Em 5 de Julho de 2018, A, a fim de se tratar do vício em jogos de fortuna ou azar, pediu à Direcção de Inspecção e Coordenação de Jogos (DICJ) a participação no programa de “auto-exclusão” dos casinos pelo prazo de 2 anos. Durante o período de “auto-exclusão” o requerente está proibido de entrar ou permanecer em todos os casinos da RAEM e a sua violação constitui crime de desobediência. A assinou o requerimento para confirmação. No mesmo dia, o chefe do Departamento de Estudos e Investigação da DICJ proferiu um despacho no uso das competências conferidas pelo director da DICJ, em que ordenou a interdição da entrada de A em todos os casinos da RAEM de 10 de Julho de 2018 a 9 de Julho de 2020 (2 anos), referindo ainda que o incumprimento dessa ordem constitui crime de desobediência. O despacho foi notificado a A no mesmo dia e foi-lhe explicado o teor da notificação. A assinou a notificação após ter tomado conhecimento do seu teor e de que o incumprimento implicaria a sua responsabilidade criminal.
No dia 1 de Janeiro de 2019, pelas 22h23, A entrou num casino em Macau e, seguidamente, ao dirigir-se à tesouraria do casino para trocar fichas, descobriu-se que entrou no casino da RAEM durante o período de interdição. Apreciado o processo, o Tribunal Judicial de Base absolveu A de um crime de desobediência, p.p. pelos artigos 6.º, n.º 1, e 12.º, al. 2), da Lei n.º 10/2012 “Condicionamento da entrada, do trabalho e do jogo nos casinos”, conjugados com o artigo 312.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, que lhe foi imputado.
Não se conformando com a decisão, o Ministério Público recorreu para o Tribunal de Segunda Instância, imputando à decisão do Tribunal a quo a violação do artigo 400.º, n.º 1, do Código de Processo Penal.
Tendo conhecido do recurso, referiu o Tribunal Colectivo do TSI que a decisão administrativa indicada no artigo 12.º, al. 2), da Lei n.º 10/2012 é decisão administrativa material e não formal. Além da “legalidade” e da “legitimidade”, a decisão administrativa pressupõe a existência dos seguintes requisitos – “obrigatoriedade” e “unilateralidade”. Ademais, a “interdição de entrada nos casinos a pedido” prevista no artigo 6.º, n.º 1, da Lei n.º 10/2012 também exige a verificação da “obrigatoriedade” e da “unilateralidade”, só assim se pode considerar como uma decisão administrativa material e a sua violação constituir crime de desobediência. Contudo, o que se vê neste caso é o apoio prestado pela Administração ao próprio recorrido, o qual ainda não afectou o interesse público, pois o objectivo é ajudar o recorrido a afastar-se dos casinos mediante a aplicação de “interdição de entrada nos casinos a pedido”, evitando que se torne um jogador patológico. Trata-se de ajuda à execução do pedido do requerente, prestando-lhe apoio. Pode-se dizer que a ordem de interdição é uma advertência severa ao requerente, este não devendo ser condenado criminalmente pela prática do crime de desobediência em caso de incumprimento da ordem.
Face ao exposto, o Tribunal Colectivo julgou improcedente o recurso do Ministério Público, mantendo-se a decisão a quo.
Cfr. Acórdão proferido no processo n.º 255/2020 do Tribunal de Segunda Instância.