n.º 14/96/M estipulam que o Conselho de Administração da AMCM só tem competência normativa para elaborar o “Estatuto Privativo do Pessoal” quanto ao recrutamento, contratação e previdência do seu pessoal e não foram concedidos àquela instituição poderes normativos no tocante à matéria disciplinar. Sendo ilegal o regime disciplinar estabelecido no referido estatuto, o acto administrativo praticado com base em tais normas ilegais padece do vício de violação de lei, devendo, assim, ser anulado. No recurso, a entidade recorrente ainda alegou que ao acto administrativo em causa era aplicável o princípio do aproveitamento, deviam-se confrontar as disposições do ETAPM que regulam a actividade disciplinar da Administração, para determinar se a base legal (Estatuto Privativo do Pessoal) citada pelo recorrente (Conselho de Administração da AMCM) para aplicar a medida sancionatória à recorrida não encontrava correspondência no ETAPM ou, encontrando, criava um regime mais lesivo ao trabalhador. Quanto a essa alegação, apontou o Tribunal Colectivo que a entidade recorrente exerceu o poder discricionário na prática do acto administrativo em causa, pelo que não é aplicável o princípio do aproveitamento, indicando ainda que caso seja aplicável o referido princípio, também só em caso excepcional é que se pode tornar inoperante a força invalidante dos vícios detectados.

Face ao exposto, o Tribunal Colectivo do TSI negou provimento ao recurso, confirmando a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo.

Cfr. Acórdão proferido no processo n.º 623/2019 do Tribunal de Segunda Instância.