Saltar da navegação

TSI: A reposição com produtos de fonte desconhecida não é considerada como restituição da coisa furtada


A partir de 2018, a arguida A começou a exercer a função de consultora de beleza no balcão de produtos cosméticos da marca X numa companhia de armazéns de venda limitada, e prestou, diária e principalmente, os trabalhos de venda de produtos e inventariação de mercadorias, pelo que tinha acesso aos produtos depositados em armazém dessa companhia. Em Março de 2021, A conheceu indivíduos que exerciam as actividades de compra por conta de terceiros, e planeou vender-lhes as mercadorias da companhia em que trabalhava para obter lucros. No último terço de Março de 2021, por não ter dinheiro suficiente, A, sem consentimento da companhia, tirou 72 unidades do produto cosmético da marca X. Durante o inventário efectuado no dia 4 de Abril de 2021, o pessoal da companhia descobriu a falta de 72 unidades do produto cosmético da marca X, pelo que o gerente da companhia questionou A que se responsabilizara pela última inventariação, e A alegou falsamente que não havia erro na quantidade dos produtos depositados. Depois, para evitar a descoberta da sua conduta acima referida, A arranjou, de imediato e por fonte desconhecida, 72 unidades do produto cosmético da marca X e colocou-as no armazém da companhia, para efeitos de dissimulação. A seguir, A pediu demissão do posto de trabalho por motivos pessoais, e disse ao gerente da companhia que já tinha encarregado um amigo dela de colocar os produtos cosméticos da marca X no armazém. O gerente da companhia dirigiu-se de imediato ao armazém para fazer um inventário, no qual encontrou duas caixas e um saco de produtos cosméticos da marca X que não pertenciam à companhia, e após a consulta das imagens gravadas pelo sistema de videovigilância, apercebeu-se de que algo estava errado, e em consequência, descortinou o caso. Foi deduzida acusação pelo Ministério Público contra A. Após o julgamento, o Tribunal Judicial de Base condenou A pela prática, em autoria material e na forma consumada, de 1 crime de “furto qualificado”, p. p. pelo art.º 198.º, n.º 1, al. a), conjugado com o art.º 196.º, al. a) do CPM, na pena de 1 ano de prisão efectiva, e no pagamento da quantia indemnizatória de MOP113.760,00 a favor da companhia ofendida. Inconformada com o assim decidido, A recorreu para o Tribunal de Segunda Instância.

O Tribunal Colectivo do TSI conheceu do caso.

Na motivação do recurso, A alegou que já tinha restituído as 72 unidades do produto cosmético da marca X, pelo que merecia a atenuação especial da pena do crime de “furto qualificado”, prevista pelo art.º 201.º, n.º 1 do CPM. Indicou o Tribunal Colectivo que, as 72 unidades do produto cosmético da marca X não foram “restituídas” por A, mas sim “substituídas” por outras 72 unidades do mesmo produto arranjadas por fonte desconhecida. Assim, a fonte desconhecida dos produtos “substitutivos” não consegue garantir a sua genuinidade, o que equivale à inexistência de restituição da coisa furtada, ou à inexistência de reparação do prejuízo causado pelo furto. Por outro lado, atentas as prementes exigências da prevenção geral do crime de furto qualificado, as quais reclamam a necessidade da pena aplicada a A, nem se pode atenuar especialmente a respectiva pena nos termos previstos no art.º 66.º, n.º 1 do CPM. Ponderados todos os factos apurados nos autos e os dispostos nos art.ºs 40.º, n.º 1 e n.º 2, e 65.º, n.º 1 e n.º 2 do CPM, não se detecta nenhuma injustiça notória na fixação da pena de 1 ano de prisão a A. No que toca à suspensão da execução da pena, dos elementos constantes dos autos resulta que, A foi condenada, pela prática de factos de burla em Maio e Julho de 2021, na pena de 3 anos de prisão efectiva, condenação essa que já transitou em julgado. Em termos temporais, os referidos factos de burla foram praticados em data posterior à da prática dos factos de furto em causa, e neste caso, não se reúnem os requisitos da suspensão da execução da pena previstos pelo art.º 48.º, n.º 1 do CPM.

Face ao exposto, acordaram no Tribunal Colectivo em negar provimento ao recurso de A.

Cfr. Acórdão do Tribunal de Segunda Instânciano Processo n.º 433/2022.