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TUI: A “entrega controlada” de droga não criou a intenção criminosa, foi negado provimento ao recurso dum arguido condenado pela prática do crime de tráfico de droga


Em 10 de Janeiro de 2021, o arguido A acordou com B em vir de Hong Kong a Macau para levantar uma encomenda na qual se ocultava produto estupefaciente “cocaína”, tendo recebido previamente como recompensa um montante de HKD$20.000,00, com a promessa do pagamento de mais HKD$20.000,00 no final. No dia 12 de Janeiro de 2021, A veio de Hong Kong a Macau, e depois de ter completado o período da medida preventiva da quarentena, deslocou-se à agência de correio expresso para levantar a supracitada encomenda. Ao sair dessa agência, A foi interceptado por agentes da Polícia Judiciária, que encontraram na referida encomenda 2468 gramas líquidos de “cocaína”. O Tribunal Colectivo do Tribunal Judicial de Base condenou A pela prática, em co-autoria material, de um crime de “tráfico ilícito de estupefacientes”, p. p. pelo art.º 8.º, n.º 1 da Lei n.º 17/2009, na redacção resultante da Lei n.º 10/2016, na pena de 13 anos de prisão, e na pena acessória de proibição de entrada na RAEM por 8 anos. Inconformado com o assim decidido, A recorreu para o Tribunal de Segunda Instância. O Tribunal Colectivo do TSI concedeu parcial provimento ao recurso, e reduziu a pena aplicada de 13 para 11 anos de prisão, mantendo, no restante, a decisão recorrida.

Ainda inconformado, A recorreu para o Tribunal de Última Instância, entendendo que a decisão recorrida teve erro notório na apreciação da prova, violou os princípios in dubio pro reo e da legalidade, pedindo, também, subsidiariamente, a redução da pena para não superior a 6 anos de prisão.

O Tribunal Colectivo do TUI conheceu do caso, e primeiro, julgou improcedente o recurso na parte relativa ao erro notório na apreciação da prova. Segundo, quanto à violação do princípio in dubio pro reo, entendeu o Tribunal Colectivo que tal princípio se identifica com o da presunção da inocência do arguido, ou seja, impõe que o julgador valore sempre, em favor dele, um non liquet. Conectando-se com a matéria de facto, este princípio actua em todas as vertentes fácticas relevantes, quer elas se refiram aos elementos típicos objectivo e subjectivo do facto criminalmente ilícito, quer elas digam respeito a circunstâncias relevantes para a determinação da pena. Porém, o princípio in dubio pro reo só actua em caso de dúvida insanável, razoável e motivável, razão pela qual, para a sua violação exige-se a comprovação de que o juiz tenha ficado na dúvida sobre factos relevantes, e, nesse estado de dúvida, tenha decidido contra o arguido. Para fundamentar essa dúvida e impor a absolvição, não basta que tenha havido versões díspares ou mesmo contraditórias dos factos, exige-se ainda, que o tribunal tenha exprimido, com um mínimo de clareza, que se encontrou num estado de dúvida quanto aos factos que devia dar por provados ou não provados, o que não aconteceu na situação sub judice.

No que diz respeito à violação do princípio da legalidade, A alegou que, a encomenda em questão foi interceptada pelas autoridades alfandegárias de Hong Kong quando aí transitou, e que, após confirmada a presença de produto estupefaciente, foi controlada no seu trajecto para Macau, com a informação às autoridades policiais locais que adoptaram as medidas que vieram a culminar com a sua detenção e apreensão da dita droga, condutas essas que violaram o princípio da legalidade. O Tribunal Colectivo indicou que, há que admitir, como último meio, certas medidas de investigação especiais, estritamente necessárias à eficácia da prevenção e combate a determinado tipo de criminalidade, em especial, relativamente à criminalidade objectivamente grave e de consequências de elevado dano social, na qual a pressão das circunstâncias e das imposições de defesa da sociedade contra tão graves afrontamentos, tem imposto meios como a admissibilidade de escutas telefónicas, agentes infiltrados e a “entrega controlada” de estupefaciente referida no caso vertente. Por outro lado, é necessário distinguir entre a criação de uma oportunidade com vista à realização de uma intenção criminosa já existente, em que o sujeito já está decidido a delinquir e a actuação policial apenas cria as condições à concretização da dita intenção criminosa, e a criação desta mesma intenção, antes inexistente, visando incitar à prática de uma infracção que, sem essa intervenção, não teria lugar, com vista a obter a prova duma infracção que sem essa conduta não existiria. O Tribunal Colectivo continuou a afirmar que, a eventual ânsia de prevenir e combater o crime grave não pode legitimar comportamentos que atinjam intoleravelmente a liberdade de vontade ou de decisão das pessoas. Quando se afecta intoleravelmente a liberdade de vontade ou de decisão da pessoa, é violada a integridade moral do sujeito, e, com ela, o prescrito no art.º 28.º da Lei Básica, tornando todo o procedimento nulo por força do art.º 113.º do CPPM. Porém, desde que estes limites sejam respeitados, em causa não fica o equilíbrio entre os direitos das pessoas e as exigências públicas do inquérito e da investigação. Dos autos resulta, claramente, que abalado não está o referido “equilíbrio”, e o procedimento em questão foi também objecto de oportuna apreciação e expressa autorização por parte do Juiz de Instrução Criminal, improcedente, assim, o recurso de A nesta parte. Por fim, o Tribunal Colectivo julgou improcedente o pedido subsidiário de A.

Pelo exposto, acordaram no Tribunal Colectivo em negar provimento ao recurso de A.

Cfr. Acórdão do Tribunal de Última Instância no Processo n.º 12/2022.



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