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TUI: Não devem ser confiscados os objectos apreendidos que não sejam comprovadamente instrumentos ou produtos dos crimes


De 2012 a 2019, A desempenhava o papel relevante de gerente da contabilidade numa associação criminosa que se dedicava à exploração da prostituição. Em 2019, a aludida associação criminosa foi desmantelada pela Polícia e os seus elementos foram acusados pelo Ministério Público. Em 2022, por acórdão do Tribunal Judicial de Base, A foi condenado, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de participação em associação criminosa, p. e p. pelo art.º 288.º, n.º 2 do Código Penal, e de trinta crimes de exploração de prostituição, p. e p. pelo art.º 8.º, n.º 1 da Lei n.º 6/97/M, em cúmulo jurídico, na pena única de 5 anos e 6 meses de prisão. Face aos objectos apreendidos nos autos, o Tribunal Colectivo determinou o confisco de todos os que tinham sido reconhecidos como instrumentos de comunicação usados na prática dos crimes, artigos relacionados com os crimes, artigos resultantes dos crimes ou artigos necessários à prática dos crimes, entre outros instrumentos dos crimes, e de todos os valores em numerário apreendidos que tinha sido reconhecidos como produto dos crimes, a favor da RAEM.

Inconformado com a decisão, dela recorreu o Réu para o Tribunal de Segunda Instância, questionando o confisco, determinado pelo TJB, dos objectos que lhe pertenciam e se encontravam apreendidos nos autos (um telemóvel preto, um relógio preto e os montantes de MOP24.000,00, de HKD36.000,00 e de HKD2.451.500,00, todos em numerário).

O TSI julgou parcialmente procedente o recurso interposto pelo Réu, passando a condená-lo na pena única de 5 anos e 3 meses de prisão, mas mantendo a decisão do TJB que determinou o confisco dos objectos apreendidos.

Inconformado com a decisão do TSI que manteve o confisco dos objectos apreendidos, o Réu interpôs recurso para o Tribunal de Última Instância. Entendeu o Réu que a decisão do TSI enfermava de erro notório na apreciação da prova e violação de lei, peticionando que se anulasse o acórdão recorrido e se passasse a determinar a devolução ao Réu do dinheiro e relógio encontrados na sua posse e do dinheiro encontrado no seu domicílio.

O TUI conheceu do caso, afirmando que os vencimentos base recebidos pelo Recorrente no exercício das actividades desenvolvidas pela associação criminosa eram produtos dos crimes, a par disso, no caso não havia elemento algum que demonstrasse a existência de outro provento legal do Recorrente. No entendimento do TUI, à luz do raciocínio formado com base no senso comum e nas regras da experiência, o valor dos benefícios ilegais obtidos pelo Recorrente durante vários anos no exercício da exploração da prostituição devia ser superior ao do montante apreendido nos autos. Embora o Recorrente declarasse que ele tinha ainda outras fontes de receita não relacionadas com os crimes, designadamente, investimentos, bens restantes do encerramento do negócio de seu pai, entre outros, não apresentou prova alguma que demonstrasse o que tinha declarado, pelo que considerou o TUI que eram correctas as conclusões tiradas pelos TJB e TSI quanto ao reconhecimento do dinheiro apreendido nos autos como produto dos crimes, não se verificando erro notório na apreciação da prova. Entendeu o Recorrente que o relógio apreendido nos autos não era instrumento dos crimes, sendo meramente objecto destinado ao uso corrente. Face a isto, apontou o TUI que embora o relógio encontrado na posse do Recorrente tenha sido reconhecido pelo TJB como instrumento dos crimes, o TJB não indicou nenhuma prova que fundamentasse o apuramento do referido facto, a par disso, no caso não havia matéria alguma da prova que mostrasse a relação existente entre o dito relógio e os crimes ou a origem do relógio, não se sabendo, portanto, se o relógio era ou não produto dos crimes. De acordo com o TUI, por não haver no caso prova que demonstrasse que o relógio apreendido do Recorrente era instrumento ou produto dos crimes, improcedem os pressupostos da declaração da perda de objectos a favor da RAEM previstos no n.º 1 do art.º 101.º do Código Penal, consequentemente, o relógio em questão deveria ser devolvido ao Recorrente.

Em face do exposto, acordaram no TUI em conceder provimento parcial ao recurso interposto pelo Recorrente, determinando a anulação da parte do acórdão recorrido que manteve a decisão de confisco do relógio apreendido do Recorrente, bem como a devolução do relógio ao Recorrente; e mantendo as demais decisões proferidas no acórdão recorrido.

Cfr. Acórdão proferido pelo Tribunal de Última Instância no processo n.º 89/2023.