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O TSI julgou que, relativamente à compra e venda simulada, o verdadeiro comprador do imóvel adquirira o direito de propriedade por usucapião


A e a sua mulher B, em 1998, celebraram com o promotor do empreendimento um contrato-promessa de compra e venda da fracção em discussão. Posteriormente, ambos convencionaram em ceder a posição contratual de promitentes-compradores à C, filha do A e sua ex-esposa, tendo acordado em registar a fracção em nome da C, todavia, na realidade, A e B eram os proprietários efectivos da fracção, não tendo C vontade de adquirir a fracção em discussão. A e B passaram a residir na fracção depois de a receberem no final de Julho de 1998, responsabilizando-se pelo pagamento das amortizações mensais e demais despesas relacionadas com a fracção. B, após passar a residir na fracção, esteve sempre convicta de ser a proprietária da dita fracção, enquanto A, até 15 de Julho de 2016, sempre se considerou o proprietário da fracção. Em 2000, C celebrou com o promotor do empreendimento a escritura pública de compra e venda da fracção, e em 2015 vendeu-a a D, filho de A e à sua esposa E. No dia da outorga da escritura pública de compra e venda, D e E constituíram hipoteca sobre a fracção a favor do banco para garantia de crédito bancário. D e E, em 2015, intentaram acção contra B junto do Tribunal Judicial de Base, pedindo que ambos fossem reconhecidos proprietários da fracção, condenando B na restituição da fracção e no pagamento de indemnização. No decorrer do processo, B deduziu reconvenção, solicitando a aquisição do direito de propriedade da fracção por usucapião. O Tribunal Judicial de Base conheceu do caso e julgou improcedente a acção intentada por D e E, e procedente a reconvenção deduzida por B, e em consequência, declarou A e B proprietários da fracção e ordenou o cancelamento do registo hipotecário do banco. Inconformado, o banco interpôs recurso para o Tribunal de Segunda Instância. O Tribunal Colectivo do TSI conheceu do caso e julgou A, B, D e E como sendo litigantes de má-fé por terem feito uso anormal do processo, revogando a decisão proferida pelo Tribunal Judicial de Base. Inconformados, B, D e E interpuseram recurso para o Tribunal de Última Instância.

O Tribunal Colectivo do TUI conheceu do caso, entendendo que, para que haja uso anormal do processo, exige-se o conluio entre as partes, revelado pela sua conduta concretizada nos autos, com a apresentação das peças processuais e indicação e produção das provas e pelas circunstâncias concretas. O Tribunal Colectivo entendeu que as condutas das partes no desenrolar do processo revelavam uma luta a sério entre as partes cujas pretensões se encontravam em frontal conflito, não sendo possível criar a convicção segura de que havia conluio entre as partes para, servindo-se da presente acção, prejudicarem os interesses legítimos do banco. O Tribunal Colectivo concedeu provimento ao recurso, revogando o acórdão recorrido e determinando a remessa dos autos ao TSI para proceder a nova apreciação do recurso intentado pelo banco.

O Tribunal Colectivo do TSI conheceu novamente do caso, tendo concordado integralmente com os argumentos e decisão do Tribunal Judicial de Base, entendendo que A e B, desde que passaram a viver na fracção no final de Julho de 1998, sempre se consideraram os únicos proprietários da fracção, tendo praticado publicamente uma série de actos de gestão, incluindo o pagamento de todas as despesas e o reembolso das amortizações da hipoteca. Daí que, A e B reuniam naquele momento “corpus” e “animus” da posse, tendo adquirido a posse da fracção. Ao mesmo tempo, o Tribunal Colectivo entende ser de boa-fé a posse de A e B. Enquanto A, B e C praticaram o acto de simulação no momento da aquisição da fracção, A e B efectuaram efectivamente o pagamento para aquisição da fracção, e embora C fosse a compradora que figurava na escritura pública de compra e venda, A e B consideravam-se como sendo os verdadeiros proprietários da fracção, exercendo consequentemente os direitos inerentes a proprietários e cumprindo as respectivas obrigações. A posse de A e B não implica violação de direitos. Nos termos do artigo 1221.º do Código Civil, depois de completados 15 anos de posse pode dar-se a usucapião. Uma vez que já decorreram 15 anos de posse da fracção por parte de A e B, estes podem adquirir o direito de propriedade por usucapião. Nos termos do artigo 1213.º do Código Civil, a aquisição do direito de propriedade da fracção por usucapião por parte de A e B ocorreu em Julho de 1998. Extingue-se o direito de propriedade adquirido por parte de D e E em 2015 mediante compra por ser completamente incompatível com os direitos de A e B. Não sendo D e E proprietários da fracção, fica extinto consequentemente o direito hipotecário do banco. O Tribunal Colectivo indicou ainda que D e E sabendo perfeitamente que C não era proprietária da fracção e que B sempre residiu nela, ainda assim procedeu à compra da fracção, solicitando empréstimo junto do banco e intentando acção judicial, D e C agiram como litigantes de má-fé ao abrigo do disposto no artigo 385.º, n.º 1 e n.º 2, alínea a) do Código de Processo Civil.

Pelo exposto, o Tribunal Colectivo negou provimento ao recurso intentado pelo banco, mantendo a decisão proferida pelo Tribunal Judicial de Base, e condenando D e E como litigantes de má-fé, sendo condenados na respectiva multa.

Cfr. Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, no Processo n.º 1120/2018.



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