Em 1997, A e B, residentes do Interior da China, ali registaram o casamento e, posteriormente, tiveram três filhos. Em 2004, A e B conheceram C, residente de Macau, que mantinha uma relação próxima com as famílias de A e B. Em 2012, A, B e C pensaram que o ambiente habitacional e económico de Macau era relativamente bom, por isso, planearam e acordaram que, em primeiro lugar, A e B iriam tratar das formalidades de divórcio no Interior da China e, em seguida, A e C celebrariam casamento falso no Interior da China, com vista a requerer a fixação de residência em Macau de A e dos seus três filhos através da reunião familiar com C, a fim de lhes ser atribuído o direito de residência em Macau e o Bilhete de Identidade de Residente. A e B prometeram que a sua família iria tomar conta de C. Para concretizar o plano acima referido, A e B registaram o divórcio no Interior da China em 2012. No mesmo ano, A e C efectuaram o registo de casamento no Interior da China e requereram junto dos respectivos serviços competentes a fixação de residência em Macau de A e dos seus três filhos, sendo esses pedidos enviados posteriormente às autoridades de Macau para tratamento e apreciação. Em Janeiro de 2019, o pedido de autorização de residência de A e dos seus três filhos foi autorizado pelas autoridades competentes e, posteriormente, foram-lhes emitidos o Certificado de Confirmação do Direito de Residência e o Bilhete de Identidade de Residente Não Permanente de Macau. Em Abril de 2019, a Polícia recebeu uma denúncia sobre o alegado casamento falso de A e C, pelo que iniciou uma investigação e descobriu o caso. Após o julgamento, o Tribunal Judicial de Base condenou A, B e C, pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de 4 crimes de “falsificação de documento” p. e p. pelo art.º 18.º, n.º 2, conjugado com o n.º 1 da Lei n.º 6/2004, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão por cada crime e, em cúmulo jurídico, na pena única de 3 anos e 6 meses de prisão efectiva. Inconformados com a decisão, recorreram A, B e C para o Tribunal de Segunda Instância.
O Tribunal Colectivo do TSI conheceu do caso.
Quanto à questão suscitada por B e C sobre o erro notório na apreciação da prova do acórdão recorrido, tendo apreciado os depoimentos das testemunhas constantes dos autos, a investigação pela Polícia da situação da residência de C em Macau, o registo de entrada e saída de A, o registo de conversas entre os três nas redes sociais, etc., o Tribunal Colectivo entende que não se vislumbra que os factos provados ou não provados pelo Tribunal a quo estejam em desconformidade com os factos efectivamente provados, nem que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável, nem se verifica nenhuma violação das regras do bom senso e do valor da prova vinculada, nem do princípio in dubio pro reo.
Quanto à questão colocada por C sobre a aplicação da lei penal de Macau no espaço, indicou o Tribunal Colectivo que alguns dos actos de A, B e C foram praticados em Macau, e o resultado do tipo de crime também ocorreu em Macau, pelo que não há dúvida que se deve aplicar a lei penal de Macau. O Tribunal a quo não violou o disposto nos artigos 4.º e 5.º do Código Penal.
Quanto à questão do número de crimes invocados pelos três, o Tribunal Colectivo indicou que A e C celebraram casamento falso para que A e os seus três filhos pudessem obter o direito de residência em Macau e o Bilhete de Identidade de Residente de Macau. Em relação a cada um dos titulares que obteve o estatuto de residente de Macau, A, B e C, cada um deles tinha uma resolução criminosa independente e os seus actos criminosos também afectaram cada um deles, ou seja, uma ofensa ao respectivo bem jurídico. Por isso, independentemente da aplicação do crime de falsificação de documentos p.p. pelo art.º 18.º, n.ºs 2 e 1 da Lei n.º 6/2004, vigente à data da sua prática, ou do crime de simulação e invocação de certos actos jurídicos para obtenção de autorizações, p.p. pelo artigo 78.º da Lei n.º 16/2021, vigente à data da prolação do acórdão recorrido, cada um deles cometeu quatro crimes, em vez de um crime que invocaram.
Pelo exposto, acordaram no Tribunal Colectivo do TSI em negar provimento aos recursos de A, B e C, mantendo-se inalterado o acórdão a quo.
Cfr. o Acórdão do TSI no Processo n.º 355/2023.