A sociedade offshore, limitada A (doravante designada simplesmente por A) foi dissolvida e liquidada, e o registo comercial cancelado em 5 de Março de 2021. C era a liquidatária designada por A. As autoridades brasileiras deduziram um pedido de troca de informações fiscais ao Governo da RAEM, solicitando que A prestasse todas as facturas por ela emitidas em 2019, mas limitadas aos produtos adquiridos à sociedade B (doravante designada simplesmente por B), listando separadamente as facturas relativas a produtos adquiridos a B, bem como as Demonstrações Financeiras Padronizadas de A (Balance Sheet, Income Statement and Reports). O Chefe do Executivo aceitou o pedido de troca de informações formulado pelo Brasil e, em consequência, foi notificada C para prestar as informações em apreço. Da decisão recorreu contenciosamente C para o Tribunal de Segunda Instância, alegando que o despacho recorrido violou o n.º 3 do art.º 1.º da “Convenção Multilateral sobre Assistência Administrativa Mútua em Matéria Fiscal” (doravante designada por “Convenção”). Além disso, acrescentou C que as informações pedidas pelo Brasil não eram informações previsivelmente relevantes para as autoridades fiscais brasileiras, previstas no n.º 1 do art.º 4.º da “Convenção” e no n.º 1 do art.º 4.º da Lei n.º 5/2017, e eram reveladoras de segredos comerciais de A.
O Tribunal Colectivo do TSI conheceu do caso.
No entendimento da Recorrente, o despacho recorrido violou o n.º 3 do art.º 1.º da “Convenção”, uma vez que A nunca teve nenhum tipo de presença tributável no Brasil, nem esteve ali sob investigação, exercendo a sua actividade comercial exclusivamente em Macau. Face a isto, o Tribunal Colectivo citou o parecer emitido pelo Ministério Público, indicando que do princípio da unidade do ordenamento jurídico decorre que o n.º 3 do art.º 1.º da “Convenção” deva ser entendido em harmonia com o n.º 1 do art.º 4.º e o art.º 9.º da Lei n.º 5/2017. A locução “pessoa visada” aludida no n.º 3 do art.º 1.º da “Convenção” equivale a quem as informações respeitam. In casu, conforme o pedido formulado pelo Brasil, B está aí a ser investigada e é residente fiscal daquele Estado, o que mostra que B é a “pessoa visada”, pelo que o despacho em causa reúne todos os requisitos previstos no n.º 3 do art.º 1.º da “Convenção” e no n.º 1 do art.º 4º, e art.º 9.º da Lei n.º 5/2017. Relativamente à questão de previsível relevância dessas informações, assinalou o Tribunal Colectivo que, segundo os elementos constantes do pedido de troca de informações, A e B pertencem ao mesmo grupo comercial; B está a ser investigada pelo Brasil, por suspeita subfacturação e adulteração de facturas; na análise dos casos, o Brasil detectou fluxos financeiros internacionais suspeitosos; no decurso do processo judicial, B recusou-se a prestar as facturas dos seus principais clientes e as demonstrações financeiras. Assim sendo, concluiu o Tribunal Colectivo que as informações pedidas pelo Brasil eram informações previsivelmente relevantes. Quanto à questão de revelação de segredos comerciais, a Recorrente reivindicou que o pedido de troca de informações em causa formulado pelo Brasil devia ser recusado de acordo com as disposições na alínea 3) do art.º 7.º da Lei n.º 5/2017 e na alínea d) do n.º 2 do art.º 21.º da “Convenção”, sob pena de revelar os segredos comerciais de A. Face a isto, afirmou o Tribunal Colectivo que as informações solicitadas no sobredito pedido da troca de informações eram todas as facturas emitidas em 2019 por A provenientes das aquisições de produtos a B, bem como as Demonstrações Financeiras Padronizadas de A (Balance Sheet, Income Statement and Reports). Nos termos dos artigos 39.º e 51.º do Código Comercial, as facturas não fazem parte integrante da escrituração mercantil, pelo que não têm o carácter secreto consagrado no n.º 1 do art.º 52.º do Código Comercial. Além do mais, os pedidos da troca de informações ficam vinculados pelos princípios consignados nos n.ºs 1 e 2 do art.º 22.º da “Convenção”, e por outro lado, o Brasil como Parte requerente prestou, no seu pedido, compromisso de esse mesmo pedido está sujeito aos termos e condições previstos na “Convenção”. A par disso, tendo em conta que a sociedade A foi já liquidada e por fim extinta em 5 de Março de 2021, concluiu o Tribunal Colectivo que a troca de informações relativas às Demonstrações Financeiras Padronizadas e às facturas de A não causaria a indevida revelação de segredos comerciais.
Face ao exposto, o Tribunal Colectivo do TSI acordou em julgar improcedente o recurso contencioso, mantendo o acto administrativo em causa.
Cfr. Acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância no processo n.º 263/2022.