Em 18 de Dezembro de 2020, pelas 22h35, A estacionou o seu motociclo na Rua de Aveiro (na via de trânsito em direcção à Estrada Governador Albano de Oliveira), numa zona de estacionamento proibido em frente do poste de iluminação n.º 730D14. Pelas 22h37 do mesmo dia, o ofendido B estacionou o seu motociclo, de modo transversal, atrás do motociclo de A, e dirigiu-se à loja ao lado para levantar comida. Cerca de 1 minuto depois, A voltou para o aludido local, e ao recuar o seu motociclo para sair, a parte traseira do veículo embateu na parte dianteira esquerda do motociclo de B, fazendo-o oscilar e causando-lhe danos na parte dianteira. Após a ocorrência do embate, A não ficou no local nem chamou a Polícia, mas conduziu o motociclo para sair do local, pelo que B chamou a Polícia. A foi acusado da prática dum crime de fuga à responsabilidade, e condenado na pena de 45 dias de multa, à taxa diária de MOP150,00, no montante total de MOP6.750,00, convertível em 30 dias de prisão, se não fosse paga ou substituída por trabalho, bem como na pena acessória de inibição de condução por 3 meses.
Inconformado com o assim decidido, A recorreu para o Tribunal de Segunda Instância, entendendo que, no momento da ocorrência do embate, o motor do seu motociclo encontrava-se desligado, e as suas condutas não reuniram os elementos constitutivos previstos no art.º 89.º da Lei do Trânsito Rodoviário. A também imputou à sentença a quo vícios de erro notório na apreciação da prova, de violação dos princípios da livre apreciação da prova e in dubio pro reo, e de nulidade por falta do conteúdo previsto no n.º 2 do art.º 355.º do CPP.
O Tribunal Colectivo do TSI conheceu da causa, indicando que, de acordo com a experiência e conhecimento comum de condução, para recuar um motociclo, o condutor tem que usar o seu corpo para mover o veículo, e no caso sub judice, o motor do motociclo não permitiu o seu recuo, então, não se verificou uma relação necessária entre a “ligação” do motor e o movimento do motociclo para trás. E a manobra feita por A, que fez com que o veículo se movesse (para trás), integrou um acto de condução. Por outro lado, ambos os motociclos, de A e B, encontravam-se na via pública, e eram regulados, em absoluto, pela LTR. Obviamente, a manobra de recuar o motociclo, feita por A, e nele montado, constituiu um acto de condução, pelo que se preencheu o elemento objectivo de condução exigido para a aplicação do “crime de fuga à responsabilidade” previsto pelo art.º 89.º da LTR, e as condutas de A integravam este crime desde que fossem verificados os outros elementos constitutivos.
Quanto à questão de se a sentença padeceu do vício de nulidade ou de erro notório na apreciação da prova, indicou o Tribunal Colectivo que, após ter elencado os factos dados como provados e não provados, bem como as provas em que se fundamentou a sua convicção, o Tribunal a quo fez um exame pormenorizado das provas recolhidas e formou a convicção. Tal exame equivaleu ao cumprimento integral do dever de fundamentação previsto no n.º 2 do art.º 355.º do CPP. A sentença a quo também expôs claramente os motivos que o levaram a formar a convicção, não se verificando violação alguma das regras de experiência. O exame e juízo das provas é um processo em que o tribunal, com base no seu conhecimento da experiência comum da vida, em conjugação com a apreciação das provas feita pelo coração, e por fim, com a lógica, deu uma resposta final e em consequência, formou a convicção. Por isso, dúvida não resta sobre o reconhecimento feito pelo Tribunal a quo no sentido de o agente ter conhecimento ou não da ocorrência do “acidente”, e não há lugar para a aplicação do princípio in dubio pro reo.
Pelo exposto, acordaram no Tribunal Colectivo em negar provimento ao recurso de A, mantendo-se a decisão recorrida.
Cfr. Acórdão do Tribunal de Segunda Instância no Processo n.º 989/2021.