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TSI mantém a sentença que julgou que a conduta dum treinador de cavalos do Macau Jockey Club não constitui maus-tratos a animais


A, treinador de cavalos no Macau Jokey Club, cuidava, em conjunto com um grupo de 15 trabalhadores, de cinco cavalos reformados (incluindo os cavalos X e Y envolvidos neste caso) e vários cavalos activos. Cada cavalariço encarregava-se de cuidar de três a cinco cavalos, trabalhando por turnos. Depois de tratar os cavalos activos, tinham de tratar 5 cavalos reformados. Todos os dias, durante 23 horas e meia, os cavalos X e Y só podiam ficar de pé ou dormir no estábulo e faziam pouco exercício, o cavalariço só levava em dias alternados os cavalos reformados à pista de areia para eles fazerem exercício por 10 a 15 minutos e dar-lhes banho periodicamente. Depois de se reformarem, os cavalos X e Y foram criados no estábulo sem ar-condicionado ou equipamento de ventilação organizado pelo Macau Jockey Club. O cavalo X sofria de má nutrição provocada pela alimentação insuficiente durante um longo período de tempo, o que resultou no seu emagrecimento. No dia 11 de Julho de 2017, o cavalo foi examinado e apresentava uma condição corporal de 2 valores. No dia 21 de Agosto de 2017, o trabalhadores do então IACM (actualmente IAM - Instituto para os Assuntos Municipais) procederam à investigação do caso por A ser suspeito de maltratar os cavalos X e Y, tendo elaborado auto de investigação. No dia 6 de Outubro de 2017, o Conselho de Administração do então IACM (actualmente Conselho de Administração para os Assuntos Municipais do IAM, doravante designado por Conselho de Administração) deduziu acusação contra A. No dia 16 de Julho de 2018, o Conselho de Administração decidiu aplicar a A uma multa no valor de MOP40.000,00 nos termos da alínea 1) do n.º 1 do art.º 29.º da Lei n.º 4/2016 “Lei de protecção dos animais” assim como a sanção acessória de proibição do exercício de actividades que impliquem contacto efectivo com cavalos por um período de um ano, nos termos do art.º 30.º do mesmo diploma legal, pela razão de que A tratava os animais por meio de tortura, violando o art.º 3.º da Lei n.º 4/2016 “Lei de protecção dos animais”. No dia 18 de Outubro de 2018, de tal decisão A recorreu contenciosamente ao Tribunal Administrativo. O Tribunal Administrativo julgou procedente o recurso, anulando o acto recorrido. Discordando da referida sentença, o Conselho de Administração recorreu para o Tribunal de Segunda Instância, imputando à sentença a violação de lei devido à errada interpretação das normas.

O Tribunal de Segunda Instância procedeu ao julgamento do recurso.

O Tribunal Colectivo apontou que, de acordo com o que se preceitua na referida norma do n.º 1 do artigo 3.º da Lei n.º 4/2016 incorrerá na prática da infracção administrativa resultante da sua violação quem infligir dor e sofrimento a um animal através de meios cruéis ou violentos ou por meio de tortura. No caso em apreço, decorre da matéria de facto provada que a conduta de A, que consistiu em não prover suficiente alimentação ao cavalo X que tinha a seu cargo, resultou no seu emagrecimento, sendo de admitir que daí resultou, pelo menos, o sofrimento do cavalo X. Porém, acrescentou o Tribunal Colectivo que a tortura ou os tratamentos cruéis, associados que estão a uma especial perversidade ou censurabilidade do agente, são dificilmente compatíveis com uma actuação omissiva negligente como é aquela que está em causa nos presentes autos. A concreta actuação de A, embora censurável, não é subsumível ao conceito de tortura tal como se encontra legalmente densificado e dos dados constantes dos autos não resultou que foi causada ao animal situação de cansaço grave. Tal como referiu o Juiz do Tribunal Administrativo, é necessária a fiscalização administrativa no caso em que as lesões do animal foram causadas pela actuação negligente do agente, e o legislador, através do n.º 1 do art.º 11.º da Lei n.º 4/2016, regula os deveres do dono. A, de facto, violou o dever previsto na alínea 2) da mesma norma – “Proporcionar ao animal alimentação e água potável adequadas, bem como espaço suficiente para a sua movimentação”. A sentença recorrida que decidiu anular a sanção aplicada a A não enferma do vício de violação de lei. O Conselho de Administração alegou ainda que o Tribunal Administrativo deveria aplicar sanção a A nos termos do n.º 2 do art.º 118.º do Código de Processo Administrativo Contencioso, por A violar o disposto no n.º 1 do art.º 11.º da Lei n.º 4/2016. Quanto a esta questão, referiu o Tribunal Colectivo que o Conselho de Administração não suscitou a questão em primeira instância, pelo que, nos termos do n.º 3 do art.º 563.º do Código de Processo Civil, o tribunal de recurso não conheceu da questão que não foi invocada em primeira instância. De facto, da matéria de facto provada não se encontram dados suficientes para qualificar a conduta de A como a infracção administrativa mencionada. Pelo exposto, andou bem o Tribunal Administrativo ao não aplicar sanção de multa a A.

Em face de tudo o que fica exposto, o Tribunal Colectivo negou provimento ao recurso, confirmando a sentença recorrida.

Cfr. Acórdão do processo n.º 834/2021 do Tribunal de Segunda Instância.