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TSI: o cumprimento do contrato de fornecimento de produtos não pode ser confundido com os riscos potenciais na venda de produtos


Em 9 de Fevereiro de 2020, A Limitada encomendou a B um total de 15.072 produtos de desinfecção da marca X, produzidos na Malásia, no valor total de MOP804.091,20. As duas partes acordaram que a encomenda seria entregue em quatro prestações, com datas de expedição de 14, 21, 28 de Fevereiro e 6 de Março de 2020, respectivamente. Normalmente, os produtos são entregues em Macau dois a três dias depois da expedição da fábrica, sendo a última data de entrega acordada entre as partes o dia 9 de Março de 2020. B entregou parcialmente os produtos a A nos dias 17, 24 e 27 de Fevereiro de 2020, restando ainda 7.056 produtos de desinfecção da marca X a entregar.A já pagou o sinal inicial, no valor de MOP201.022,80, e o preço dos produtos entregues, no valor de MOP193.107,60. Desde Fevereiro de 2020, o surto global do novo coronavírus tornou-se cada vez mais grave e o governo da Malásia implementou medidas de controlo de voos. A fim de cooperar melhor com a organização de cargas no aeroporto, B esteve em estreito contacto com o fabricante da Malásia e com o fornecedor de Hong Kong, pelo que o fabricante providenciou a entrega de produtos no aeroporto de Kuala Lumpur logo em 6 de Março do mesmo ano para tratar das formalidades de expedição, de modo a aguardar a faixa horária do voo e o aviso de descolagem o mais rápido possível. No entanto, só em 10 de Março é que foi organizado um voo no aeroporto de Kuala Lumpur para transportar os produtos para Hong Kong e depois para Macau por via marítima. Na tarde de 12 de Março de 2020, B entregou os 7.056 produtos de desinfecção ainda não entregues à A Limitada, mas esta recusou-se a recepcionar os produtos com fundamento no atraso de B e na perda do interesse na prestação. Assim, B intentou uma acção no Tribunal Judicial de Base. Apreciada a acção, o Tribunal Judicial de Base condenou A no pagamento do preço não pago no montante de MOP273.772,80, acrescido dos respectivos juros, despesas de armazenagem no montante de MOP41.160,00 e despesas de armazenagem até que A recebesse os produtos não recepcionados. Inconformada com o assim decidido, A recorreu para o Tribunal de Segunda Instância.

O Tribunal Colectivo do Tribunal de Segunda Instância conheceu do caso.

A alegou que, devido ao abrandamento gradual da situação epidémica, a procura de produtos de desinfecção no mercado desacelerou, de modo que o atraso da entrega lhe dificultou a venda dos referidos produtos. A este respeito, o Tribunal Colectivo afirmou que esse atraso não foi causado intencionalmente por B; A e B não referiram a questão se os produtos em causa eram difíceis de vender ou não em Macau quando celebraram o contrato, pelo que não seria uma questão que o Tribunal teria de ponderar; os produtos destinavam-se a ser comercializados e não a ser utilizados no mesmo dia ou numa data pré-determinada; A foi informada do processo de carga e descarga dos respectivos produtos, mas não revogou expressamente o acordo com B, pelo que A devia receber os produtos à chegada. Além disso, a recusa de A em receber os produtos baseou-se na dificuldade de os vender e, neste caso, A está a confundir duas realidades: uma, é o cumprimento do contrato de fornecimento de produtos, outra, é a existência de riscos potenciais na venda de produtos. Esta última depende de um conjunto de factores do mercado e fora do alcance de B. O Tribunal Colectivo considerou que, conforme A, ela só receberia os produtos se estes pudessem ser vendidos com êxito, mas tal não estava previsto no contrato de compra e venda celebrado entre A e B, nem se verificou a existência de nenhuma cláusula contratual acordada entre A e B que contemplasse essa situação.

Em face de todo o que fica exposto e justificado, o Tribunal Colectivo considerou que o Tribunal Judicial de Base analisou com precisão as várias questões do processo, apreciou os factos e aplicou a lei de forma correcta, proferiu uma decisão clara e juridicamente bem fundamentada, a ré não perdeu o interesse na prestação e a sua recusa em receber os produtos não era razoável e devia assumir a responsabilidade contratual, nestes termos, acordaram no Tribunal de Segunda Instância em negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.

Cfr. Acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância no processo n.º 676/2022.